Rutura UE / EUA: "São só más notícias para Portugal"

por Rui Sá, João Fernando Ramos

A Europa multa a Apple em 13 mil milhões de euros mais juros. A América prepara um processo contra a Volksvagem de 73,5 mil milhões de euros.
No meio de uma guerra comercial entre os dois grandes blocos, França e Alemanha anunciam a morte do Acordo e Livre Comércio entre a Europa e os Estados Unidos.
No Jornal 2 Tiago Moreira de Sá afirma que "são só más notícias para Portugal". O analista do Instituto de Política e Relações Internacionais recorda que uma Europa de costas voltadas para o Atlântico agrava o estatuto periférico do nosso país e recentra a Europa a leste.

O Presidente francês, François Hollande, diz não ao acordo de livre comércio entre a Europa e os Estados Unidos.

Depois dos Alemães são os franceses a condenar um entendimento comercial.

A assinatura do tratado esteve anunciada para o final deste ano. Depois de várias rondas negociais sabe-se apenas que em cima da mesa estavam propostas americanas e europeias sem qualquer ponto de contacto.

Os dossiers em discussão são secretos. Sabe-se apenas que a Comissão Europeia diz recusar liminarmente qualquer ataque aos sistemas de proteção ambiental, standards de saúde, o respeito pelos dados dos seus cidadãos ou os padrões de proteção social.

O secretismo em torno dos dossiers tem sido fortemente contestado nas ruas por diversas organizações europeias que temem pela introdução de colheitas geneticamente modificadas na Europa, ou o aligeiramento das restritivas norma europeias de higiene e segurança, ou licenciamento ambiental.

A França quer começar tudo de novo. A Alemanha diz que provavelmente não haverá interesse do lado americano, que acusa de estar a boicotar as negociações ao querer impor à Europa normas menos respeitadoras do meio ambiente e dos direitos dos consumidores do que as já em vigor.

Tiago Moreira de Sá acredita que o extremar de posições não pode ser entendido fora do quadro das eleições presidenciais este ano nos Estados Unidos, e das alemãs e francesas de 2017 para a chancelaria e para o Eliseu, respetivamente.

"Do lado americano há uma tendência neo isolacionista que não é boa para a Europa como um todo, e do lado de cá há uma crescente germanização da União Europeia". Qualquer dos quadros não beneficia o nosso país que historicamente vive voltado ao Atlântico.

O investigador e analista do Instituto de Política e Relações Internacionais lembra que a Organização Mundial do Comércio está bloqueada por ação da China e da Rússia, e que o modelo de desenvolvimento ocidental fica fragilizado em caso de rutura definitiva de um acordo entre a União Europeia e os Estados Unidos da América.

"Há um recentramento da riqueza e do desenvolvimento na região da Ásia / Pacifico que não trás qualquer benefício ao todo da Europa", vinca Tiago Moreira de Sá que fala num caso que pode vir a determinar um novo cenário global geoestratégico.

Mas não é apenas a quebra das negociações do acordo de livre comércio que é um sinal de um progressivo afastamento dos ainda dois maiores blocos económicos da atualidade. A batalha comercial entre a Europa e os Estados Unidos tem outras frentes.

A comissão europeia condenou a Apple num caso de benefícios fiscais atribuídos pelo governo irlandês. A pena equivale à totalidade dos lucros globais da companhia o ano passado. 13 mil milhões de euros. Bruxelas lembra ainda que a empresa americana terá que pagar juros do dinheiro que reteve ao longo dos últimos 20 anos.

O valor equivale ao orçamento anual do sistema de saúde irlandês, mas quem já afirmou publicamente vai contestar a decisão, defendendo que nada há a pagar, é curiosamente... Quem deveria receber: o governo irlandês.

Empresas como a Apple estabeleceram as sedes europeias naquele país. Criaram dezenas de milhar de empregos. Fizeram acontecer o milagre irlandês. A devolução dos benefícios de um alegado tratamento fiscal diferenciado pode afastar estes grandes investidores.

Situação similar à da Apple terão tido também grandes multinacionais norte americanas do setor das novas tecnologias como a Googel, a Facebook ou a LinkedIn.

Os processos prometem continuar. No Luxamburgo há processos idênticos contra a McDonald's e a Amazon. A Starbucks já foi condenada na Holanda.

A Comissão Europeia fala num sinal de tolerância zero perante ao tratamento fiscal mais favorável de algumas empresas em detrimento de todas as outras.

A Casa Branca já reagiu afirmando que não vê com bons olhos uma decisão não negociada sobre sanções fiscais.

Entretanto o Departamento de Justiça norte americano avança com um processo judicial contra a Volkswagen.

O construtor europeu é acusado de ter manipulado as emissões poluentes de diversos modelos da marca a venda naquele país. Entre multas e pedidos de indemnização a conta ascende a 73,5 mil milhões de euros.
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