Daniela Vega: uma


joao lopes
22 Dez 2017 23:28

Já conhecíamos o nome do chileno Sebastián Lelio através de "Glória" (2013), um filme que retratava uma singularíssima personagem feminina, resistindo aos padrões de comportamento supostamente "correctos" para a sua condição de meia idade. Agora, podemos descobrir o mais recente dos seus trabalhos, "Uma Mulher Fantástica" (distinguido com um Urso de Prata – melhor argumento em Berlim), outra viagem surpreendente pela sensibilidade feminina.

A "mulher fantástica" a que o título se refere é Marina, transexual que vive com um homem que desfez o seu casamento. Para nos ficarmos pela informação coligida no trailer do filme, digamos que o homem morre e, para além da súbita solidão, Marina vê-se forçada a confrontar-se com os preconceitos mais ou menos agressivos da família do defunto — para eles, a sua "identidade" torna-a uma personagem pouco recomendável…

Sebastián Lelio está, obviamente, a tratar lugar-comuns e preconceitos muito enraizados no espaço familiar e no tecido social, mas tem o cuidado de não reduzir Marina a um "símbolo" mais ou menos universal de tal tipo de situações. "Uma Mulher Fantástica" não é um panfleto, antes obedece aos valores clássicos do melodrama, desse modo expondo a irredutibilidade do trajecto de Marina, além do mais através de uma bela composição de Daniela Vega.
Em tempos de extremadas e fundamentais interrogações da sexualidade, ou melhor, dos comportamentos sexuais, "Uma Mulher Fantástica" é um filme que resiste às generalizações fáceis, nunca encerrando a personagem de Marina num estatuto de porta-voz do que quer que seja — a não ser da sua verdade enquanto ser humano. Daí decorre, por certo, o efeito universal que tem conseguido, a ponto de ser o candidato chileno a uma nomeação para o Oscar de melhor filme estrangeiro.

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