joao lopes
3 Jul 2020 21:11

Elia Suleiman a contemplar a pirâmide do Museu do Louvre… Curiosidade de turista? Não exactamente. A sua solidão cénica faz-nos deduzir que não estamos perante uma banal crónica de comportamentos. "O Paraíso, Provavelmente" é um filme sobre alguém — um cineasta da Palestina — que vive cada momento como a materialização desencantada, por vezes irresistivelmente bem humorada, de alguém que pertence a um povo, mas não tem um país.

Em boa verdade, toda a trajectória cinematográfica de Suleiman envolve esse paradoxo emocional que acaba por se revelar um elaborado método de encenação cinematográfica. Dito de outro modo: ele representa-se (enquanto intérprete de si próprio, se assim podemos dizer) como um ser em permanente deambulação, filmando uma errância existencial que atrai a fábula política — onde pertenço?



Depois de títulos como "Intervenção Divina" (2002) ou "O Tempo que Resta" (2009), "O Paraíso, Provavelmente" constitui, por certo, um dos objectos mais pessoais da filmografia de Suleiman, quanto mais não seja porque ele assume a personagem de um realizador que visita várias cidades, tentando concretizar um projecto cinematográfico… No limite, a viagem é o próprio projecto e o seu registo confunde-se com o filme a que estamos a assistir.
O efeito paradoxal de tal dispositivo envolve uma calculada distância (ou distanciação) em relação aos modos correntes de, mediaticamente, conhecermos o mundo e, em particular, as tensões entre Israel e Palestina. Dito de outro modo: "O Paraíso, Provavelmente" desafia-nos a olharmos e pensarmos para lá da aceleração "informativa" do nosso quotidiano, de algum modo vislumbrando uma hipótese de pacificação. Qual? Ninguém tem soluções mágicas para apresentar, mas este é um filme que, mesmo atravessado por muitas formas de amargura, não desiste da esperança — a esperança como valor existencial e instrumento político.

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