Governo legaliza Uber e Cabify até final do ano entre promessas de protestos

por RTP
Lucy Nicholson - Reuters

O ministro do Ambiente anuncia que vai legalizar a atividade de plataformas eletrónicas como a Uber e a Cabify, usadas para chamar um carro com motorista. Esta semana é entregue a proposta de diploma aos parceiros do sector para um período de consulta pública. A Uber Portugal diz que Governo deu um “primeiro passo” para um quadro regulatório moderno, mas os representantes dos taxistas prometem contestação à proposta.

Portugal será um dos primeiros países europeus a dar enquadramento legal a plataformas online que permitem solicitar um serviço de transporte com motorista. Um processo que se antevê conturbado, com os taxistas a dirigirem críticas ao Governo e a prometerem luta. Para dia 10 de outubro está marcado um protesto junto à Assembleia da República.

O ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, revela que o Governo tem já pronto o decreto para legalizar estas aplicações usadas para chamar um carro com motorista e que a proposta vai ser esta semana colocada em consulta pública. O Executivo espera contributos que possam trazer alterações e melhorias, mas considera desde já que a proposta de lei que apresenta é “muito justa e equilibrada" e quer que esteja em vigor até ao final do ano.

Em declarações à Antena 1, o ministro do Ambiente diz que esta proposta é "muito importante para colocar dentro da legalidade quem estava no borderline", neste caso as plataformas de transporte Uber e Cabify.

"Com estas novas regras a nossa expectativa é que os mecanismos de concorrência desleal desapareçam e que fique salvaguardada a posição dos consumidores", refere o ministro.

Em circulação em Portugal desde 2014, a Uber opera em mais de 67 países. A empresa não tem motoristas nem carros próprios, mas contrata esses serviços. A Cabify começou a funcionar em Portugal desde o ano passado.
Uber aplaude…
A Uber Portugal veio já elogiar o que chamou “um primeiro passo” de Portugal para que o país tenha “um quadro regulatório moderno e transparente”.

Numa resposta enviada às redações, a Uber realça que a decisão do Governo surge alinhada com os interesses dos cidadãos portugueses e motoristas.

"Parece-nos, pelo que tem sido dado a conhecer, que o Governo ouviu a grande maioria dos cidadãos portugueses na sua aspiração por uma mobilidade urbana mais moderna em Portugal”, refere a empresa.…taxistas contra-atacam

Antral e Federação Portuguesa do Táxi reuniram-se esta segunda-feira para delinear uma posição conjunta. Da reunião entre as duas estruturas que representam os taxistas surge a garantia de que a contestação é para manter e realçam que o Governo tem de fazer parar a operação da Uber ou Cabify, depois das decisões dos tribunais nesse sentido. Só depois haverá espaço para conversar ou para delinear uma lei para estas plataformas.

Uma posição reforçada tanto por Carlos Ramos, da Federação Portuguesa do Táxi, como por Florêncio de Almeida, da Antral. Ambos criticam que o Governo tenha vindo fazer declarações à comunicação social, anunciando este diploma, sem que tivesse já feito o documento chegar às associações para que o pudessem analisar.

Carlos Ramos considera ainda que esta é uma “não notícia”, já que o diploma, pelo que é descrito na comunicação social, é apenas uma “cópia” do que são as recomendações feitas pelo grupo de trabalho.

Os taxistas tinham já marcada para dia 10 de outubro uma manifestação frente à Assembleia da República. Um protesto que se vai manter.

Florêncio de Almeida diz que esta é “uma forma hábil do governo para desmobilizar a manifestação de dia 10, mas com toda a certeza, só vem reforçar mais a posição”.

Há poucos dias, o representante da Antral sublinhava já que os taxistas estavam prontos para acampar à frente da Assembleia, por tempo indeterminado.

A Federação de Táxis já tinha acusado o Governo de faltar à "palavra dada". Carlos Ramos recordou que, no Parlamento, o ministro prometeu que "qualquer operador que se instalasse em Portugal" teria de cumprir "com as regras e com as exigências que são feitas aos táxis".

Nos últimos meses a atividade de aplicações como a Uber tem vindo a ser contestada pelos taxistas, com alguns momento de tensão e agressões entre taxistas e os motoristas ligados a estes serviços.
PCP alerta para sobrevivência do táxi
O PCP tinha já agendada para esta semana a apresentação de um documento no Parlamento sobre o reforço das medidas dissuasoras da atividade ilegal no transporte em táxi. Numa reação a esta iniciativa do Executivo no sentido de legalizar as plataformas eletrónicas, Vasco Cardoso, da comissão política dos comunistas, sublinha que esta decisão do Governo "vem prejudicar" o setor do táxi e "favorecer" as multinacionais, sobretudo estrangeiras.

"Não acompanhamos esta decisão do Governo. Vamos contestá-la e apelamos à mobilização do sector do táxi para que, com a sua intervenção, lute e não permita que esta decisão vá adiante", disse à Lusa Vasco Cardoso.

Para Vasco Cardoso, com esta atuação, o Governo está a "abrir a porta à liquidação" de um setor estratégico em Portugal que envolve largos milhares de pequenas e médias empresas, "entregando o transporte individual de passageiros às multinacionais com todos os riscos associados".

"Entendemos esta decisão do governo como uma cedência às imposições e interesses das multinacionais”, sublinha o comunista.
O que quer a lei?
Mas afinal o que prevê esta proposta? Traçamos um resumo do que esta legislação pretende.

Para já, o que não muda: não haverá qualquer alteração ao regime legal que se aplica aos táxis, com quem estas plataformas concorrem diretamente.

O “transporte em veículos descaracterizados” passará a ser a forma como este transporte será denominado. Uma atividade privada de mero interesse público, sem obrigações ou benefícios de serviço público.

“O táxi é uma atividade privada mas está sujeita a obrigações e benefícios fiscais, como reduções no imposto do veículo, incluindo combustíveis, majoração em sede de IRC e isenção do selo do carro”, refere o ministro do Ambiente ao Negócios.

Ou seja, quem trabalhe através da Uber ou Cabify não terá direito aos benefícios dos taxistas, tanto ao nível fiscal como de circulação nas localidades.

Aos motoristas que operam através destas plataformas, a intenção é ser-lhes exigido formação e um título de condução específico, avançam os jornais Público, Diário de Notícias e Negócios. O tempo de formação deverá ser de 30 horas, algo que é contestado pelos taxistas, já que a formação exigida a quem conduz um táxi é muito superior. O ministro do Ambiente sublinha que o diploma ainda poderá ser alterado.

Já os carros, que não podem ter mais de sete anos, passam a ter de estar identificados com um dístico, terão de ter um seguro semelhante ao dos táxis e serão obrigados a emitir uma fatura eletrónica.

Os motoristas da Uber ou da Cabify não poderão apanhar clientes que lhes peçam para parar na rua (só podem ir buscar quem os chama através da aplicação) e não poderão usar as praças dos táxis ou os corredores reservados para transportes públicos nas cidades.

As plataformas serão consideradas fornecedoras de serviços de tecnologia, mas terão de pedir autorização ao regulador dos transportes para funcionar. Não terão, porém, os benefícios fiscais dos taxistas.
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