Hicham ensinou-me todos os palavrões que conhecia em árabe (nunca mais me esqueci como se diz "filhos da p..."). Também em hebraico. Na volta da moeda, referi-lhe o puro e duro vernáculo português. Vivemos sempre dias tensos deambulando por Jerusalém, Ramallah, Hebron, Belém, Gaza. E riamos sempre cada vez que ele, um motorista de táxi convertido em nosso improvisado guia, arengava contra a polícia, fosse ela israelita ou palestiniana, metendo entre o árabe e o hebraico um fo... ca...
Hicham é um palestiniano originário de Jerusalém oriental com quem trabalhei muitas vezes quando em reportagem em Israel, Gaza e Cisjordânia. Passámos juntos muitas aventuras.
Tinha feito a sua peregrinação a Meca, jejuava durante o Ramadão, procurava, sempre que podia, manter o ritmo das orações diárias. É um bom muçulmano. E um bom amigo.
Também Habib, com quem me cruzei em Peshawar, homem refinado e conhecedor de todos os recantos da cidade, até mesmo do mercado negro, onde nos comprava o interdito vinho francês que mudou as nossas refeições após dias e dias a água. Habib adorava o Ocidente, a sua cultura e modo de vida. Era muçulmano e ensinou-me alguns rudimentos de um Islão tolerante. Demos um grande abraço na despedida.
Rafique não falhava a mesquita às sextas. Ao domingo também não descurava um bom cozido à portuguesa com a presença rigorosa dos enchidos. Ah! Também havia vinho tinto português. Por respeito a Deus guardava a garrafa debaixo da mesa. Dizia-me que Deus não se ia preocupar com aqueles seus pecados. Rafique era um bom exemplo desse Islão swahili e risonho que marca a costa africana do Índico. Encontrei-o há dias em Lisboa. Mais velho mas com a mesma disposição para os pequenos pecados do mundo.