joao lopes
30 Out 2016 1:17

Pelo menos desde que Cristian Mungiu arrebatou a Palma de Ouro de Cannes, em 2007, com "4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias", sabemos que existe um cinema romeno em que a exigência realista vai a par de uma sensibilidade muito apurada para as contradições de uma sociedade ainda marcada pelas heranças traumáticas do comunismo. Nesse contexto, Corneliu Porumboiu é também um nome fundamental.

Com a estreia de "Tesouro", lançado também em Cannes, em 2015, na secção "Un Certain Regard", reencontramos o humor do peculiar universo de Porumboiu, num tom que faz lembrar o clima quase burlesco de "12:08, A Este de Bucareste" (2008), retrato desconcertante e implacável de uma estação regional de televisão.
Neste caso, é mesmo de um tesouro (real ou imaginado…) que se trata. A saber: um homem mobiliza o seu vizinho para a tentativa de encontrar as riquezas que estarão enterradas no jardim de uma propriedade rural da sua família — a pouco e pouco, os protagonistas vão-se revelando figuras anedóticas de uma história que não controlam, instalando-se um clima de comédia do absurdo.
O que confere à visão de Porumboiu uma eficácia muito especial é o facto de ele nunca ceder à facilidade de transformar a comédia em mera colecção de anedotas mais ou menos descartáveis. Nada disso: no seu humor amargo, "Tesouro" é também um filme que não abdica do carácter despojado do seu realismo. Em boa verdade, esta é a visão de alguém que sabe expor os mais pequenos detalhes de uma sociedade em conflito com a sua própria identidade.

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