Novos humanos no sul da China?

por Graça Andrade Ramos, RTP
A caveira recuperada em Longlin, província de Guanxi Darren Cornue

Os paleoantropólogos Darren Cornue, da Austrália e Ji Xueping, da China, colocam a hipótese de restos humanos fossilizados encontrados no sul da China, pertencerem a uma variante até agora desconhecida da espécie humana. Contemporâneos de humanos modernos de há 11 mil anos, os restos apresentam características anatómicas próprias, misturadas. Mas o povo a que pertenciam estes indivíduos não praticava agricultura, apesar de, à sua volta, outros povos conhecerem já técnicas agrícolas primitivas.

Os paleoantropólogos chamam a estes humanos Povo da Gruta do Cervo Vermelho, a partir da tradução do nome chinês do local, Maludong. Sabia-se que eram caçadores, mas pouco mais.

Localizada perto de Mengzi, na província de Yunnan, a zona foi identificada em 1989. Mas só em 2008 começaram a ser analisados os fósseis humanos de cinco indivíduos, até então guardados em coleções. Morfologia própria

De forma genérica, os indivíduos agora analisados tinham crânios arredondados com arcada supraciliar saliente e ossos da caixa craniana bastante espessos. Raios X às cavidades cerebrais indicam que o seu lóbulo frontal era semelhante ao dos modernos humanos. Já os parietais eram arcaicos.
Os rostos eram pequenos e lisos, metidos para dentro do cérebro e os narizes bastante largos. Tinham queixadas proeminentes, sem chegarem a ser queixos de humanos modernos. Os indivíduos possuíam igualmente dentes molares muito grandes.


A equipa de seis investigadores chineses e cinco australianos publicou agora as conclusões, na revista americana PLoS ONE.

Foram verificadas características anatómicas específicas, uma mistura de traços de humanos modernos com outros mais antigos.

Um dos indivíduos analisados foi encontrado em Longlin, na província de Guangxi, vizinha de Yunnan mas, possui características suficientemente próximas dos da Gruta do Cervo Vermelho para ser considerado do mesmo povo.

As ossadas foram datadas entre 11.000 e 14.500 anos atrás, no final da Idade da Pedra, quando surgiram as primeiras técnicas agrícolas.

Restos de humanos modernos encontrados na mesma região e contemporâneos das ossadas da Gruta do Cervo Vermelho confirmam que, já na altura, povos vizinhos usavam a olaria e recolhiam e guardavam sementes.Três hipóteses

“Estes fósseis podem bem pertencer a uma espécie até então desconhecida, sobrevivente até ao fim da era glaciar, há cerca de 11.000 anos”, afirma no estudo o professor Cornue, da Universidade de Nova Gales do Sul.

Podem indicar humanos que evoluíram separadamente do atual ramo genético, podem ser descendentes de povos mais primitivos que saíram de África numa época anterior à dos humanos modernos, ou ainda, serem híbridos.

Os investigadores estão a tentar recolher ADN para poderem analisar e perceberem qual das hipóteses é a mais provável.

O Povo da Gruta do Cervo Vermelho é importante por se encontrar numa zona bem datada em termos evolutivos e por isso poder ajudar a explicar a história da evolução e dispersão planetária dos seres humanos.
Definição biológica controversa
Segundo Darren Curnoe afirmou à BBC, “estamos a tentar ser muito cautelosos nesta fase quanto à classificação” dos restos.

“Uma das razões para isso é que, na ciência da evolução humana, ou paleoantropologia, não temos atualmente uma definição biológica consensual para a nossa própria espécie (Homo Sapiens), acredite-se ou não. Por isso é uma área muito controversa”, acrescentou.

Apesar de a maioria da população humana se concentrar na Ásia sabe-se igualmente pouco do povoamento humano daquele continente, desde a chegada das primeiras populações modernas à Euroásia, há cerca de 70.000 anos.

“O próximo capítulo da história da nossa evolução, o da Ásia, está dar os primeiros passos”, afirma o professor Curnoe.
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