As paredes com ouvidos de Manuela Pimentel estão em Washington

por Lusa

Washington, 05 mar (Lusa) -- A artista plástica portuguesa Manuela Pimentel tem patente, até dia 24 de março, no Kennedy Center, em Washington, uma instalação sobre azulejos portugueses, que reflete sobre a vida das ruas, onde "as paredes têm ouvidos".

A artista desenvolve o seu trabalho a partir da recolha de cartazes de rua, colados sobre fachadas de prédios, que depois transforma e recicla em forma de azulejo.

"Chamo-lhe a revolta dos azulejos", disse à agência Lusa.

A sua peça está construída como uma estação, completando um elétrico de cortiça do artista Nuno Vasa, e tem o titulo "Se eu pudesse trincar a terra inteira", verso de um poema de Alberto Caeiro (o "Guardador de Rebanhos" de Pessoa).

"Depois de recolher os cartazes, chego a casa com uns grandes blocos, e só quando os começo a separar é que descubro os que estão por baixo. É nesse processo que começo a perceber aquilo que quero manter ou não", explicou.

A artista portuense, de 35 anos, fotografa também mensagens que cidadãos anónimos espalham pelas cidades, e incorpora-as nas peças.

Na instalação do Kennedy Center, por exemplo, surge a frase "Sabias que as paredes têm ouvidos?"

"Confesso que essa fui eu que escrevi numa parede", disse à agência Lusa. "É o titulo de uma exposição minha."

Depois de fazer uma montagem com todos os cartazes, começa a pintar sobre ela, em acrílico e por vezes usando `stencil`, deixando apenas partes dos cartazes visíveis.

No final, usa uma massa para similar as juntas dos azulejos e uma técnica de `trompe l`oeil`, que cria uma ilusão ótica de três dimensões.

Manuela recria, nas suas peças, azulejos dos séculos XVII e XVIII, que fotografa em todo o país, sobretudo em palácios de Lisboa e Porto.

Para esta instalação, usou um azulejo que encontrou no palácio dos Marqueses de Fronteira, em Lisboa, chamado "Casamento da galinha", em que uma galinha segue num coche, conduzido por um macaco.

Este azulejo faz parte de umas representações contemporâneas da guerra da restauração contra Espanha, entre 1640 e 1668, e são formas de parodiar as figuras do poder político de que o país se tinha libertado.

"Por isso achei tão interessante trazer esta parte da história para um evento que celebra a cultura ibérica como um todo", explicou a artista.

Num dos lados da peça, existem umas caixas de madeira que emitem sons gravados pela autora.

"Quando passas na rua, ela está sempre em mudança e em mutação. É como se estivesse a dizer-te coisas. É um diálogo entre a pessoa e o espaço, que está sempre a acontecer, e é isso que tento explorar no meu trabalho", explica.

A artista espera agora que esta exposição, no maior centro cultural dos Estados Unidos, lhe traga oportunidades.

"Conheci várias pessoas desde que cá estou e sempre que digo que estou no Kennedy Center, as pessoas ficam muito impressionadas", contou à agência Lusa. "Acham que sou uma grande estrela. O centro tem um grande poder de legitimação."

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