11 Dez 2020 12:15

Elogiada como a grande heroína da indústria durante o verão pelo lançamento de "Tenet" nas salas de cinema, a Warner Bros. passou a encarnar o papel de vilã ao anunciar a estreia dos seus 17 filmes do próximo ano, em simultâneo, nas salas e na nova plataforma de streaming, HBO MAX.

Desta forma, o estúdio põe fim a um status quo de décadas que dava primazia e exclusividade aos cinemas durante uma janela de tempo, estabilizada em termos mais recentes nos 90 dias. Ou seja, três meses de exploração a solo dos filmes num sistema de parceria com cerca de metade da receita de cada bilhete para cada parte. A estes valores, as salas de cinema juntavam a totalidade das receitas de venda de comida, bebida e parte das vendas de exibição de publicidade no início das sessões. Passado o período inicial, os filmes podiam então prosseguir o seu ciclo de vida, nos clubes de vídeo dos operadores, nos canais premium, DVD e similares e, finalmente, nos canais generalistas de televisão.

Foram várias as tentativas por parte da produção e distribuição de cinema para romper o antigo "sistema de janelas", como é conhecido. As mais recentes, ocorreram por parte da Universal que deu o passo de lançar "Trolls: Tour Mundial", um filme previsto para os cinemas, nas plataformas digitais e acabou a assinar um acordo de redução dos períodos de exclusividade nas salas com a rede de exibição AMC.

Agora, um vírus que se espalhou por todo o mundo e obrigou a encerrar salas e parar produções, parece ser a oportunidade esperada para aplicar a machadada final no sistema.

Os estúdios vêem no streaming uma nova hipótese de ganhar dinheiro eliminando intermediários aplicando o investimento em conteúdos originais como cenoura para atrair subscritores.

E aqui chegamos ao grande problema da Warner Media. O lançamento do serviço de streaming HBO Max foi desorganizado, com sobreposição a ofertas preexistentes, muita confusão na mente dos clientes e o lançamento internacional só começa a sério em meados de 2021. Na América do Norte a HBO tinha 28,7 milhões de subscritores de serviços tradicionais da HBO. A 8 de dezembro, John Stankey, CEO da AT&T, proprietária da Warner e HBO, disse que a HBO Max tinha apenas 12,6 milhões de subscritores ativos, apesar de uma tendência de crescimento rápido desde finais de outubro.

Resultado, enquanto a Netflix permanece na liderança do setor com perto de 200 milhões de clientes em todo o mundo e a Disney+ apresenta um ritmo de crescimento impressionante com 86 milhões de clientes a nível mundial em cerca de um ano, a Warner vê-se obrigada a medidas que se podem qualificar de desesperadas e pouco refletidas que ameaçam com consequências negativas a curto e médio prazo ao nível da relação com produtores, atores e realizadores.

Christopher Nolan, realizador de "Tenet" que tem visto os seus filmes distribuídos pela Warner Bros. nos últimos 18 anos considera que a empresa "tinha uma máquina incrível para colocar o trabalho de um cineasta em qualquer parte do mundo, tanto nos cinemas quanto em casa, e estão a destruí-la, neste momento. Não compreendem o que perdem. A decisão não faz sentido em termos económicos, e até um investidor mais casual de Wall Street consegue perceber a diferença entre interrupção e disfunção."

A Legendary Pictures, um dos parceiros de produção da Warner Bros. e que financiou largamente filmes como "Dune", ou “Godzilla vs. Kong” também não está ficou feliz com a decisão da Warner e estará, de acordo com a imprensa norte-americana, em conversações sobre o tema com a possibilidade de ações em tribunal a pairar como ameaça velada.

Dennis Villeneuve, o canadiano que realizou "Dune" foi outro dos talentos de topo ligados à Warner que manifestou desagrado profundo com a decisão unilateral da Warner de estrear filmes ao mesmo tempo no streaming e nos cinemas. Acusou a AT&T de "falta de amor pelo cinema" e de colocar os seus interesses financeiros imediatos adiante das relações com realizadores, produtores e atores.

Mas a reação mais importante veio de Richard Lovett, da CAA. Numa carta aberta a Jason Kilar, CEO da Warner Media, o presidente de uma das grandes agências de talentos de Hollyood, acusou o estúdio de quebra de confiança e de tentar "tirar compensações aos nossos clientes para beneficiar a sua empresa". Em causa estão os acordos negociados anteriormente e que conferem a alguns participantes num filme o direito a percentagens das receitas de bilheteira.

Também a Directors Guild of America, que representa os interesses de 18 mil realizadores norte-americanos e se mostrou preocupada em saber como serão valorizados os filmes após a tomada de posição da Warner.
  • cinemaxeditor
  • 11 Dez 2020 12:15

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