Governo de Tsipras prepara a Grécia para eleições no outono

por Christopher Marques - RTP
Face às divisões no Syriza, o próprio Governo assume como "provável" que haja eleições no outono. Yiannis Kourtoglou - Reuters

Quase sem câmaras, sem noitadas e sem últimas horas, é tempo para negociar em Atenas. Em clima ameno e de confiança, a Grécia e os credores vão discutindo e acertando as arestas daquele que será o terceiro programa de resgate. Entretanto, o outono promete ser bem mais turbulento. Face às divisões no Syriza, o próprio Governo assume como "provável" que o povo grego regresse às urnas.

Os termómetros aproximam-se dos 40 graus na capital helénica, mas o clima é bem mais ameno do que aquele que marcou o mês de julho. Sem noitadas nem declarações sucessivas, tenta-se chegar a acordo para um resgate que pode atingir os 86 mil milhões de euros. A política quente, essa, promete regressar no inverno. O  executivo aponta como "provável" que haja eleições no outono.

A possibilidade de os gregos voltarem a ser chamados às urnas já tinha sido avançada por Alexis Tsipras. O primeiro-ministro tinha-se mostrado, na semana passada, pronto para reconquistar uma maioria em eleições. A porta-voz do Governo grego deixa tudo ainda mais claro.

“O Governo de esquerda apenas continuará no poder se os deputados de esquerda votarem a favor do acordo", garante o porta-voz do Syriza.

“É provável que haja eleições no outono”, afirmou à rádio Vima FM, acrescentando que “tudo dependerá da estabilidade do Governo nos próximos tempos”.

A afirmação chega num período em que decorrem as negociações para um novo programa de resgate. E em que o Syriza se encontra dividido. Cerca de um quarto dos deputados do partido opõem-se às reformas e a novas medidas de austeridade.

“As diferenças não deverão prevalecer perante a unidade do partido e a estabilidade do país”, pediu o porta-voz Nikos Filis em entrevista à televisão pública grega, avisando que um fosso no partido poderá afetar o Governo. Na terça-feira, Filis também abria a porta a novas eleições.

“O Governo de esquerda apenas continuará no poder se os deputados de esquerda votarem a favor do acordo”, apontou.

O Parlamento grego votou recentemente as primeiras medidas de austeridade, numa votação que mostrou as cisões no seio do partido. As propostas só foram aprovadas porque mereceram o voto favorável dos partidos pró-europeístas à esquerda do Syriza, como a Nova Democracia, o PASOK e o To Potami.
À espera do resgate
A par das querelas syrizistas, prosseguem as negociações entre os credores e Atenas. As conversações decorrem discretamente, sem a pressão que caracterizou a assinatura do compromisso de Bruxelas.

O ministro grego das Finanças mostra-se confiante e afirma mesmo que as negociações correm melhor do que o que seria expectável.

"Apesar das dificuldades que enfrentamos, esperamos que este acordo ponha fim à incerteza quanto ao futuro da Grécia e da Zona Euro", aponta Alexis Tsipras.

“Tudo ficará fechado esta semana”, afirmou mesmo o sucessor de Yanis Varoufakis, sem se prolongar mais. A porta-voz do Governo grego acrescenta que o programa começa a ser escrito esta quarta-feira, mostrando-se com esperança que se fechará o acordo até 18 de agosto.

Alexis Tsipras afirma também que se está na reta final para chegar ao acordo. “Apesar das dificuldades que enfrentamos, esperamos que este acordo ponha fim à incerteza quanto ao futuro da Grécia e da Zona Euro”, aponta o primeiro-ministro, citado pela Reuters.

A confiança não significa que não haja diferenças. No que diz respeito às privatizações e à recapitalização dos bancos, debatidas na terça-feira, Euclid Tsakalotos admite “pequenas divergências”, mas ressalva que não lhe “parece que serão um problema”.

Na segunda-feira, os credores e o Governo grego debateram o sistema de pensões.

A nova troika, agora quadriga fruto da presença do Mecanismo Europeu de Estabilidade, quer que a idade de reforma passe dos 62 para os 67 anos. Credores e Governo grego acordaram já que as reformas não irão afetar quem se reformou antes de junho de 2015.
Um acordo em agosto
O calendário é menos apertado do que noutros tempos, mas continua a ser uma forte condicionante na governação helénica. Afinal, restam agora 15 dias para que Atenas tenha de reembolsar 3,5 mil milhões de euros ao Banco Central Europeu.

A Comissão Europeia considera que se está “na direção certa” mas ressalva que o “intenso trabalho continua”.

O dia 20 de agosto é agora o novo deadline. Atenas precisa que o acordo de resgate esteja fechado até lá, para conseguir enviar o cheque para Frankfurt. O acordo terá ainda de ser ratificado pelo Vouli, o fragmentado Parlamento helénico.

O prazo, apesar de parecer longo numa Europa perita em acordos de última hora, acaba por não ser assim tão alargado. É “ambicioso”, aponta a Comissão Europeia, embora considere possível que se chegue a acordo antes do fim do mês.

“É um calendário ambicioso, mas realista”, aponta Andreeva.

Num comunicado enviado à Reuters, a porta-voz da Comissão Europeia saúda a “postura construtiva” do Governo helénico, e refere que Bruxelas está “motivada com os progressos alcançados”.

 A Comissão Europeia considera que se está “na direção certa” mas ressalva que o “intenso trabalho continua”.
Juncker admite novo empréstimo-ponte

Também Jean-Claude Juncker se mostra confiante que se chegará a acordo antes de dia 20 de agosto. Mas abre já a porta a um novo empréstimo-ponte, caso o acordo não chegue a tempo.

Se o prazo for curto, “teremos de recorrer a uma segunda edição do mecanismo de financiamento-ponte”, admite. Foi este o mecanismo usado para emprestar sete mil milhões de euros a Atenas, dinheiro que foi maioritariamente usado para fazer os pagamentos em atraso ao FMI e reembolsar o BCE.

Em Atenas não se quer ouvir falar em novo empréstimo-ponte. O porta-voz do grupo parlamentar do Syriza reforçou que a Grécia quer que se dê início ao programa de resgate, com uma primeira transferência de 25 mil milhões de euros. Atenas quer o programa completo, não novas medidas temporárias.
Bolsa no vermelho
A bolsa helénica voltou a acordar no vermelho. O principal índice Athex caía quase quatro por cento a meio da manhã. Os bancos continuavam a ser fortemente afetados, com as ações a cair mais de 20 por cento às primeiras horas desta quarta-feira. Mesmo assim, longe das quedas de 30 por cento, o máximo permitido, que se verificaram na segunda e na terça-feira.

Os bancos continuavam a ser fortemente afetados, com as ações a cair mais de 20 por cento às primeiras horas desta quarta-feira.As perdas avultadas - os bancos gregos perderam cerca de 50 por cento de valor em bolsa em dois dias - eram já antecipadas pelos analistas. Recorde-se que a bolsa grega estava fechada desde dia 29 de junho, depois de Alexis Tsipras ter convocado o referendo ao acordo.

Também há boas notícias no sector financeiro grego. Um responsável do Banco da Grécia avança que houve um aumento dos depósitos nos últimos dias, depois da fuga que tinha marcado as últimas semanas.

Os gregos parecem estar a recuperar confiança na banca. Fonte do Banco da Grécia avançou à Bloomberg que os depositantes não serão chamados a participar na recapitalização dos bancos.
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