O Rei vai nu

Entenda-se que não falo de Filipe VI. A monarquia espanhola já enfrentou ventos mais fortes e, desta vez, o monarca, nas primeiras eleições gerais do reinado, teve a paciência de um santo perante a recusa de Mariano Rajoy a um convite real, assim como nas vinte e oito (28) audiências, onde ouviu o que já conhecia de cor, de 14 formações políticas.

O que está a nu é a política espanhola, as verdadeiras intenções e o tacticismo de quem, por um lado, sobreviveu à custa de um sistema bipartidário, anos a fio, e de quem deseja entrar na rotação, quiçá, para reinventar uma alternância nova na democracia de Espanha.

O jogo do empurra durou mais de 40 dias. Ninguém nos garante que já terminou. De momento, a bola está do lado de Pedro Sanchéz, mas atenção! - dizem da Calle Génova onde está sediado o PP. Atenção, porque Rajoy continua em campo.

“Es como el perro del hortelano, que ni come ni deja comer"
, ironizou o braço direito de Pedro Sanchez, César Luena, quando o Presidente em funções recusou avançar para a investidura, na primeira reunião na Zarzuela. Não avançou e não recuou. Enquanto isso, na calle Ferraz, a casa dos socialistas, Sanchez segurava o partido e assegurava que Rajoy teria de recusar, contrariar a vontade do Rei uma segunda vez, antes dos socialistas avançarem para negociações.

Empurraram uma situação ingovernável e insustentável quanto tempo conseguiram… de um lado para o outro. Entretanto, os emergentes Podemos e Ciudadanos, com singelos apelos ao bem comum e ao entendimento, lançavam propostas espartilhadas por “ses”, vetos e linhas vermelhas.

Pablo Iglesias ofereceu-se como vice primeiro-ministro de um executivo a meias com os socialistas. “Sanchez nunca poderá esquecer o sorriso (entenda-se o Podemos) que lhe deu a oportunidade de Governar Espanha”, disse Iglesias, numa conferência de imprensa onde encostou o secretário-geral do PSOE à parede, impondo condições, exigências e um reconhecimento para toda a vida.

Pedro Sanchez acusou-o de arrogância… Iglesias voltou à carga, disse que dificilmente o Podemos poderia ser mais generoso por estar disposto a fazer de Sanchez Presidente.

Ora, ainda o líder socialista não tinha recebido o repto do Rei, já estava assinada a declaração de guerra com Pablo Iglesias.

Albert Rivera, presidente do Ciudadanos, assegura que não vai viabilizar um Governo PSOE/Podemos e recusa, determinantemente, integrar um executivo com a formação de Iglesias. “Somos incompatíveis”, diz… e assim diz tudo.

O PP, que acusa Sanchez de nunca se ter sentado à mesa com Rajoy, frisa que não vai viabilizar, votar a favor ou abster-se, qualquer formação governativa que não seja liderada pelo PP e por Rajoy.

Façam as contas, cruzem números, não há aritmética possível que permita uma solução estável para o Governo de Espanha, entre mensagens e apelos ao bem comum em detrimento dos interesses partidários e, acima de tudo, pessoais.

Ou as promessas e afirmações irrevogáveis deixam de o ser… ou daqui a três meses, Espanha volta a ter eleições, com todos os custos inerentes, em que os financeiros (da campanha) serão os mais irrelevantes.

O rei vai nu, neste caso, ao contrário do conto de Hans Christian Andersen, não é necessário que os políticos sejam desmascarados por uma criança e a população não vai ter razões para rir.

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