"Cão louco": o provável secretário da Defesa na era Trump

por RTP
Mike Segar, Reuters

"Cão louco" mais parece o nome do chefe de uma tribo ameríndia. Mas chefes desses já há poucos e nunca um deles iria chefiar o Pentágono. O general que Trump quer pôr à frente das Forças Armadas mais poderosas do mundo ganhou a alcunha pela sua personalidade excêntrica.

James Mattis, general de quatro estrelas, reformado do corpo de fuzileiros, tem uma carreira longa de 44 anos, que inclui operações de uma força especial no sul do Afeganistão em 2001 e um comando de tropas durante a invasão daquele país em 2003. Depois disso comandou uma força de fuzileiros em 2004, na batalha de Falluja, a mais sangrenta ocorrida durante a ocupação do Iraque.

Mattis tem-se notabilizado pelas suas tiradas incendiárias. Uma delas foi a que sustentava ter "piada" matar afegãos que oprimem as mulheres, recolhida durante uma conversa com militares de San Diego, também em 2004, e agora reproduzida no site bnritânico The Independent.
A citação
Na verdade, tem muita piada combatê-los (...) Tem piada abater algumas pessoas (...) Vamos para o Afeganistão, há lá tipos que andam há cinco anos a espancar as mulheres porque não usam véu. Sabem, tipos assim de qualquer modo já não têm qualquer resto de virilidade. Por isso, tem montes de piada abatê-los".

Na altura, as declarações causaram escândalo e Mattis sofreu consequências disciplinares por esse rompante politicamente incorrecto. De qualquer modo, a sua carreira parecia aproximar-se do fim. Mas agora, no sábado, no âmbito das sondagens que vem fazendo para a sua equipa de topo, Donald Trump reuniu-se com ele e manifestou uma mal disfarçada preferência por ele para a pasta da Defesa.

Por outro lado, Mattis emite frequentes juízos sobre a política externa norte-americana, em especial no Médio Oriente. Não fez segredo, por exemplo, da sua hostilidade ao acordo assinado com o Irão, para controlo da proliferação das armas nucleares. Em todo o caso, esse questionamento não constitui opinião solitária e, portanto, não causou assinalável perturbação política.

Muito mais heterodoxa, e especialmente preocupante para o establishment político israelita, são as opiniões críticas que tem emitido sobre os colonatos. Segundo citação do diário israelita Haaretz, Mattis chamou a atenção para o facto de a disseminação dos colonatos ir converter Israel, inevitavelmente num regime de apartheid.

As declarações de Mattis são elucidativas. Numa, afirma: "Se eu estiver em Jerusalém e puser ali 500 colonos judeus na parte Leste, e se aí houver 10.000 moradores árabes, se traçarmos a fronteira de modo a incluí-los, ou isto deixa de ser um Estado judeu, ou então diz que os árabes não têm direito de voto - apartheid".

Além disso, Mattis tem afirmado que os EUA pagam um preço político pelo seu apoio incondicional a Israel e invoca a sua própria experiência: "Eu paguei um preço de segurança militar em cada dia que comandei o CentCom, porque os americanos eram vistos como parciais a favor de Israel, e isso moderava os árabes moderados que querem estar connosco, porque eles não podem aparecer publicamente a apoiar pessoas que não respeitam os árabes palestinianos".

Também o diário israelita Jerusalem Post manifesta apreensão perante a escolha considerada mais provável de Trump para a pasta da Defesa, chamando a atenção para a inconsistência entre as declarações de Mattis e o que têm sido linhas de orientação anunciadas para a política externa da nova Administração.

Assim, ao contrário de Trump, que tem mostrado abertura a uma colaboração com o Governo sírio, Mattis não hesita em classificar Bashar al-Assad como "assassino". Ao contrário de Trump, que tem mostrado verdadeiro fascínio pela governação de Putin, Mattis afirma que a Rússia é um Estado "predador".

Aquele diário israelita sublinha a sua apreensão citando a frase atribuída a Mattis como lição de vida: "Sejam educados, sejam convencionais, mas estejam preparados para matar toda a gente que encontram".
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