Casey Affleck e Lucas Hedges — um filme que acredita nos seus actores


joao lopes
5 Jan 2017 0:56

A história ensina-nos que não há nenhuma relação linear, nem "justa" nem "injusta", entre as qualidades específicas de uma interpretação e o seu aparecimento na corrida para os Oscars. Em qualquer caso, este ano não são será arriscado dizer que todos os que já viram "Manchester By the Sea" não podem deixar de considerar que Casey Affleck estará entre os nomeados para melhor actor — e talvez chegue um pouco mais longe…

A sua performance no filme escrito e realizado por Kenneth Lonergan bastaria para definir o que é um actor capaz de expor as nuances mais delicadas do comportamento humano — recorde-se que Affleck já obteve uma nomeação em 2008, na categoria de secundário, graças a  "O Assassínio de Jesse James pelo Cobarde Robert Ford", de Andrew Dominik (2007). Ele consegue, afinal, colocar em cena um adulto que se mantém assombrado pelos laços do passado, sem nunca ceder a clichés familiares ou dramáticos.
Em termos simples, trata-se de uma viagem nos bastidores de uma pequena cidade na costa leste dos EUA, traçando a história de um homem que, na sequência da morte do irmão, se vê de alguma maneira coagido a lidar com o seu sobrinho, numa relação que ambos parecem não desejar… Mas seria injusto dizer que Affleck é a única presença importante. Michelle Williams, Kyle Chandler ou Lucas Hedges (no papel do sobrinho) são igualmente brilhantes, afinal ilustrando um modelo de cinema em que o actor nunca é acessório ou "decorativo".
Lonergan, convém não esquecer, está longe de ser um novato nestas coisas. "Manchester By the Sea" é a sua terceira longa-metragem como realizador, depois de "Podes Contar Comigo" (2000) e "Margaret" (2011). O primeiro desses filmes valeu-lhe uma nomeação para o Oscar de melhor argumento original, tendo obtido uma outra, na mesma categoria, graças ao seu trabalho (partilhado com Jay Cocks e Steve Zaillian) em "Gangs de Nova Iorque" (2002), de Martin Scorsese.
Estamos, afinal, perante um tipo de narrativa que cultiva, com método e paixão, os seus laços com a produção clássica de Hollywood — Vincente Minnelli (1903-1986) será, por certo, uma das referências incontornáveis. Lonergan e os seus actores trazem-nos de volta uma América esquecida, longe dos clichés da grande metrópole, sempre com emoções à flor da pele.

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