Emmanuelle Devos (e, em fundo, Sandrine Kiberlain): memórias dos livros e das emoções


joao lopes
4 Jul 2014 0:46

Actor francês muito versátil, Martin Provost (n. 1957) parece ter, enquanto realizador, um gosto muito especial pelas personagens históricas de algum modo envolvidas com os caminhos da expressão artística. Assim acontecera em "Séraphine" (2008), sobre a pintora Séraphine de Senlis (1864-1942); assim volta a acontecer em "Violette", centrado na escritora Violette Leduc (1907-1972).

O mais notável no trabalho narrativo e simbólico de Provost (que também assina o argumento) é o sentimento paradoxal da escrita: por um lado, sentimos que tudo aquilo que acontece com Violette se reflecte, de alguma maneira, nos seus livros; por outro lado, essa mesma escrita não é uma mera "expressão" da vida íntima da protagonista, mas uma parte essencial dessa vida — a escrita não é, enfim, uma "consequência", mas um lugar específico da existência individual.
O impacto de "Violette" é tanto mais forte quanto o seu trajecto, em especial no pós-Segunda Guerra Mundial, envolve encontros e desencontros com figuras marcantes da vida intelectual francesa, incluindo Simone de Beauvoir (1908-1986) e Jean Genet (1910-1986). Dito de outro modo: Violette é uma personagem activa de um tempo de profunda interrogação da identidade humana e, em particular, das relações entre as forças da história e as vontades individuais.
Nada disto seria possível sem uma dimensão que, naturalmente, não podemos deixar de associar à experiência de Provost em frente das câmaras: ele é, de facto, um notável director de actores, sabendo encaminhá-los para níveis de expressão em que se diluem todas as fronteiras entre razão e emoção — Emmanuelle Devos, no papel de Violette, é a exemplar expressão desse método.

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