Congresso rejeita veto de Obama à lei do 11 de Setembro e arrisca conflito diplomático

por Andreia Martins - RTP
Ao 12.º veto de Obama em oito anos, o Capitólio contrariou pela primeira vez uma decisão do Presidente Ivan Alvarado - Reuters

Pela primeira vez em quase oito anos de mandato, o Congresso norte-americano rejeitou um veto de Barack Obama sobre a possibilidade de as famílias das vítimas do 11 de Setembro poderem processar a Arábia Saudita por apoio ao terrorismo. O Presidente norte-americano avisa que a sobreposição pode criar “um perigoso precedente”.

A apenas quatro meses de abandonar a Casa Branca, Barack Obama vê um veto presidencial ignorado pelo Capitólio, onde o Partido Republicano tem maioria. A Câmara dos Representantes manteve a decisão do Presidente norte-americano, mas a câmara alta do Congresso norte-americano foi perentória na decisão, com 97 senadores a rejeitarem o veto e apenas um a aprová-lo. Também a câmara baixa deixou uma resposta clara, com 348 deputados a votarem contra o veto e apenas 76 a apoiarem a decisão do presidente. 

Desta forma, o polémico decreto, conhecido por “Ato sobre Justiça Contra Patrocinadores do Terrorismo” (ou JASTA - "Justice Against Sponsors of Terrorism Act") passa a ser lei nos Estados Unidos, o que permite à justiça renunciar ao pedido de imunidade soberana estrangeira quando um ato de terrorismo acontece em território norte-americano. 

Em maio, o decreto tinha passado nas duas câmaras do Congresso de forma unânime, mas Obama vetou a decisão na passada sexta-feira. O Presidente norte-americano justificou-se argumentando que o país ficaria mais vulnerável a processos judiciais de retaliação em tribunais estrangeiros. 

Uma situação que colocaria, segundo Obama, as tropas americanas fora dos Estados Unidos numa situação de grande risco legal. Os apoiantes da lei denotam que o texto agora aprovado está delineado apenas para atos de terrorismo que ocorram em território norte-americano. 
“Voto político”
Em declarações à CNN, Barack Obama considera que a negação do seu veto constituiu “um erro” e uma decisão puramente de natureza política.

“Votar contra as famílias do 11 de Setembro mesmo antes de uma decisão que seria difícil de entender. Mas teria sido a decisão correta. Foi, basicamente, um voto político”, disse Obama. 

Obama argumenta que as vítimas e as respetivas famílias merecem apoio e compensações, mas que a possibilidade de processarem Riade poderá ser negativa para o futuro dos Estados Unidos.

“Esta lei permite que um cidadão que se sinta vítima de terrorismo - e que outro país não fez o suficiente para travar um dos seus cidadãos de levarem a cabo atos terroristas - possa levar uma ação para tribunal. O problema é que, se acabamos com esta noção de imunidade soberana, os nossos homens e mulheres de farda espalhados pelo mundo podem começar a sentir-se sujeitos a leis de reciprocidade”, ou seja, expor militares norte-americanos a leis semelhantes que outros países possam aprovar. 

Os senadores democratas Tim Kaine, candidato a vice-presidente ao lado de Hillary Clinton, e Bernie Sanders, adversário da antiga secretária de Estado nas eleições primárias, não estiveram sequer presentes na sessão.    
Resposta saudita?
Quem também se opõe à legislação é a Arábia Saudita, um dos mais antigos aliados dos Estados Unidos na região do Médio Oriente, e que nega qualquer papel nos ataques terroristas ocorridos a 11 de Setembro, ainda que 15 dos 19 terroristas identificados fossem cidadãos sauditas. 

A relação entre os dois países já tinha sofrido um forte abalo desde a reaproximação dos Estados Unidos ao Irão, com o acordo nuclear alcançado em 2015.  

Para já, a única reação vinda do Médio Oriente aconteceu nos mercados, com o valor do Riyal saudita a cair face ao dólar.

Qualquer ação legal levada a cabo por familiares das vítimas dos ataques em 2001 levará anos a percorrer o sistema judicial norte-americano e vários analistas já consideraram que essas ações teriam pouco ou nenhum impacto na economia e finanças sauditas. Ainda assim, a decisão do Congresso norte-americano evidencia a posição de fragilidade de Riade, numa altura em que os preços do petróleo continuam a atingir mínimos históricos. 
O primeiro veto
Ao longo de oito anos de mandato, Barack Obama emitiu 11 vetos. Em todos, o Congresso optou por manter a decisão do Presidente, algo que não se verificou no voto desta quarta-feira.  

“A sobreposição a um veto presidencial é algo que não tomamos de ânimo leve. Mas era importante que as famílias das vítimas pudessem procurar fazer justiça, mesmo que essa intenção provoque desconfortos diplomáticos”, considerou o senador democrata Charles Schumer.


Foto: Gary Cameron - Reuters
 
Há muito que as famílias das vítimas do maior ataque terrorista em solo americano, que provocou quase três mil vítimas mortais, pretendiam a aprovação desta lei. Ainda este mês, quando se assinalaram os 15 anos do ataque, ocorreram vários protestos à porta da Casa Branca e do Capitólio. 

“Alegramo-nos com este triunfo e estamos ansiosos por chegar a tribunal, pelo dia em que vamos finalmente obter mais respostas sobre quem foi realmente responsável pelos ataques”, disse Terry Strada, uma das familiares que perdeu o marido no 11 de Setembro, citada pela agência Reuters.
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