Mohammad Foghani/AP

27 Mar 2015 21:17

Numa réplica persa da cidade de Meca, construída à custa de milhões de euros, uma companhia cinematográfica iraniana vai tentar oferecer ao mundo uma visão literal do Profeta Maomé, apesar dos tabus tradicionais.

O filme "Maomé, Mensageiro de Deus" recorda a grandiosidade e o orçamento de um filme de Cecil B. DeMille, com as ruas estreias e uma réplica da Kaaba construída na remota aldeira de Allayar.

Mas, mesmo mostrando apenas as costas do profeta Maomé quando criança, antes de ser chamado por Deus, o filme mais caro da história do Irão já recebeu criticas mesmo antes do lançamento, pondo em causa quem, em última análise, quererá ver a história do Alcorão no grande ecrã.

"Como devemos apresentar o nosso profeta?" pergunta o realizador Majid Majidi. "É normal transmitir  mensagens para o mundo através do cinema e da imagem."

Na história do cinema americano, os filmes que envolvem a Bíblia têm, frequentemente, grandes audiências e lucros de bilheteira. As histórias bíblicas inspiraram dezenas de filmes dede os anos 1920 até blockbusters recentes como "Noé", protagonizado por Russell Crowe e o épico bíblico de Ridley Scott "Êxodo: Deuses e Reis".

Mas no Islão, retratar o profeta Maomé é, há muito tempo, um tabu. A tradição islâmica está repleta de descrições escritas de Maomé e das suas virtudes – mostrando-o como o ser humano ideal. Mas os clérigos em geral concordam que é proibido tentar representar esse ideal através da imagem.

No ataque terrorista à revista satírica Charlie Hebdo, em Paris, que matou 12 pessoas em janeiro, homens armados reagiram a uma caricatura do profeta.

Mas, enquanto o islamismo sunita, o ramo dominante da religião,  rejeita amplamente quaisquer representações de Maomé, os seus parentes próximos, o Islão xiita, têm outro ponto de vista.

No Irão, a maior potência xiita, e noutros países, cartazes, faixas, jóias e até chaveiros incluem imagens de Ali, cunhado de Maomé,, venerado pelos xiitas que o vêem como legítimo sucessor do profeta.

O falecido Ayatolla Ruhollah Khomeini, que trouxe a Revolução Islâmica ao Irão, em 1979, e mais tarde se tornou o líder supremo do país, supostamente manteve um quadro do jovem Maomé no seu quarto, durante anos.

No novo filme de 190 minutos, a história centra-se na infância de Maomé, mas nunca mostra o seu rosto. Em vez disso, usa outros para contar a história, como o seu avô Abdul-Mutalib, interpretado pelo ator iraniano Ali Reza Shoja Nouri.

"Foi um papel muito pesado", disse Nouri à Associated Press. "Não posso expressar os meus sentimentos sobre isso."

Para a sua visão, Majidi contratou como supervisor de efeitos visuais o cineasta Scott E. Anderson, vencedor de um Oscar, o diretor de fotografia italiano Vittorio Storaro, triplo vencedor dos prémios da academia norte-americana, e o produtor musical Allah-Rakha Rahman, que ganhou dois Oscars pelo seu trabalho em "Quem Quer Ser Bilionário".

Ao fazer um filme de qualidade, Majidi afirna que vai dar ao mundo a imagem certa do profeta Maomé e culpa os extremistas islâmicos e o Ocidente por mancharem a imagem de um dos pilares da fé, para 1,5 mil milhões de pessoas em todo o mundo.

No entanto, o filme já recebeu bastantes críticas, em grande parte dos países árabes predominantemente sunitas. mesmo antes de ser lançado,

Em fevereiro, o instituto Al-Azhar, no Egipto, um dos locais de maior prestígio do Islão sunita, instou o Irão a proibir um filme que, afirmam, reduz a santidade dos mensageiros de Deus.

Enquanto isso, o reino sunita do Qatar anunciou planos de ter seu próprio épico de mil milhões de dólares sobre a vida do profeta.

Majidi diz-se pronto para cooperar com qualquer país islâmico que planeie fazer um filme sobre Maomé.

"Estamos prontos a cooperar na produção de todos os filmes que apresentem Maomé aoo mundo", afirma Majidi. "Somos um país islâmico, conhecemos a cultura e temos capacidade para a produção de tais filmes."

Até agora, o filme parece ter o apoio do aiatolá Ali Khamenei, atual líder supremo do Irão, que participou na  inauguração dos cenários, em 2012.

Os críticos de cinema iranianos em geral também elogiaram o filme. Mostafa Seyedabadi declarou que a cor e a iluminação eram"surpreendentes". No entanto, o crítico Masoud Farasati qualificou algumas cenas do filme, incluindo um plano em ângulo baixo do profeta adolescente recortado contra o céu, como "uma imitação de Hollywood".

Os produtores planeiam lançar o filme em árabe, persa e inglês, com exibições em todo o Irão noutros países durante o verão.

As filmagens duraram um ano, e a pós-produção, na Alemanha, levou outros dois anos. Se o filme for bem-sucedida, os produtores esperam filmar duas sequelas, uma mais voltada para a vida de Maomé desde a sua adolescência até ao 40 anos e outro depois de 40, quando se tornou o profeta do Islão.

Mohammad Mahdi Heidarian, presidente da Nourtabam, a empresa que produziu o filme. diz que o projeto custou cerca de 30 milhões de dólares. Ele e outros não revelaram detalhes sobre os financiadores mas sabe-se que no Irão existem investidores ricos e instituições religiosas com capacidade para apoiar esforços deste género.

No passado, filmes religiosos deste género obtiveram bons resultados, no Irão. O épico corânico "The Message", de 1977, com Anthony Quinn como o tio de um profeta invisível e inaudível, atraiu multidões e criou longas filas para os cinemas em Teerão. Também os "Os Dez Mandamentos", de Cecil B. DeMille, com um Charlton Heston a separar as águas do mar vermelho no papel do profeta Moisés foi um êxito por aquelas paragens.

  • Associated Press
  • 27 Mar 2015 21:17

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