Rússia e EUA com reunião à vista em momento de alta tensão

por RTP
Kevin Lamarque - Reuters

As relações entre o Ocidente, com Washington à cabeça, e a Rússia deterioraram-se drasticamente nos últimos dias. A mais recente acusação foi lançada por Boris Johnson, ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, que confessou que “gostaria de ver” manifestações à porta da embaixada russa em Londres. A diplomacia de Moscovo caracterizou as palavras do governante britânico como “vergonhosas”.

Boris Johnson voltou a acusar a Rússia de ter cometido crimes de guerra na Síria, responsabilizando-a pelo ataque aéreo à coluna de camiões de ajuda humanitária que transportava alimentos, roupa e medicamentos em Alepo, no final de setembro.

Declarações que deixaram as autoridades russas furiosas; nas redes sociais publicaram uma série de frases provocadoras, questionando os resultados das intervenções do Ocidente na Líbia, na Síria e no Iémen.

A porta-voz do Ministério russo dos Negócios Estrangeiros Maria Zakharova salientou que agora entendia por que razão o ministro britânico havia pedido à opinião pública ocidental para isolar internacionalmente a Rússia.

“As declarações que ele fez sobre os protestos em frente à embaixada da Rússia são uma vergonha (…) São vergonhosas pela simples razão de que agora ficou claro quem tem estado por trás das chamadas organizações e movimentos sociais e representativos da sociedade civil que têm vindo às embaixadas russas em diferentes ocasiões”.
Novo encontro no sábado
Após vários dias de acusações, Moscovo anunciou, ainda assim, uma reunião internacional sobre a Síria, agendada para sábado na Suíça, entre o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, e o homólogo russo, Serguei Lavrov.

O comunicado foi divulgado pelo ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, que designou como objetivo da reunião “criar condições para a resolução da crise síria”.

O último encontro entre Lavrov e Kerry sobre a situação na Síria realizou-se a 9 de setembro, em Genebra, e durou 14 horas. A reunião culminou com a assinatura de um plano de ação conjunto para a Síria.

Os acordos contemplavam um cessar-fogo, a partir do dia 12 de setembro, o estabelecimento de acesso humanitário a Alepo, a separação entre os militantes terroristas e a oposição síria, a coordenação das operações militares entre a Rússia e EUA e ainda um combate coordenado ao terrorismo.

Contudo, nas últimas semanas, os dois países trocaram acusações sobre violação dos termos dos acordos e, no dia 19 de setembro, o exército sírio abandonou a trégua, alegando múltiplas violações por parte de grupos armados da oposição.
"Água lamacenta de Londres"
Citado pela CNN, também Igor Konashenkov, major-general russo que integra o Ministério dos Negócios Estrangeiros, quis ser irónico ao falar sobre o pedido de Boris Jonhson, designando-o como “uma tempestade numa chávena de chá, cheia da água lamacenta de Londres”.

Os Estados Unidos já tinham congelado as negociações com a Rússia para um acordo de paz na Síria, devido à constante negação, por parte de Moscovo, da participação das suas tropas nos ataques aéreos ao lado do exército do regime de Bashar al-Assad. Na terça-feira foi a vez da França.

Na próxima semana estava prevista uma visita do Chefe de Estado russo a Paris, por ocasião da inauguração de uma catedral ortodoxa, mas o Presidente François Hollande recusou-se a receber Vladimir Putin enquanto este não retomar as negociações sobre a Síria.

“Fiz saber ao senhor Putin que, se ele viesse a Paris, não o acompanharia a qualquer cerimónia, mas estaria pronto para retomar o diálogo sobre a Síria. Ele decidiu adiar a visita”, revelou Hollande, num claro sinal de desconforto provocado pelo veto russo no Conselho de Segurança da ONU, a uma proposta francesa e espanhola para travar os bombardeamentos em Alepo.

Já o Kremlin justificou o adiamento da viagem por terem sido cancelados os eventos em que o Presidente iria participar.
"Confiança mútua esgotada"
"É uma falácia pensar que isto é como a Guerra Fria. Os dias de hoje são diferentes e mais perigosos" - declarações feitas no sábado pelo ministro alemão dos Negócios Estrangeiros.

Frank-Walter Steinmeier explicou que, no conflito entre Rússia e Estados Unidos, “parece que o remanescente da confiança mútua foi esgotado. Se isto continuar, iremos voltar aos tempos do confronto das duas superpotências".

Já o ministro russo dos Negócios Estrangeiros disse que "estamos a testemunhar uma mudança fundamental de circunstâncias no que diz respeito à agressiva russofobia que agora reside no centro da política dos Estados Unidos em relação à Rússia".

Serguei Lavrov acrescentou que “não é apenas uma russofobia retórica, mas medidas agressivas que realmente prejudicam os nossos interesses nacionais e representam uma ameaça à nossa segurança”.

O líder da diplomacia de Moscovo queixou-se também do facto de a NATO estar a instalar infraestruturas militares junto das fronteiras russas e atacou o Ocidente pelas sanções por causa da Ucrânia.
Um jogo perigoso
O ministro com a pasta dos Negócios Estrangeiros disse ainda ter ouvido que alguns políticos nos Estados Unidos estavam a sugerir que Barack Obama poderia aprovar o bombardeamento de bases aéreas militares do Governo sírio para alojar aviões norte-americanos.

"Este é um jogo muito perigoso tendo em conta que a Rússia, estando na Síria a convite do governo legítimo do país e tendo duas bases lá, ter sistemas de defesa aérea para proteger os seus ativos", concluiu Serguei Lavrov, esperando que Obama não aceite esta hipótese.

O atrito entre Moscovo e Washington já levou também Mikhail Gorbachev, o último líder da União Soviética, a fazer um apelo ao diálogo. "Acho que o mundo chegou a um ponto perigoso (…) É necessário parar. Precisamos renovar o diálogo", advertiu Gorbachev.

A Rússia lançou uma operação aérea contra as posições terroristas na Síria a 30 de setembro de 2015, a pedido do Presidente Bashar al-Assad. Desde essa altura e até março de 2016 a aviação russa realizou mais de nove mil missões contra grupos terroristas, apoiando Damasco em ofensivas em regiões-chave do país.
Risco de conflito global
De acordo com a imprensa russa, as autoridades do país estarão mesmo a preparar abrigos antinucleares em Moscovo. A notícia foi divulgada pela principal estação de televisão da Rússia, referindo que a "terceira guerra mundial já começou" por causa do conflito na Síria.

Já a agência France Presse refere que o apresentador do Rússia 24 - o principal canal de televisão de notícias do país - afirmou que as baterias antiaéreas russas na Síria vão "abater" aviões de guerra norte-americanos.

Por outro lado, em São Petersburgo, o jornal Fontanka, através da internet, indica que o Governo russo se prepara para racionar o pão "por causa de uma futura guerra", apesar de as autoridades afirmarem que pretendem apenas proceder à regulação do preço da farinha.

c/ agências
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