Ben Foster no papel de Lance Armstrong — na fronteira entre verdade e mentira


joao lopes
30 Jul 2016 20:02

É muito provável que a maior parte do espectadores tenha uma imagem de Lance Armstrong — o ciclista americano a quem foram retiradas sete vitórias no "Tour de France", depois de se provar que recorrera a doping — gerada pela sua confissão, em 2013, num programa de Oprah Winfrey.

Nesse contexto, Armstrong finalmente reconheceu que as acusações acumuladas ao longo dos anos tinham fundamento, tendo sido o protagonista de um sofisticado programa de falsificação da verdade desportiva (isto sem esquecer, claro, o documentário, também de 2013, que Alex Gibney lhe dedicou, com o título "A Mentira de Armstrong").

O filme de Stephen Frears sobre Armstrong intitula-se, precisamente, "The Program", tendo sido lançado entre nós como "Vencer a Qualquer Preço". Trata-se, por isso, antes de tudo o mais, de expor os mecanismos de um monumental esquema de doping que, para além da utilização de substâncias interditas, envolvia a sistemática manipulação de análises de sangue e urina.
Fiel às componentes realistas do seu trabalho, Frears faz um filme em que se trata menos de abordar a personagem de Armstrong como "símbolo" da perversão dos ideais desportivos e mais como protagonista de um processo mental e anímico em que o desejo de vencer comanda tudo. É isso que, em última instância, lhe confere uma intensidade genuinamente trágica que o filme expõe na sua cruel nudez factual.
"The Program" é, assim, um objecto francamente invulgar, sobretudo num tempo em que o imaginário cinematográfico está parasitado pelo simplismo simbólico de muitos filmes de super-heróis. Isto sem esquecer que a interpretação de Armstrong por Ben Foster acentua, de forma decisiva, as contradições de um homem que, a certa altura, quis rasurar a fronteira entre verdade e mentira — em resumo, uma pequena pérola que merece não ser ignorada na agitação da temporada de Verão.

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