Annette Bening no espelho da memória — quem se lembra de Gloria Grahame?...


joao lopes
9 Fev 2018 23:39

Eis uma não-notícia… Annette Bening vai voltar a não ganhar um Oscar. Aliás, desta vez nem sequer se trata de discutir probabilidades, uma vez que o seu nome não consta da lista de nomeações (já tem quatro, a última das quais em 2011, com "Os Miúdos Estão Bem"). Dito de outro modo: apesar da sua magnífica composição da figura de Gloria Grahame (1923-1981), por certo uma das mais requintadas de 2017, a actriz continua a ser "esquecida"…

Dir-se-ia que "As Estrelas Não Morrem em Liverpool", o filme dirigido pelo escocês Paul McGuigan, está, de alguma maneira, a ser "castigado" pela singularidade do seu tema. De facto, nomes como o de Grahame são uma referência indecifrável para a maior parte dos espectadores mais jovens, mesmo se ela foi uma das imagens emblemáticas de Hollywood da década de 50, tendo, aliás, vencido um Oscar de melhor actriz secundária pela sua composição em "Cativos do Mal" (1952), obra-prima de Vincente Minnelli.
O título remete para a ligação de Grahame com um jovem actor de Liverpool, Peter Turner, interpretado com assinalável subtileza por Jamie Bell (finalmente liberto da imagem de eterno adolescente enraizada no sucesso de "Billy Elliot", lançado no ano 2000) — o filme baseia-se, aliás, no livro de memórias de Turner. Dir-se-ia que assistimos a um teatro íntimo em que Grahame se confronta com uma amarga evidência: a de depender das memórias gloriosas de Hollywood, ao mesmo tempo tentando interiorizar a certeza da sua impossível repetição.
McGuigan consegue, assim, um objecto de suave filiação clássica, apoiado no trabalho dos actores e nas convulsões de uma história de amarga lucidez. "As Estrelas Não Morrem em Liverpool" é, afinal, um filme genuinamente cinéfilo, realmente ligado a um conceito amoroso do cinema — está tão fora de moda que "ninguém" reparou em Annette Bening.

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