Racismo, segurança, política externa: os temas que dominaram o debate entre Clinton e Trump

por Andreia Martins - RTP
Segundo uma sondagem da CNN, o esperado embate entre os dois candidatos foi favorável à candidata democrata Brian Snyder - Reuters

Durante 90 minutos, os dois candidatos à Casa Branca apresentaram os seus argumentos e discutiram os temas que mais preocupam a opinião pública dos Estados Unidos. No primeiro debate rumo às eleições presidenciais de 8 de novembro, a experiência da ex-secretária de Estado norte-americana impôs-se perante o adversário republicano, que se mostrou mais à defesa.

Na Universidade de Hofstra, em Hempstead, Long Island, os dois candidatos à Sala Oval defenderam posições antagónicas sobre os principais temas que (pre)ocupam os norte-americanos. Distantes, em lados opostos, mas ainda mais apartados no que diz respeito a ideias e argumentos apresentados.

Depois das provocações e polémicas ao longo de vários meses de campanha, Hillary Clinton e Donald Trump apresentaram-se mais calmos e ponderados, não deixando, ainda assim, de protagonizar um dos debates presidenciais mais agressivos na história da política norte-americana.

Sobretudo quando a candidata democrata acusou o adversário de basear todo o seu ideário político em teses e conceções racistas. Clinton falou mesmo em “desprezo” de Trump pelos muçulmanos, lembrando que a comunidade é uma importante aliada no combate ao terrorismo e aos conflitos no Médio Oriente.

Alguns dos nomes mais influentes da política dos Estados Unidos - mas não só - convergiram para a Universidade Hofstra, em Hempstead, Long Island, onde Hillary Clinton e Donald Trump mediram forças no primeiro de três debates presidenciais.


Ainda durante a sua campanha nas eleições primárias, Trump apelou em várias ocasiões à proibição temporária da entrada no país de todos os muçulmanos.

“Ele insultou constantemente os muçulmanos, aqui e no estrangeiro”, acusou a antiga secretária de Estado de Obama.

Em resposta, Donald Trump considerou que o “caos total” do Médio Oriente se deve em muito à atuação da antiga governante.

"Olhamos para o Médio Oriente, é o caos total. Foi durante a sua liderança, em larga medida", reiterou o polémico candidato, que acusa especificamente a Administração Obama, que Hillary integrou durante o primeiro mandato, de criar as condições para o surgimento do Estado Islâmico, com a saída do Iraque, em 2011.

Segundo Trump, Obama deveria ter deixado cerca de "dez mil soldados ou mais" para manter a estabilidade no país e proteger as principais infraestruturas petrolíferas, cuja exploração encheu os cofres dos extremistas.
Guerra do Iraque
Clinton fez questão de lembrar que a saída das tropas foi fruto de um acordo assinado pelo anterior Presidente, George W. Bush, e o Governo do Iraque, no qual Obama não esteve envolvido.

"Donald apoiou a guerra do Iraque", atirou a democrata, sendo interrompida por Trump que afirmou repetidamente "errado, errado, errado".
 
Nesse momento, o moderador, Lester Holt, recordou que, em 2002, Trump manifestou o seu apoio à guerra numa entrevista, ao que Trump respondeu que tal informação foi "inventada" pela imprensa.

Nessa entrevista, quando questionado sobre se apoiava a intervenção, Trump disse: "Suponho que sim", uma afirmação que hoje o candidato diz ter significado: "Quem sabe".
“Não podemos ser polícias do mundo”
Durante o debate, Trump defendeu as suas principais teses no que diz respeito à ordem mundial e voltou a questionar alianças de longa data dos Estados Unidos, como a do Japão, país que considera que terá de pagar por esse apoio.

"Não podemos ser os polícias do mundo, não podemos proteger países em todo o mundo, onde não nos estão a pagar aquilo que precisamos", reiterou o candidato.

As questões de saúde, tão polémicas durante as últimas semanas, também não escaparam aos 90 minutos de debate. Donald Trump considerou que Clinton não tem "energia" suficiente para ser Presidente.

Durante um evento de homenagem às vítimas do 11 de Setembro, a candidata democrata sentiu-se mal e teve de abandonar a cerimónia mais cedo. O acontecimento levantou suspeitas sobre o seu estado de saúde. A campanha da candidata justificou mais tarde que se tratara de uma pneumonia.

"Não acredito que realmente tenha essa energia. Para ser Presidente deste país é preciso ter uma energia tremenda", disse Donald Trump.

Clinton respondeu, fazendo uso dos seus anos de experiência enquanto secretária de Estado e senadora: "Bom, quando ele viajar para 112 países e negociar acordos de paz, cessar-fogos, libertação de dissidentes, ou passar 11 horas a testemunhar perante um comité do congresso, então pode falar-me de energia".
Tensão racial
Outras questões sensíveis vieram à discussão, nomeadamente o tema das armas e da revolta da comunidade afro-americana perante a atuação da polícia. Com as imagens dos protestos de Charlotte e de tantos outros nos anos recentes presentes na memória, a candidata democrata culpou o fácil acesso às armas pela violência excessiva contra a comunidade norte-americana.

