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A polémica em torno de "Hora Negra"
CIA, Senado e até atores mostram mal estar com as cenas de tortura em "00:30 A Hora Negra". A realizadora Katryn Bigelow veio esclarecer o assunto dizendo que não pode branquear a história.
O novo filme de Katryn Bigelow, que chega agora às salas de cinema
portuguesas, uma semana após a estreia alargada nos Estados Unidos,
iniciou a temporada de prémios de forma fulgurante mas parece ter
perdido esse favoritismo quando a Academia de Cinema de Hollywood o
nomeou em cinco categorias.
Causou estanheza o facto de Bigelow ter sido ignorada na categoria de realização, sobretudo tendo em conta que se trata da primeira mulher premiada com um Oscar pelo filme "Estado de Guerra", sobre as brigadas de minas que operam no Iraque.
A realizadora aborda os meandros da complexa investigação conduzia pela CIA (Central Intelligence Agency) para localizar e executar Osama Bin Laden, o líder da al-Qaeda.
Bigelow poderá estar a ser prejudicada por uma controvérsia que se arrasta desde dezembro quando três senadores - Dianne Feinstein,
Carl Levin e John McCain, candidato republicano à presidência em 2008 -
enviaram à Sony, estúdio produtor do filme, uma carta denunciando que a
produção é "grosseiramente irreal e ilusória ao sugerir que o resultado
de tortura
levou à localização de Bin Laden".
Os congressistas mostravam o desapontamento com a forma como a CIA é tratada, nomeadamente devido ao envolvimento de oficiais em situações de tortura de prisioneiros responsáveis por informações vitais na localização de Bin Laden. Em causa está o recurso técnicas duras e violentas de interrogatório, como o afogamento simulado, método habitualmente considerado como tortura.
O filme também provocou reações iradas de alguns atores que assumiram o boicote deliberado da obra. Ed Asner, Martin Sheen e David Clennon enviaram uma carta com o objetivo de influenciar os membros da Academia antes da votação que definirá os vencedores dos Oscars. A mensagem é clara: "Esperamos que '00:30 A Hora Negra' não seja honrado pelos membros da Academia".
Bigelow: "não podemos ignorar a tortura"Na sequência desses protestos, o argumentista Mark Boal (nomeado para o Oscar de melhor argumento adaptado) sentiu necessidade de esclarecer que o filme não é "um documentário". Mas esta semana a realizadora foi mais longe na defesa da sua obra, dizendo que no filme encena a tortura e que não aprova essas práticas. Num artigo publicado terça-feira no jornal LA Times, Kathryn Bigelow esclarece que defende o direito de todos os norte-americanos "criarem obras de arte e de falarem com consciência sem interferência governamental ou perseguição".
E questiona até que ponto é que as críticas que o filme despertou sobre a tortura não deveriam ser dirigidas a quem autorizou esses procedimentos durante a investigação do paradeiro do líder da al-Qaeda.
No artigo assume que a "tortura foi, como sabemos, empregue nos primeiros anos da caçada. Isso não significa que tenha sido a chave para encontrar Bin Laden. Significa que é uma parte da história que não podemos ignorar".
A obra é defendida por alguma imprensa que sustenta a veracidade dos factos e de alguns procedimentos. É o caso da Foreign Policy, onde Laura Pitter, conselheira de contraterrorismo da ONG norte-americana Human Rigts Wacth, assina um artigo a sustentar que o filme é "amigo" da CIA.A autora cita o testemunho de cinco líbios detidos pela CIA, entre 2000 e 2005, que relatam diversos factos do período de oito a dois anos em que estiveram sob custódia, nos Estados Unidos. Eles alegam que foram acorrentados nus a paredes em celas apertadas e escuras ao longo de várias semanas, espancados e colocados em posições dolorosas durante vários dias, privados de alimentos, privados do contacto com familiares, e expostos a música em volume elevado para que não pudessem dormir. Um dos presos terá passado por 183 sessões deste tipo.
CIA e Senado reagemOs factos que o filme revela geram estas reações por parte de responsáveis políticos e dos serviçoes de inteligência porque esta é uma matéria profundamente sensível desde que foram denunciados, em 2004, os abusos cometidos por soldados americanos contra prisioneiros iraquianos, na prisão de Abu Ghraib, no Iraque,
O director interino da CIA, Michael Morell, afirmou que o filme "00:30 A Hora Negra" exagera ao retratar que a informação foi obtida através de duros interrogatórios.
"Não foi assim", afirma Morell na mensagem enviada a todos os funcionários da CIA. "O filme cria uma forte impressão de que as técnicas utilizadas no interrogatório e na detenção foram a chave para encontrar Bin Laden. Essa impressão é falsa", escreve Morell.
O Senado dos Estados Unidos lançou um inquérito aos contactos estabelecidos entre a CIA e os responsáveis pelo filme "00:30 A Hora Negra". Segundo notícia do The Hollywood Reporter, os senadores querem perceber se a CIA deu acesso a informações classificadas sobre "interrogatórios avançados" – considerados tortura – à realizadora Kathryn Bigelow e ao argumentista Mark Boal.-
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