A proposta de António Costa e Mário Centeno: o essencial do Orçamento

por Christopher Marques - RTP
O ministro das Finanças, Mário Centeno, apresentou esta sexta-feira a proposta de Orçamento do Estado para 2016. José Sena Goulão - Lusa

Em 2016, muitos portugueses deverão mesmo ter mais dinheiro no bolso. A verdade é que muitos também terão mais impostos para pagar. Estas são as duas primeiras conclusões que surgem da análise à proposta de Orçamento do Estado para 2016. Explicamos-lhe o essencial do documento apresentado por Mário Centeno.

A partir de abril, muitos portugueses terão mais dinheiro na carteira. Esta é uma das primeiras ideias que surge da análise do Orçamento do Estado para 2016. Estes beneficiarão, nomeadamente, do fim dos cortes nos salários dos funcionários públicos e das mudanças na sobretaxa de IRS.

No entanto, também há más notícias: o Orçamento de Mário Centeno prevê vários aumentos de impostos. Eis o essencial da proposta de Orçamento apresentada pelo ministro das Finanças e que resulta das negociações à esquerda e com a Comissão Europeia.
Cenário macroeconómico
Documento novo, previsões novas. Os dados que sustentam o Orçamento do Estado apresentam novas variações em relação aos documentos anteriormente apresentados.

O Executivo prevê que a economia cresça 1,8 por cento este ano, abaixo dos 2,1 por cento que tinham sido estimados no esboço apresentado há duas semanas. Mesmo assim, o valor é superior aos números mais recentemente divulgados pelas instituições internacionais. Nas previsões de inverno, a Comissão Europeia aponta para um crescimento de 1,6 por cento, mas o Fundo Monetário Internacional, no comunicado libertado após a terceira avaliação pós-resgate, aponta para um crescimento de 1,4 por cento.

Já a previsão do défice foi revista em baixa. O Executivo pretender chegar ao fim do ano com um défice orçamental de 2,2 por cento, números 2,1 pontos percentuais inferiores aos 4,3 por cento verificados em 2015. A previsão de défice é inferior à que tinha sido referida no esboço (2,6 por cento) e no programa de Governo (2,8 por cento).

Reportagem de Marina Conceição, Pedro Boa-Alma, João Martins, Carlos Felgueiras - RTP

A previsão do Executivo mantém-se mais favorável do que as feitas pelas instituições internacionais. O FMI prevê que Portugal chegue ao fim de 2016 com um défice de 3,4 por cento e Bruxelas aponta para um saldo orçamental de 3,2 por cento.

Costa e Centeno querem atingir uma dívida que seja equivalente a 127,7 por cento do Produto Interno Bruto em 2016.

Uma meta superior à que tinha sido prevista no esboço orçamental (126 por cento) e no programa de Governo (123,9 por cento). Mantém-se ainda assim mais otimista do que as estimativas internacionais (128,2 por cento previstos pelo FMI e 128,5 por cento estimada por Bruxelas).
Administração e Empresas Públicas
Os funcionários públicos verão os cortes nos salários chegar ao fim ainda este ano. A medida era já conhecida e resulta dos acordos estabelecidos à esquerda e que permitiram a António Costa formar Governo.

No entanto, há novidades trazidas por este Orçamento. O Governo pretende reduzir o número de funcionários públicos, uma vez que só irá admitir um funcionário por cada dois que se reformem. O Executivo pretende poupar assim 100 milhões de euros. As previsões apontam para a saída de cerca de 20 mil funcionários em 2016, devendo ser admitidos apenas 10 mil.

Reportagem de Pedro Valador, Pedro Boa-Alma, João Martins - RTP

A proposta de Orçamento do Estado aponta também para que sejam suspensas as passagens à reserva e pré-aposentação dos militares da GNR. Esta medida afeta também o pessoal com funções policiais da PSP, SEF, PJ, Polícia Marítima e do corpo da Guarda Prisional.

No setor empresarial do Estado, a proposta de Orçamento volta a atribuir aos trabalhadores das empresas de transportes públicos e das gestoras de infraestruturas o direito a ter viagens de graça, direito que tinha sido restringido às deslocações de e para o trabalho pelo executivo de Passos Coelho.

