Governo francês admite alterações mas recusa ceder na reforma laboral

por Christopher Marques - RTP
Philippe Wojazer - Reuters

A reforma laboral em França é para avançar mas poderá haver modificações. A garantia foi dada esta quinta-feira pelo primeiro-ministro francês, dia em que o país enfrenta um nova jornada de greves e manifestações.

Em entrevista à RMC, o chefe do Governo recusou retirar a polémica reforma laboral, mas admitiu introduzir alterações pontuais, desde que estas não alterem “a filosofia” do texto.

O governante mantém que não irá “mudar de direção” e que a lei é “boa para as empresas”, “boa para os trabalhadores” e “boa para os sindicatos”.

Manuel Valls critica ainda a ação da Confederação Geral do Trabalho (CGT), central que tem liderado o movimento de oposição à nova lei.

Perante os problemas no abastecimento de combustíveis, o Governo socialista assegurou que vão continuar a ser desbloqueados os acessos a instalações petrolíferas e industrais que tenham sido encerrados por piquetes.
Artigo polémico

O primeiro-ministro francês garante que não será alterada “a filosofia” da nova lei. Manuel Valls fecha ainda a porta a um abandono do segundo artigo desta lei e que tem sido o principal alvo dos sindicatos.

O artigo em causa altera a hierarquia das normas. As leis organizam-se em hierarquias e este artigo altera esta mesma hierarquia. Podemos considerar que no topo da hierarquia está o Código do Trabalho em si e que garante os direitos mínimos dos trabalhadores.

A partir daqui, o que é assinado não pode ser menos favorável do que a lei base. Ou seja, um acordo de trabalho de determinado setor não pode ser menos vantajoso do que o Código do Trabalho.

Por sua vez, um acordo de empresa não pode ser menos vantajoso do que um acordo setorial e do que o Código do Trabalho. Por fim, os contratos de trabalho não podem ser menos vantajosos do que todos os anteriores.
"Primazia do acordo de empresa"

O que o segundo artigo da nova lei laboral prevê é que a “primazia do acordo de empresa sobre o tempo de trabalho torna-se o princípio de direito comum”. Ou seja, o acordo de empresa ficaria acima do acordo setorial em alguns temas.

Fica assim aberta a porta a que os trabalhadores tenham um horário de trabalho e normas relativas a tempos de descanso, férias pagas e horas extraordinárias menos vantajosas do que o previsto no acordo setorial.

Com esta norma, o Executivo francês tenta dar maior liberdade às empresas, permitindo que estas se adaptem às suas próprias dinâmicas internas.

O Governo mostra-se convicto que os trabalhadores não serão prejudicados, uma vez que acredita que os sindicatos não aceitarão acordos de empresa menos vantajosos do que o acordo setorial.

Os opositores à nova legislação não confiam e dizem temer que as empresas acabem por exercer chantagem - nomeadamentea ameaça de despedimentos - para aprovar acordos de empresa menos vantajosos do que os acordos setoriais.
Dia de protestos
Enquanto Manuel Valls falava, começava um novo dia luta. Uma greve intersectorial contra a reforma laboral está esta quinta-feira a paralisar centros petrolíferos e também centrais nucleares.

Trata-se da oitava jornada de mobilização convocada pelos sindicatos desde março com o objetivo de exigir a retirada do projeto de lei, que os sindicalistas acusam de destruir os direitos dos trabalhadores.

As paralisações afetam ainda gráficas e centros de distribuição de jornais. As edições impressas dos diários francesas não estão nas bancas. Le Figaro refere que a exceção é o jornal comunista L’Humanité que publica uma artigo de opinião da central sindical CGT.

Le Monde explica que, perante a recusa dos dirigentes do jornal em publicar o comunicado da CGT, não foi possível assegurar a circulação da edição impressa.
Aeroportos afetados
A greve atinge ainda os aeroportos, com as autoridades francesas a terem recomendado o cancelamento de 15 por cento dos voos no aeroporto de Paris – Orly e a preverem perturbações nas restantes infraestruturas aeroportuárias.

Mais de uma dezena de ligações aéreas entre França e Portugal foram cancelados: três voos com origem em Lisboa, dois que partiriam do Porto e dois com saída de Faro. Os bloqueios continuam ainda em refinarias e multiplicam-se os postos de abastecimento que não têm combustível.

A paralisação chega agora também às centrais nucleares, com 16 das 19 centrais nucleares a terem aprovado a greve. Estão ainda previstas manifestações um pouco por todo o país.

Depois da oitava jornada de luta intersectorial, a nona já está em preparação. Está marcada para o próximo dia 14 de junho, quando a França já estiver com a festa do Europeu de futebol. Aliás, este é precisamente o dia em que a seleção portuguesa se estreia na competição.

Os pupilos de Fernando Santos defrontam a Islândia em Saint Etienne, cidade que fica a cerca de 60 quilómetros a sul de Lyon. Já os protestos em refinarias deverão continuar nos próximos dias.
Tópicos
pub