Em resposta, o candidato republicano contra-argumenta que "há duas palavras que a secretária Clinton não quer usar, que são lei e ordem”.

Sobre o tema, Clinton propôs três medidas contra a tensão racial: restabelecer a confiança entre a polícia e as comunidades afro-americanas, treinar os agentes e combater a "epidemia" da violência armada, que ceifa de forma desproporcionada a vida de jovens afro-americanos.

Ainda em questões raciais, Clinton acusou o seu rival na corrida deste ano à Casa Branca de lançar a sua carreira política através do apoio à teoria "racista", que questionou a cidadania do atual Presidente norte-americano.

Recentemente, Trump admitiu que Obama nasceu, de facto, nos Estados Unidos. Uma aceção que Clinton viu como uma forma de fechar o assunto e evitar mais embaraços.

"Mas isto não pode ser descartado tão facilmente. Ele realmente iniciou a sua atividade política com base nesta mentira racista de que o nosso primeiro Presidente negro não é um cidadão norte-americano", acusou a candidata.
Prosperidade e empregos
A economia foi um dos temas em destaque no tão esperado confronto entre os dois candidatos, tendo dominado sobretudo o início do debate. Donald Trump começou por salientar a fuga de empresas para países como o México ou a China, situação que aumentou o desemprego e desertificou os Estados de Ohio ou Michigan – aqui, um claro piscar de olhos ao eleitorado de dois swing states, tão importantes e decisivos em dia de eleições.

Donald Trump reiterou ainda a sua proposta de taxar as empresas que se mudem para outros países mas pretendam vender os seus produtos em território norte-americano.

Quando Trump acusou Hillary de apoiar o Acordo Trans-Pacífico de Cooperação Económica, a democrata retorquiu que o rival republicano vive "na sua própria realidade".

Também Hillary Clinton prometeu criar empregos caso seja eleita Presidente. A democrata acusou ainda Donald Trump de ter beneficiado da crise no setor imobiliário, que esteve no âmago da crise económica de 2008. Segundo Clinton, são sistemas como os que o adversário defende que vieram dar origem “à pior crise desde a Grande Depressão”.

"Donald foi um dos que se aproveitou da crise imobiliária", disse a antiga secretária da Estado.
E-mails, o tema incontornável
Os dois trocaram também acusações em volta de uma polémica que custa a Clinton a desconfiança e apreensão do eleitorado americano. O uso de um servidor privado para a troca de e-mails durante o tempo em que foi secretária de Estado voltou a ser um tema em cima da mesa.

Tal como noutras ocasiões, Hillary Clinton admitiu que cometeu um erro e assume a responsabilidade pelos seus atos, que a levaram a trocar correspondência eletrónica sobre assuntos de Estado e informação classificada através de um e-mail pessoal.

A democrata admitiu que hoje agiria de forma “diferente”. Até porque, segundo já disse o FBI, a secretária de Estado correu o risco de deixar cair informação sensível nas mãos de adversários e inimigos dos Estados Unidos.

Ao longo da campanha, Donald Trump foi instado a revelar informação sobre o pagamento de impostos. Sobre essa polémica, o candidato responde: "Vou divulgar as minhas declarações de impostos, contra a vontade dos meus advogados, quando ela divulgar os seus 33 mil e-mails, que foram apagados".

Clinton ripostou: "Não tenho motivos para acreditar que ele vá alguma vez divulgar as suas declarações de impostos porque há algo que está a esconder".
Clinton à frente
Se a eleição fosse esta terça-feira, no rescaldo do primeiro debate presidencial, Hillary Clinton seria eleita Presidente. Segundo uma sondagem da Reuters/Ipsos, a democrata conta com 41 por cento de intenções de voto, com quatro pontos de vantagem sobre Donald Trump.

Uma posição de vantagem que sai reforçada do primeiro debate. É que segundo uma sondagem da CNN a candidata democrata venceu o embate. Entre os inquiridos pela estação norte-americana, 62 por cento considerou que Clinton venceu o debate.

Apenas 27 por cento dos 521 inquiridos, todos eleitores registados, disseram que foi Trump quem se saiu melhor.

Entre os inquiridos, 41 por cento identificaram-se como democratas, enquanto apenas 26 por cento disseram ser republicanos. Os restantes disseram não ter filiação política.

Trump e Clinton vão voltar a debater nos próximos dias 9 e 19 de outubro, em Saint Louis, no Missouri, e em Las Vegas, no Estado do Nevada. Os Estados Unidos vão a votos a 8 de novembro.

c/ agências
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