Indícios de luvas em negócio de submarinos da Armada

por RTP
Na Grande Entrevista da RTP, Paulo Portas admitiu que, na actual conjuntura, não concretizaria o negócio dos submarinos Mário Cruz, Lusa

As autoridades da Alemanha estão a investigar indícios de corrupção no negócio entre o Estado português e um consórcio germânico para a compra de dois submarinos. A edição on-line da revista alemã Der Spiegel revelou que o cônsul honorário de Portugal em Munique terá recebido 1,6 milhões de euros para ajudar a efectivar o negócio. Na reacção à notícia, o Governo decidiu suspender o diplomata de "todas as funções".

Jürgen Adolff, o cônsul honorário de Portugal em Munique, sobre quem recaem as suspeitas de corrupção, está suspenso de "todas as funções relacionadas com o exercício do cargo". A decisão é confirmada numa nota da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, citada pela agência Lusa: "Em resultado de informação proveniente das autoridades alemãs sobre a acção judicial em curso naquele país, o Governo suspendeu de todas as funções relacionadas com o exercício do cargo o cônsul honorário de Portugal em Munique, Alemanha, o senhor Jürgen Adolff, a partir de hoje".

A suspensão, prossegue a nota difundida esta quarta-feira pelo gabinete do secretário de Estado António Braga, mantém-se em vigor "até cabal esclarecimento das investigações que o envolvem pessoalmente".

O contrato para a aquisição de dois submarinos U-214 foi celebrado em 2004 com o German Submarine Consortium, que inclui a Man Ferrostaal, a Thyssen-Nordseewerke e a Howaldtswerke-Deutsche Werft HDW, esta última responsável pela construção dos navios. Paulo Portas assumia, então, a pasta da Defesa no Governo de coligação de Durão Barroso. Segundo a publicação Der Spiegel, os autos de investigação elaborados pelos investigadores alemães colocam Jürgen Adolff e a Man Ferrostaal no centro de um caso de corrupção que "é maior do que se pensava". O cônsul honorário terá recebido 1,6 milhões de euros em luvas para ajudar à concretização do negócio com o Executivo português.

"Dissimular canais de pagamento"

A edição on-line da revista Der Spiegel avançava na terça-feira que o cônsul honorário de Portugal teria promovido, no Verão de 2002, um encontro entre a administração da Man Ferrostaal e Durão Barroso.

Os investigadores de Munique conduziram há uma semana um conjunto de buscas em instalações da empresa, tendo detectado mais de 12 contratos de consultoria de contornos suspeitos, que teriam por finalidade "dissimular os canais de pagamento" para que "subornos pudessem ser enviados a responsáveis do Governo, dos ministérios e da Marinha".

A partir de Bruxelas, uma porta-voz do presidente da Comissão Europeia veio já declarar que Durão Barroso "não teve qualquer intervenção directa ou pessoal" no negócio da aquisição dos submarinos, para lá da participação na decisão adoptada em Conselho de Ministros. O antigo primeiro-ministro admite que "conheceu o cônsul honorário de Portugal em Munique, como aliás esteve em contacto com muitos outros representantes do Estado português no estrangeiro", mas salienta que "não foi, no entanto, nunca por ele abordado sobre este processo".

Ferrostaal alega que não é alvo de suspeitas

Por ora, a Man Ferrostaal, empresa detida por um fundo de Abu Dhabi (70 por cento) e pela construtora automóvel Volkswagen (30 por cento), evita alargar-se em comentários, apoiando-se no facto de a investigação estar ainda em marcha. A Ferrostaal afiança, em nota citada pela Lusa, que não é alvo de suspeitas na "investigação criminal" a "determinados indivíduos" envolvidos em "projectos específicos": "O alvo da suspeita não é a empresa. A empresa foi informada de que se trata de acusações de suborno em alguns projectos específicos".

"No âmbito de um processo de investigação criminal em relação a determinados indivíduos", afirma a empresa, o Ministério Público de Munique "emitiu um mandado de busca e apreensão nas instalações da Ferrostaal AG em Essen e Geisenheim".

"A Ferrostaal irá colaborar estreitamente com o Ministério Público para acelerar o apuramento dos factos. Até isso se verificar, a empresa não prestará qualquer declaração sobre o assunto", conclui o comunicado.

Cônsul desconhece notícia
O cônsul honorário em Munique garantiu, entretanto, que desconhece as acusações que lhe são movidas no processo de aquisição dos dois submarinos, assim como a suspensão de funções. "Não sei de nada, nem faço ideia do que me está a falar", disse Jürgen Adolff, ouvido pela Lusa.

O diplomata afirmou também que não leu qualquer notícia nas imprensas alemã ou portuguesa que o referisse. "Seria simpático se me tivessem informado de que estou suspenso", acrescentou Adolff, que desempenhava as funções de cônsul honorário de Portugal na capital da Baviera há 15 anos.

Por seu turno, o Ministério Público de Munique já confirmou a realização de buscas na Ferrostaal. À agência Lusa, a porta-voz Barbara Stockinger adiantou que as buscas tiveram lugar há uma semana na sede da empresa em Essen, no Estado da Renânia, e em 16 filiais e outras instalações no resto do país.

Ministro da Defesa promete "defender os interesses" do país

Em declarações à Antena 1, o actual ministro da Defesa afirmou que "o Governo português defenderá intransigentemente os interesses do Estado nos contratos para os submarinos". "Eu digo no plural porque há um contrato de aquisição e um contrato de contrapartidas", sublinhou Augusto Santos Silva.

Na semana passada, durante a Grande Entrevista da RTP, Paulo Portas falou sobre o dossier dos submarinos. O presidente do CDS-PP admitiu que, na actual conjuntura económica, não concretizaria o negócio com o consórcio germânico.

"Se me perguntassem se eu tomaria a mesma decisão hoje, com um endividamento público que chega a 100 por cento do produto, com certeza que a adiava e que a protelava", disse então o antigo ministro da Defesa.

pub