joao lopes
19 Abr 2019 0:37

Tantas vezes nos esquecemos que, desde o mestre da animação Norman McLaren até ao nosso contemporâneo David Cronenberg, há, de facto, um cinema canadiano pleno de invenção e também de recursos de produção — por alguma razão os estúdios dos EUA escolhem muitas vezes o Canadá para os seus projectos. Vale a pena, por isso, mesmo saudar o reencontro com Denys Arcand (n. 1941), um dos nomes essenciais de uma certa "vaga" que, sobretudo ao longo dos anos 70/80, assumiu uma visão crítica do seu próprio país.

O novo filme de Arcand, "A Queda do Império Americano", envolve mesmo um jogo de memórias cruzadas com o seu próprio trabalho. Estamos, assim, perante o capítulo final de uma trilogia iniciada com "O Declínio do Império Americano" (1986) e prolongada através de "As Invasões Bárbaras" (2003), este um dos títulos canadianos com maior projecção internacional graças à sua consagração com o Oscar de melhor filme estrangeiro.



 
No plano temático, a trilogia de Arcand pode definir-se através de algumas linhas essenciais, das tensões sociais e simbólicas entre homens e mulheres até à hipocrisia de um sistema de relações alicerçado numa verdadeira luta de classes. Desta vez, o pano de fundo do dinheiro (presente em todos os filmes) adquire especial importância, já que esta é uma história algo rocambolesca que começa num assalto falhado que irá beneficiar um empregado de uma empresa de entrega de encomendas que, por acaso, estava no local em que tudo acontece…

Através de um conjunto de peripécias mais ou menos cruéis, pontuadas por muitas formas de sarcasmo, o que Arcand filma é, em última instância, a fraqueza congénita do próprio imaginário social: das ilusões geradas pelo dinheiro até à perversidade do seu poder, este é um mundo em que cada um se perde na inconsistência do colectivo a que pertence. Em resumo: uma feliz combinação de comédia social e conto moral.

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