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35 horas na Função Pública acendem sinal amarelo no BCE

por Ana Sanlez - RTP
Rafael Marchante - Reuters

O Banco Central Europeu tem dúvidas sobre as implicações orçamentais do regresso da semana de 35 horas na Função Pública. Em entrevista ao Público, Peter Praet, do conselho executivo do BCE, dá voz às preocupações dos credores de Portugal sobre a promessa do Governo de António Costa.

O debate em torno da reposição das 35 horas semanais na Função pública tem mais um adversário de peso. O Banco Central Europeu tem dúvidas sobre o impacto orçamental da medida, ainda desconhecido, e avisa que os mercados também estão preocupados com as intenções do Governo. Em entrevista ao Público, Peter Praet, membro do conselho executivo da instituição de Frankfurt, alerta para a “fragilidade” da situação portuguesa.

“Há uma declaração política de continuidade e de intenção de seguir as regras europeias, isso é positivo, mas há algumas dúvidas acerca dos detalhes e sobre os pressupostos macroeconómicos”, destaca o responsável.

“A outra coisa que estamos a acompanhar são as reformas estruturais. O plano português tem seis prioridades e uma delas é a coesão social, que eu acho muito importante. Mas há algumas reformas que foram revertidas e precisamos por isso de levantar uma série de questões. Quais são as implicações orçamentais, por exemplo, se se voltar para a semana de 35 horas? Este ainda é um período em que existem pontos de interrogação”, sublinha o alemão.

O economista sustenta que “as reformas têm de ser continuadas”, mas são os políticos que devem “decidir sobre a distribuição e onde se devem colocar as prioridades”.
A medida da discórdia
A reposição do horário laboral de 35 horas por semana entra em vigor a 1 de julho, mas o tema não é pacífico e tem sido objeto de várias críticas e alertas.

O último aviso surgiu na semana passada na análise do Conselho de Finanças Públicas ao Programa de Estabilidade. A entidade chefiada por Teodora Cardoso aponta as 35 horas como um exemplo de que as contas do Executivo não incorporam “explicitamente os custos decorrentes de alterações legislativas em fase adiantada de processo legislativo, nem as medidas suscetíveis de neutralizar os seus efeitos orçamentais".

Já com os sindicatos o ponto de conflito tem sido outro. O grupo parlamentar do PS propôs que a reposição das 35 horas fosse faseada até ao final do ano, nos serviços que necessitem de fazer contratações.

A proposta, citada pela Lusa, referia que "nos órgãos e serviços em que se verifique a necessidade de proceder à contratação de pessoal, a aplicação do tempo normal de trabalho pode ser, em diálogo com os sindicatos, e até 31 de dezembro de 2016, ajustado às necessidades, para assegurar a continuidade e qualidade dos serviços prestados".

A questão gerou controvérsia entre os sindicatos e levou o primeiro-ministro a esclarecer a “polémica”. António Costa garantiu na semana passada que "não haverá aplicação faseada" e que a medida entrará em vigor a 1 de julho para toda a Função Pública.

"Confesso que estou um pouco surpreendido por esta polémica, porque do que conheço não há nenhuma proposta de aplicação faseada. A proposta que existe é de que as 35 horas entrem em vigor para o conjunto dos trabalhadores em funções públicas no dia 1 de julho, ao contrário do que dizia a proposta inicial que previa um período de regulamentação de 90 dias após a entrada em vigor", explicou o primeiro-ministro.

"O que há é uma norma de bom senso, que permite a título excecional - e pontualmente - proceder a ajustamentos de horário em serviços em que, por dificuldades concretas de contratação de pessoas necessárias, esteja em causa a continuidade e qualidade dos serviços prestados aos cidadãos", justificou. "Custos localizados" do que foi "roubado"
O Governo tem sido cauteloso nesta matéria. Por um lado o ministro das Finanças admite que a medida implica "custos localizados" em alguns serviços específicos da Administração Pública e que, por isso, é necessário "um período de adaptação".

Já o ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social acredita que o aumento do horário de trabalho “não surtiu efeitos positivos na generalidade dos serviços da administração pública e contribuiu para a criação de um clima que não foi o mais positivo do que existia anteriormente", declarou Vieira da Silva.

Já este domingo o secretário-geral do PCP defendeu que "não há argumento, não há forma enviesada que não seja a de concretizar, no próximo dia 1 de julho, essa redução do horário de trabalho", destacando que “não se trata de conquistar qualquer direito novo” mas de repor “aquilo que foi roubado aos trabalhadores da Administração Pública".

Jerónimo de Sousa admitiu, no entanto, que pode haver “dificuldades” para implementar a medida em alguns setores, e que será necessária “vontade política” para as ultrapassar.
E Marcelo?
De qualquer forma a lei terá de passar pelo crivo do Presidente da República. Este sábado o Expresso avançou que Marcelo Rebelo de Sousa poderá vetar a medida, por considerar que tem um efeito potencialmente “devastador” na economia portuguesa neste momento. Este domingo, questionado sobre o tema, Marcelo foi parco em palavras, ao referir apenas que vai "esperar" para decidir até ver o texto da lei.

Este domingo, no comentário habitual no Jornal da Noite da SIC, Luís Marques Mendes declarou que, “se o Presidente quiser fazer um favor a António Costa, então faz um veto político à lei das 35 horas. Se não quiser fazer um favor, então promulga a lei”.

O comentador acredita que o veto da medida por parte de Belém “reforça a unidade dentro da coligação e ajuda António Costa no sentido em que este tem mais tempo para aplicar a lei, porque um veto político numa matéria desta natureza não tem consequências”, porque a lei pode ser aprovada pela maioria parlamentar na Assembleia.

O Governo de coligação PSD/CDS-PP aumentou o horário semanal da Função Pública de 35 para 40 horas em 2013. A votação final global do diploma que repõe as 35 horas está agendada para 27 de maio.
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