Amnistia Internacional denuncia centenas de mortes por armas químicas no Darfur

por Christopher Marques - RTP
Centenas de pessoas foram obrigadas a fugir devido ao conflito Cortesia da Amnistia Internacional

A Amnistia Internacional apresenta "provas credíveis" de que estão a ser usadas armas químicas no Darfur. E estima que mais de 200 pessoas tenham morrido em resultado da exposição a agentes químicos. A guerra naquela região do Sudão dura há 13 anos. A organização sublinha que "nada mudou" no conflito. Mas o mundo deixou de olhar para ele.

A denúncia parte da Amnistia Internacional e volta a trazer o conflito do Darfur para a agenda diária. A organização não-governamental teve acesso a “provas credíveis” de que o Governo sudanês usou armas químicas no conflito que já dura há 13 anos.

A organização afirma que terão ocorrido pelo menos 30 ataques com armas químicas na zona de Jebel Marra desde janeiro de 2016. O último ocorreu a 9 de setembro.

As provas focam-se nos últimos oito meses de conflito, baseando-se em imagens de satélite e em mais de 200 entrevistas com sobreviventes e analistas. A Amnistia Internacional acredita que entre 200 a 250 pessoas morreram em resultado da exposição a agentes químicos.
Imagens "verdadeiramente chocantes"
Centenas sobreviveram aos ataques, mas acabaram por sofrer as consequências da exposição aos agentes químicos: problemas respiratórios, de visão e vómitos.

“As imagens e vídeos que vimos durante a nossa investigação são verdadeiramente chocantes. Num deles, uma jovem criança grita com dores antes de morrer. Muitas fotografias mostram crianças cheias de lesões e bolhas. Alguns não conseguiam respirar e vomitavam sangue”, explicita Tirana Hassan, responsável da Amnistia Internacional, em nota enviada à comunicação social.

Os testemunhos feitos à Amnistia Internacional dão conta de chamas quando as bombas foram lançadas, seguindo-se fumo preto. Em alguns casos, o fumo passou depois a azul. Confrontados com os relatos, especialistas em armas químicas avançam que estarão em causa gases tóxicos como lewisite e gás mostarda.

“O uso de armas químicas é um crime de guerra. As provas que juntámos são credíveis e retratam um regime que tem a intenção de atacar a população civil no Darfur sem qualquer receio de uma resposta internacional”, analisa Tirana Hassan.
“Nada mudou mas parámos de ver”
A organização não-governamental refere que pelo menos 171 aldeias foram destruídas ou danificadas nos últimos oito meses. A grande maioria dos ataques foi levada a cabo em aldeias onde não havia indícios da presença de oposição armada.

A Amnistia fala em violação de direitos humanos, com o bombardeamento sistemático de civis, o homicídio de homens, mulheres e crianças e violações.

“Esta região está refém de um ciclo catastrófico de violência que dura há mais de 13 anos. Nada mudou, tirando o facto de que o mundo deixou de ver”, refere em comunicado Tirana Hassan.

A organização constata que, apesar da existência uma missão de paz da União Africana e das Nações Unidas, não foram tomadas medidas eficazes para proteger os civis, e que as conversações e acordos de paz não trouxeram segurança às populações locais.

A organização não-governamental apela ao Conselho de Segurança das Nações Unidas para que pressione o Governo do Sudão de forma a assegurar que as missões de manutenção de paz e as agências humanitárias consigam chegar a Jebel Marra.

A AI pede ainda uma investigação urgente ao uso de armas químicas no Darfur, bem como que seja garantido o respeito pelo embargo de armamento.
Treze anos de conflito
A região de Darfur tem cerca de 500 mil quilómetros quadrados, o equivalente a cinco vezes a área de Portugal. Está em guerra há 13 anos.

A zona de Jebel Marra tem cerca de cinco mil quilómetros quadrados, sendo um maciço vulcânico localizado no centro do Darfur. Segundo a Amnistia Internacional, esta é a região do Darfur onde os solos são mais férteis, albergando cerca de 1.500 localidades.

Jebel Marra apresenta-se como a base da rebelião contra o regime de Cartum, estando na origem da criação da Frente de Libertação do Darfur, agora denominado de Exército de Libertação do Sudão.



Darfur está em guerra desde 2003. São 13 anos de um conflito violento entre o Governo do Sudão e grupos armados, caracterizados por muita violência. Esta luta mereceu atenção mediática há quase dez anos, tendo até merecido intervenção por parte da então presidência portuguesa da União Europeia.

A guerra civil do Darfur é motivada por motivos étnicos, religiosos mas também económicos. A Amnistia refere que, em resposta aos ataques da oposição armada, o Governo de Cartum tem respondido com violência não só contra os grupos armados, mas também contra a população civil.

Centenas de milhares de pessoas perderam já a vida neste conflito. O número de refugiados aproxima-se dos três milhões.
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