ONU quer administrar corredores humanitários em Aleppo

por Graça Andrade Ramos - RTP
Um dos corredores humanitários abertos em Aleppo passa por aqui Abdalrhman Ismail - Reuters

O enviado da ONU à Síria, Staffan de Mistura sugeriu hoje que os corredores humanitários propostos pela Rússia em Aleppo sejam administrados pelas Nações Unidas. "A ONU e os seus parceiros humanitários sabem o que há a fazer. Têm experiência" sublinhou De Mistura, em Genebra.

As forças governamentais sírias isolaram há três dias as posições dominadas pelos militantes rebeldes em Aleppo, no norte do país, com a ajuda da Rússia. Na cidade vivem ainda cerca de 250.000 civis além de um número indeterminado de combatentes e as organizações humanitárias já disseram que só têm mantimentos para abastecer 145.000 pessoas para um mês.

A zona está a ser bombardeada desde dia 17 de julho, sem pausas.

A Rússia e o Governo sírio abriram corredores para possibilitar a saída aos civis e aos militantes que queiram render-se e evacuar a zona antes da entrada do exército governamental. Apenas 12 pessoas conseguiram aproveitar um dos corredores antes dos militantes garantirem o seu bloqueio, afirmou o Observatório sírio dos Direitos Humanos, citando fontes no terreno.

Já o responsável pelas operações humanitárias da ONU, Stephen O'Brien, apelou a "pausas humanitárias de 48 horas para permitir operações transfronteiriças e através das linhas da frente" de Aleppo.

"Ninguém deve ser forçado a fugir por um itinerário preciso ou para um determinado destino", argumentou O'Brien.
Rússia admite estudar proposta da ONU
No dia seguinte à proposta russa, aviões e helicópteros sírios lançaram panfletos sobre as áreas dos militantes, a propor-lhes a rendição e a saída através de um determinado 'corredor'.

Moscovo afirma que a função dos corredores é exclusivamente humanitária. Através da agência Interfax, o vice-ministro da Defesa, Anatoly Antonov, afirmou que "estamos prontos a fazer tudo o que pudermos para levar ajuda aos cidadãos pacíficos que estão reféns dos terroristas e até aos militantes que queiram pousar as armas".

A Russia admitiu também "estudar cautelosamente as sugestões da ONU e leva-las em conta" para melhorar a sua operação humanitária em Aleppo, afirmou por seu lado Alexei Borodavkin, o embaixador da Rússia junto da ONU em Genebra.

Os quatro corredores, três para civis e um para militantes que se rendam, estão abertos do lado governamental e encerrados do lado dos militantes, afirmam observadores no local.

A iniciativa dos corredores foi desacreditada tanto por habitantes dentro de Aleppo como por Paris.

A França considerou que os corredores não são uma "resposta credível" à situação. A par de Londres, o ministério francês dos Negócios estrangeiros apelou quinta-feira ao fim do cerco de Aleppo.

"O direito internacional humanitário exige que a ajuda possa ser encaminhada com a máxima urgência" às populaçoes cercadas, declaro o porta-voz de Martignon, Romain Nadal. "A hipotese de 'corredores humanitários' que consiste em pedir aos habitantes de Aleppo que abandonem a cidade não dá nenhuma resposta credível à situação", acrescentou.

O corredor de Bustan al-Qasr só foi usado por 12 habitantes de Aleppo antes de ser encerrado pelos militantes anti-Assad, afirmou o Observatório sírio dos Direitos Humanos Foto: Reuters
"Nunca sairemos"
Através de repórteres junto dos militantes de Aleppo, alguns dos habitantes da cidade recusaram a proposta, afirmando que "não irão nunca abandonar a sua cidade" nem usar os "corredores da morte".

"Nunca iremos sair da nossa cidade, não importa quantas dezenas de ataques aéreos ou bombardeamentos contínuos tenhamos de enfrentar", afirmou Murad al-Halabi, residente no distrito de Saladin ao The Syrian Voice.

O representante da Síria nas Nações Unidas entregou uma carta ao Conselho de Segurança na quinta-feira sublinhando o "cuidado com a segurança dos civis" em Aleppo. O Governo lançou por via aérea pequenos pacotes com ajuda alimentar.

"Um deles caiu no meu telhado", disse Murad al-Halabi. "Era pequeno, um saco de plástico com um pequeno pacote de geleia, uma escova de dentes, uma única fralda, uma lata de conserva, um pacote de chá e um único pacote de açúcar".

Vários residente de Aleppo queimaram os pacotes temendo ser envenenados.

"O regime de Assad e a Rússia estão a gozar com os habitantes de Aleppo e estão à procura de material de propaganda, esperando que a comunidade internacional esqueça a destruição e as mortes que provocaram", explicou Murad al-Halabi.
"Corredores da morte"
Esta sexta-feira a maioria das ruas dos bairros dos militantes estavam vazias, com os habitantes a manterem-se fechados em casa. A falta de combustível fez igualmente cessar o barulho dos geradores.

"Não há corredores humanitários em Aleppo, aos corredores de que falam os russos, os habitantes de Alepo chamam-lhes corredores da morte", afirmou à Agencia France Presse Ahmad Ramadan, membro da Coligação da oposição no exílio, oriundo de Aleppo e denunciando "uma destruição total e sistemática da cidade, uma tentativa para quebrar os seus habitantes".

"A mensagem brutal para o nosso povo é: partam ou morram de fome", reagiu por seu lado Bassma Kodma, outro membro da oposição.

Quinta-feira a televisão estatal síria mostrou imagens de habitantes de Aleppo do lado dominado pelo Governo, a festejar em delírio sob o slogan "Aleppo vitoriosa".

A cidade, a maior do norte da Síria, estava dividida entre as forças governamentais e as forças rebeldes desde o verão de 2012.
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