O Orçamento mantém ainda a Contribuição para o Audiovisual, destinada a financiar o serviço público de rádio e televisão, nos atuais 2,65 euros. As empresas do setor empresarial do Estado continuarão impedidas de contratar trabalhadores no próximo ano, devendo continuar com o ajustamento dos seus quadros.
IRS
Foi curta a vida do quociente familiar. Conforme prometido, o Governo vai eliminar esta medida de Passos Coelho e substituí-la por deduções fixas por filho e por ascendente a cargo.

Em substituição do quociente familiar, o Governo pretende aumentar a dedução fixa de 325 euros por dependente para 550 euros – ou seja, o quociente familiar é substituído por uma dedução extra de 225 euros. No caso dos ascendentes a cargo, a dedução passa dos atuais 300 euros para os 525 euros.

No entanto, o Governo admite aumentar a dedução por filho, uma vez que quer que esta medide custe o mesmo que custou o quociente familiar – cerca de 250 milhões de euros. A correção do valor poderá ser feita ainda em fevereiro durante a discussão do Orçamento do Estado.

Reportagem de Manuela de Sousa, Hugo Antunes, Liliana Claro - RTP

Por enquanto, o fim do quociente familiar apresenta-se vantajoso para as famílias que auferem menos rendimentos, mas é menos favorável para parte da classe média e classes altas.

O Governo pretende também manter a majoração de 125 euros atribuída aos dependentes com menos de três anos de idade, bem como a majoração de 110 euros no caso de haver apenas um ascendente que viva com o agregado familiar e que aufira menos do que a pensão mínima.

Também, como já tinha sido anunciado, parte da sobretaxa é devolvida este ano. A sobretaxa é eliminada para as contribuições do escalão mais baixo de rendimentos e passa a progressiva para os escalões seguintes. Quem aufere rendimentos acima de 80 mil euros mantém a sobretaxa de 3,5 por cento.

Os escalões e as taxas de IRS não são alterados, sendo apenas atualizados os limites em 0,5 por cento, em linha com a inflação.
Automóveis
Quem pretenda comprar um veículo novo deverá pagar mais a partir de abril.

A proposta de Orçamento avança com um aumento do Imposto sobre Veículos. Este é o imposto que é pago ao Estado no momento do registo da primeira matricula em Portugal: ou seja, quando se compra um automóvel novo ou se importa um veículo (novo ou usado).

O OE 2016 aponta para um aumento de três por cento na componente cilindrada e de 10 a 20 por cento na componente ambiental, com um desagravamento para as viaturas menos poluentes.

Reportagem de Lavínia Leal, Filipe Silva, Cristina Gomes - RTP

Em 2016, o Executivo prevê um encaixe de 660,6 milhões de euros em ISV, valor bastante superior aos 573 milhões de euros amealhados em 2015. Para este ganho, o Executivo conta com o aumento do imposto bem como com uma “tendência expectável de recuperação na venda de veículos automóveis”, à semelhança do que se verificou em 2015.

Uma versão preliminar, que esteve na base de várias notícias na quinta-feira, apontava também para um aumento do Imposto Único de Circulação que é paga anualmente. De acordo com o Económico, o IUC será apenas aumentado de acordo com a inflação.

Quem pretender comprar um veículo elétrico também sai prejudicado. O subsídio irá ser cortado a meio, com a proposta de Orçamento a colocá-lo nos 2.250 euros. Este incentivo é valido mediante a entrega para abate de um veículo em fim de vida.

A manter-se este quadro, e apesar da queda, é de aproveitar para fazer a aquisição em 2016. O Expresso avança que a partir de 1 de janeiro de 2017, o montante do incentivo terá um corte adicional de 50 por cento.
ISP
Os portugueses pagarão mais pelo automóvel e também para o utilizar. O Imposto sobre Produtos Petrolíferos vai motivar um aumento de seis cêntimos por litro no gasóleo e na gasolina sem chumbo.

O Governo explica que o aumento do imposto aplicável aos combustíveis rodoviários pretende "corrigir a perda de receita fiscal, resultante da diminuição da cotação internacional". O aumento é superior ao que tinha sido apontado no esboço do Orçamento: previa-se ali um aumento de quatro cêntimos no gasóleo e de cinco cêntimos na gasolina.

O Governo prevê chegar ao fim de 2016 com uma receita de 2.703 milhões de euros em ISP, contando o Governo não só com o agravamento da carga fiscal mas também com o crescimento da atividade económica.

