Pedro Almodóvar e Antonio Banderas — cineasta e actor unidos numa teia de emoções


joao lopes
5 Set 2019 1:20

Vale a pena evocar o misto de surpresa e alegria com que descobrimos "Dolor y Gloria", em Maio, na competição do Festival de Cannes. De facto, desta vez, Pedro Almodóvar não estava apenas a propor variações mais ou menos "coloridas" sobre alguns dos seus filmes anteriores.

Exemplos como "A Pele onde Eu Vivo" (2011) e "Os Amantes Passageiros" (2013), oscilando entre uma certa formatação do fantástico e a caricatura mais ou menos burlesca, tinham deixado a sensação de um esgotamento temático e estético — muito diferente do período mais primitivo em que encontramos experiências deliciosas como "Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos" (1988), Almodóvar parecia contentar-se com a gestão da sua imagem de marca
Lembremos, por isso, que "Dor e Glória", agora lançado nas salas portuguesas, vive de tudo menos dessa preguiça (?) criativa. Assumindo as componentes autobiográficas da sua narrativa — desde os impasses artísticos até às angústias da sexualidade —, Almodóvar faz um filme que nos devolve o melhor do seu intimismo e da sua pulsação romanesca.
Almodóvar assume o risco de enfrentar as convulsões da sua própria existência, reencontrando-se com uma verdade que nunca cede ao pitoresco cor-de-rosa de um retrato de "curiosidades" pessoais. Nada disso: este é um filme de elaborada tensão emocional, exemplarmente encarnada pela notável composição de Antonio Banderas na personagem central do cineasta que lida, finalmente, com as suas dúvidas e medos.
Enfim, vale também a pena acrescentar que o trabalho de Banderas, por certo um dos mais brilhantes da sua carreira, já lhe valeu o prémio de interpretação masculina em Cannes. Nos EUA, alguns especialistas dos bastidores dos Oscars, começam a considerar que ele conseguirá, no mínimo, uma nomeação na categoria de melhor actor — creio que a previsão não tem nada de exagerado.

+ críticas