Passos à defesa atira devolução de sobretaxa para o fim do ano

por Carlos Santos Neves - RTP
“A 31 de dezembro saberemos exatamente quanto é que o Estado recebeu para além do que estava previsto em matéria de IVA e de IRS”, afirmou o primeiro-ministro Carlos Barroso - Lusa

A sobretaxa de IRS e o chamado crédito fiscal tornaram-se esta semana o principal combustível de pré-campanha, depois de a UTAO ter advertido para um potencial rombo orçamental com a quebra nas receitas de impostos. Para o primeiro-ministro, porém, “a questão não tem polémica nenhuma”. Debaixo de críticas, Pedro Passos Coelho renovou ontem a promessa: o Estado devolverá “o que tiver recebido a mais”; contas, só em dezembro.

A bandeira amarela da Unidade Técnica de Apoio Orçamental foi hasteada no início da semana. Ao publicarem uma nota sobre a síntese da execução orçamental do primeiro semestre, os técnicos que prestam apoio ao Parlamento advertiram para a possibilidade de o Orçamento do Estado chegar ao termo de 2015 com um desvio de 660 milhões de euros em impostos.
O Governo, insistiu Passos, só vai saber “com rigor o que é que será possível retribuir aos contribuintes quando o ano fechar e não antes”.

Porque “a taxa de crescimento verificada na receita fiscal até ao final do primeiro semestre permanece aquém da prevista para o conjunto do ano”, nas palavras da UTAO. Contas feitas, o crescimento da receita fiscal não terá ido além dos 3,5 por cento até junho. Se a tendência se mantiver, cairá por terra a estimativa do Governo: um aumento da receita em 4,3 por cento.

Em julho, o Executivo acenava com a devolução, no próximo ano, de 100 milhões de euros em “crédito fiscal” resultante da sobretaxa de IRS. Isto se a receita crescesse 4,2 por cento no conjunto do ano. Percentagem que, em nota remetida à agência Lusa, a Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais afiançou ter sido alcançada na primeira metade de 2015 com o IRS e o IVA.

Passos Coelho não vê “polémica nenhuma” nas colunas do deve e do haver. Será no cair do pano sobre o ano corrente, segundo o primeiro-ministro, que os contribuintes vão saber de números.

“A 31 de dezembro saberemos exatamente quanto é que o Estado recebeu para além do que estava previsto em matéria de IVA e de IRS e o que tiver recebido a mais devolve aos contribuintes”, afiançou na terça-feira o primeiro-ministro, à margem da inauguração do Festival Nacional do Vinho e da Feira da Pêra Rocha, no Bombarral.
Uma pergunta a Albuquerque

Passos quis mesmo reassumir “o compromisso de ir permitindo aos contribuintes, ao longo do resto do ano, ir medindo como é que está a receita de IVA e de IRS, de modo a que eles possam ir sabendo qual é o crédito fiscal que irão receber”.

E as metas “previstas em termos quer de IRS quer de IVA”, arriscou o primeiro-ministro, “serão superadas”. No espírito do governante, não existe “nenhuma razão” para pessimismo. A oposição pensa o contrário.

Tiago Contreiras, Paulo Nunes - RTP

Numa pergunta com a ministra das Finanças por destinatária, o PS exigia ontem conhecer as estimativas que servem de base à ideia de uma devolução de parte da sobretaxa em 2016. Designadamente, “que montante de receita relevante e de retenção na fonte em sede de sobretaxa” calcula o gabinete de Maria Luís Albuquerque para consubstanciar tal promessa.

“Qual o montante de receita de IVA e de IRS que o Governo estima para o segundo semestre de 2015 e qual a justificação para uma evolução tão positiva do comportamento da receita, face ao primeiro semestre de 2015”, enunciou o deputado João Galamba.

Para os socialistas, “poderá estar em causa não só a devolução da sobretaxa em 2016, como o próprio cumprimento da meta do défice para 2015”.
“Não se concretizará”
A desconfiança é transversal aos partidos à esquerda do PS. Logo após a divulgação da nota da UTAO, Jorge Cordeiro, do Secretariado e da Comissão Política do PCP, dava por adquirido, em declarações à Lusa, que “a prometida e propagandeada devolução de parte do IRS divulgada com fins eleitorais não se concretizará”.

A única “justiça devida” aos contribuintes seria, no entender do partido de Jerónimo de Sousa, uma “devolução integral da sobretaxa”, ainda assim apenas “um primeiro elemento” da devolução de tudo o que foi “ilegitimamente retirado dos bolsos dos trabalhadores e reformados”.

Lígia Veríssimo, Carlos Matias, Nuno Sabino, Miguel Teixeira - RTP

Também o Bloco de Esquerda foi rápido na tentativa de desmontar o que considerou ser “a propaganda” da coligação.

“É a própria UTAO que desmente, com os dados públicos da execução orçamental, toda a campanha de propaganda do Governo no que toca à devolução da sobretaxa de IRS”, reagia na segunda-feira o deputado Pedro Filipe Soares, igualmente ouvido pela Lusa.

O Governo decidiu conservar este ano a aplicação de uma sobretaxa de 3,5 por cento em sede de IRS a rendimentos superiores ao salário mínimo. Introduziu, todavia, o conceito de “um crédito fiscal que permitirá desagravar, parcial ou totalmente, a coleta da sobretaxa referente ao ano de 2015”.

“Tudo isso é uma miragem criada por propaganda eleitoral que nada tem que ver com execução orçamental e a previsibilidade da evolução dos impostos até final deste ano”, insistiu Pedro Filipe Soares.
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