O Executivo deverá atribuir a empresas do setor dos transportes benefícios fiscais que compensem os encargos que terão de suportar devido ao aumento do ISP. A medida deverá abranger o setor dos transportes de passageiros, mercadorias e táxis.
IVA

A proposta de Orçamento confirma que o IVA na restauração vai sofrer alterações, passando de 23 para 13 por cento. Esta taxa aplica-se às refeições prontas em restaurantes, take-away e entregas ao domicílio. No entanto nem todas as bebidas beneficiam desta redução: bebidas alcoólicas, refrigerantes, sumos, néctares e águas gaseificadas.

Os apreciadores de bebidas vegetais recebem boas notícias. As bebidas de aveia, arroz e amêndoas sem teor alcoólico veem a taxa baixar para os seis por cento. Os sumos e néctares de frutos mantêm-se na taxa reduzida, da qual também os sumos de algas passam a beneficiar.
TSU
Uma das medidas faro de Mário Centeno não vai avançar. Afinal, o Governo não vai reduzir a Taxa Social Única para trabalhadores com salários inferiores a 600 euros. Este retrocesso permite ao Estado poupar 135 milhões de euros.
Outras taxas
O Executivo propõe um agravamento em 50 por cento do Imposto de Selo sobre o crédito ao consumo na proposta. O Governo de António Costa pretende que medida incentive a poupança das famílias, que enfrentam elevados níveis de endividamento.

“Esta medida limitada no tempo, durará até 2018 e visa fomentar o aforro e desincentivar o endividamento com vista ao consumo", lê-se no documento.
 
As operações de pagamento de bens com cartões também passarão a ser alvo de imposto de selo. Será aplicada uma taxa de quatro por cento.

O Governo pretende aumentar a receita com a contribuição extraordinária para o Fundo de Resolução, prevendo receber mais 50 milhões de euros com a medida.

Os impostos vão ainda aumentar nas bebidas alcoólicas e no tabaco. O imposto aplicado à cerveja, bebidas espirituosas e vinhos licorosos será aumentado em três por cento. No caso do tabaco, cada maço deverá aumentar, em média, cerca de sete cêntimos.
Saúde
Na saúde, as notícias até são positivas para a carteira dos portugueses. O Orçamento prevê uma redução de 25 por cento nas taxas moderadoras e um alargamento das isenções nos cuidados de saúde primários e hospitalares. Bombeiros, dadores de sangue, células, tecidos e órgãos voltarão a estar abrangidos.

Em 2016, o Ministério da Saúde vê o seu orçamento aumentar em 258,5 milhões de euros face ao que terá sido gasto, de acordo com a execução provisória, no ano passado.

Para combater a falta de médicos, o Orçamento do Estado abre a porta a que os clínicos aposentados regressem ao Serviço Nacional de Saúde. Os clínicos poderão manter a reforma e receber 75 por cento da remuneração correspondendo à sua categoria.

O Governo comprometeu-se ainda reduzir em 60 milhões de euros os gastos com subsídios de doença através do reforço da fiscalização às baixas fraudulentas.
Famílias Carenciadas
O Orçamento prevê um reforço dos rendimentos das famílias mais carenciadas em 135 milhões de euros. Este valor será usado para reforçar os apoios sociais e repor os mínimos sociais nas prestações familiares.
Ajudas internacionais
Segundo o Orçamento do Estado, o Governo deverá contribuir com quase 107 milhões de euros no âmbito do programa de assistência financeira à Grécia.

Portugal enviará ainda 24 milhões de euros para o mecanismo de apoio da Turquia aos refugiados.
PPP
O Estado vai gastar mais dinheiro com as Parcerias Público-Privadas. Os custos vão aumentar 13,6 por cento em 2016 face às estimativas para 2015. Ao todo, serão gastos 1.690 milhões de euros, o valor mais alto até ao fim de vida dos contratos.

Os contratos rodoviários continuam a representar a maioria dos encargos – 1.206 milhões de euros. São ainda alocados 426 milhões para as PPP na área da saúde e 49 milhões para a segurança. As PPP ferroviárias, referentes ao metro Sul do Tejo, vão ter um custo de nove milhões de euros.


c/ Lusa
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