Anne Dorval e Antoine-Olivier Pilon: um cinema que acredita nos seus actores


joao lopes
18 Dez 2014 11:55

É verdade: apesar de as novas tecnologias permitirem colocar numa imagem um milhão de figurantes que se movem mecanicamente, sem emoção nem imaginação, ainda há quem acredite que uma câmara atenta e disponível pode produzir maravilhas se der a devida atenção a… um ou dois actores!

Veja-se o vibrante Antoine-Olivier Pilon no filme "Mamã", interpretando um rapaz de comportamento errático, por vezes violento. Observe-se Anne Dorval, espantosa e rara actriz a compor a personagem da sua mãe, perdida entre as atribulações do filho e as limitações do orçamento familiar. Veja-se ainda Suzanne Clément, assumindo a figura da vizinha que, afinal, vai desempenhar um papel crucial na relação mãe/filho…
São presenças inesquecíveis de um filme que, além do mais, confirma o talento, a versatilidade e a subtileza de um jovem autor canadiano, Xavier Dolan, que continua a surpreender-nos. Afinal de contas, ele tem 25 anos e, através de títulos como "Amores Imaginários" (2010), "Laurence para Sempre" (2012) ou "Tom na Quinta" (2013) — o primeiro e o terceiro também por ele protagonizados — tem construído um universo de histórias íntimas, tocantes, metodicamente fiéis à mais nobre tradição melodramática.
Dolan trabalha, assim, sobre um território particularmente difícil, o das relações familiares, recusando qualquer moralismo formatado pelas normas telenovelescas. "Mamã" (prémio do júri, em Cannes, ex-aequo com "Adeus à Linguagem", de Jean-Luc Godard) é um retrato exemplar das novas famílias que nascem da interrogação dos tradicionais valores familiares e, ao mesmo tempo, inseparavelmente, um objecto de rara atenção à complexidade da dimensão humana.

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