Dakota Fanning e Jesse Eisenberg: os actores certos para um filme perturbante


joao lopes
10 Jul 2014 2:51

Quanto mais vamos descobrindo o trabalho da americana Kelly Reichardt — cuja obra é objecto de retrospectiva no Curtas de Vila do Conde —, mais se acentua uma emoção paradoxal: por um lado, há nos seus filmes um persistente fascínio pelos elementos naturais e, mais do que isso, pela própria noção mítica de Natureza; por outro lado, tudo se passa como se os humanos não soubessem lidar com a crueza desses elementos, perdendo-se nela e perdendo as razões da sua identidade.

Pensemos, por exemplo, na ambígua deambulação pelas montanhas do Oregon, em "Old Joy" (2006). Ou ainda na revisitação desencantada do western e da descoberta do Oeste em "O Atalho" (2010). Agora, com "Night Moves" (2013), a perturbação aumenta porque, afinal, os protagonistas são os elementos de um pequeno grupo ecológico que decide afirmar os seus valores através da destruição de uma barragem…
A escolha do elenco de "Night Moves" é, em si mesma, reveladora. De facto, ao entregar os papéis principais a Jesse Eisenberg (o Mark Zuckerberg de David Fincher em "A Rede Social"), Dakota Fanning (já adulta, mas que em "Guerra dos Mundos", ainda adolescente, sob a direcção de Steven Spielberg, "roubava" todas as cenas a Tom Cruise) e Peter Sarsgaard (sempre enigmático e inquietante, tal como, por exemplo, em "Lovelace"), Reichardt escolhe intérpretes que escapam a qualquer modelo mais ou menos retórico.
Daí a genuína inquietação deste conto moral sobre a defesa da Natureza. Em vez de excluir as personagens para criar uma espécie de abstracção "teórica" sobre as razões da ecologia, Reichardt vai mergulhando no labirinto de ideias e emoções que circulam entre as suas personagens, afinal distanciando-se de qualquer dicotomia simplista entre "prós" e "contras". No limite, "Night Moves" é um filme sobre o peso específico dos gestos políticos, desde o espaço social até às regiões mais secretas da consciência individual.

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