Nanques, a voz eterna

 

António Nanques conseguiu entrar no grupo restrito das vozes eternas. Não pela via do canto mas do relato desportivo.

Não tanto pela potência vocálica mas, sobretudo, pelo timbre e dicção, Nanques cedo pressentiu a predestinação para a radiofonia. Entrou para a ribalta quando o desporto, principalmente o futebol, juntamente com o fado, eram factores de aglutinação do orgulho nacional. Tempo em que os televisores eram mobília rara ou até inexistente na grande maioria do arquipélago. As emoções dos espectáculos desportivos contagiavam os adeptos apenas pelas imagens sonoras debitadas pelos repórteres para os microfones da rádio. O franzino António refinou a propensão natural para a narração desportiva através da predisposição para a aprendizagem e consolidação gradual dos recursos linguísticos. Apesar da sua preferência clubística ser assumida e conhecida, marcou sempre as suas reportagens pela imparcialidade e idoneidade jornalística. Atestam-no os gritos longitroantes dos golos alimentados pelo mesmo fôlego  e as descrições correctas de jogadas tácticas e técnicas.

Foi sempre mais ligado ao futebol e hóquei em patins, modalidades onde realizou trabalhos de grande rigor técnico. Embeleza os seus directos com chavões que lhe são muito próprios e empresta-lhes um discurso fluente e sem descontinuidades. No relato, sua verdadeira especialidade, tem um notável sentido de orientação e elucida perfeitamente o ouvinte sobre o tipo de jogada e zona do campo onde se processa. Como pessoa é afável, dialogante, compreensivo, pacífico e amigo. Sempre disponível para orientar um debutante. Fico-lhe eternamente grato por isso.

António Nanques definiu o ponto crepuscular de uma carreira de mais de quatro décadas, quando ainda mantém intactas todas as suas faculdades. Os amigos lamentam a sua retirada e os radiófilos, que acompanham com regularidade as tardes desportivas dominicais, perdem uma voz de referência e em muitos casos um ídolo. Passa a jubilado um dos melhores relatores de sempre da rádio açoriana.

 

José Eliseu