joao lopes
22 Abr 2017 20:29

Os filmes valem também pelas singularidades, mais ou menos surpreendentes, que introduzem na nossa visão do mundo. Nesse sentido, um filme pode envolver uma carga informativa que representa, em si mesmo, um valor acrescentado. Assim acontece com "A Tribo", uma produção ucraniana dirigida por Myroslav Slaboshpytskyi — de facto, não é todos os dias que podemos aceder a um filme da Ucrânia; e está longe de ser frequente vermos um filme como este, centrado em personagens surdas-mudas.

Assim é "A Tribo". O que começa por distinguir a sua história envolve uma perturbante claustrofobia. Tudo se passa num colégio interno em que, entre os alunos, prevalece um sistema hierárquico marcado pelas mais brutais formas de violência: por um lado, os mais velhos tratam de modo extremamente agressivo recém-chegados; por outro lado, os rapazes "dirigentes" mantêm algumas alunas num regime de escravidão sexual, obrigando-as a prostituirem-se.



O facto de as personagens só poderem comunicar entre si através da linguagem gestual dos surdos-mudos acrescenta à acção um intenso suplemento dramático. Naquele mundo sem sons, mesmo a comunicação mais contundente não quebra um silêncio paradoxal, afinal habitado pelas mais radicais paixões humanas — "A Tribo" é também um filme sobre os seres humanos como seres de linguagem.

Premiado na Semana da Crítica do Festival de Cannes de 2014, "A Tribo" representa, afinal, um sinal disperso de uma realidade — social, ideológica e simbólica — que, em boa verdade, não é possível conhecer apenas através das imagens mais ou menos breves, quase sempre estereotipadas, do espaço televisivo. É uma estreia algo atrasada, mas nem por isso menos importante. 

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