3 Set 2014 1:37

"Havia um respeito, algo comparado com uma missa, como uma cerimónia". Diogo Dória, o ator que interpreta Teixeira de Pascoaes e que fez parte do elenco de nove filmes de Manoel de Oliveira, recorda a rodagem de "O Velho do Restelo" como um momento único que viveu. Já o produtor Luis Urbano, da companhia O Som e a Fúria, salienta o espírito familiar desta produção: "foi como se fossemos uns miúdos que decidiram fazer o filme atrás de casa do realizador amigo".

O cineasta rodou este filme durante cinco dias na cidade do Porto, nos jardins públicos que rodeiam o prédio onde vive, colocando em cena a personagem de Dom Quixote, com os escritores Luis de Camões, Teixeira de Pascoaes e Camilo Castelo Branco. Era abril e nunca choveu, o mau tempo não comprometeu um plano apertado de rodagem devido às condições de saúde de Oliveira.

A idade avançada de Oliveira condicionou as opções das filmagens de cenas exteriores, mas não o impediu de acompanhar todo o processo de montagem do filme transmitindo indicações precisas à editora de imagem Júlia Buisel – este é um exercício de memória que o realizador consolidou ao longo do tempo (o projeto foi imaginado em 1992, retomado posteriormente e ficou pronto para filmar em 2011).

O filme é uma tese sobre a sua obra. Na curta-metragem, com duração de 20 minutos, o diálogo entre as quatros personagens é ampliada através de imagens que remetem para filmes de Manoel de Oliveira ("Non ou a Vã Glória de Mandar", "O Dia do Desespero", Amor de Perdição") ou para um clássico soviético, "Don Quixote", de Grigori Kozintsev (1957). E assim emergem temas recorrentes na obra de Oliveira: o quinto império, o iberismo, o presente suspenso no passado e até os amores proibidos ou malditos.



Oliveira voltará a filmar?
Diogo Dória terminou a rodagem de "O Velho do Restelo" com uma convicção: "penso que este é, francamente, o último filme e usando uma linguagem comum é a cereja no topo do bolo". O produtor Luis Urbano não o encara como sendo o derradeiro. "Este é mais um filme do Manoel, recuso-me a fazer este tipo de análise, se é o filme testamento ou não…"

Luis Urbano produziu dois filmes de Oliveira ("O Gebo e a Sombra" além de "O Velho do Restelo") e sabe que o cineasta só voltará a filmar em condições muito especiais.

"A Missa do Diabo", uma adaptação de contos de Machado de Assis, seria o projeto que Oliveira poderia ter rodado após "O Gebo e a Sombra", mas as condições de saúde agravaram-se e impediram-no de embarcar numa produção complexa com rodagens em cenários construídos em estúdios brasileiros. Urbano é taxativo: "Esse filme não vai ser feito".

Oliveira já escreveu o agumento e planificou a rodagem. O filme poderá ser dirigido por outro realizador? O produtor salienta que é uma decisão de Manoel de Olivera e da família mas "sem cair em ilusões porque para ser feito pelo Manoel pressupunha uma condição fisica que neste momento ele não tem".

O estado de saúde de Oliveira impede-o de viajar com "O Velho do Restelo" até Veneza. Depois da estreia, o filme vai ser apresentado nos festivais de Toronto, de 8 e 14 de setembro, e de Nova Iorque, 27 de setembro a 13 de outubro, anunciou a produtora O Som e a Fúria. A estreia portuguesa está prevista para 11 de dezembro, quando o realizador celebrar 106 anos.

  • Tiago Alves
  • 3 Set 2014 1:37

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