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Itália sob o signo do realismo

Internacionalmente conhecido graças ao seu "Gomorra" (2008), Matteo Garrone mantém-se fiel aos pressupostos realistas desse filme — agora, com "Dogman", propõe o retrato de um homem à deriva no seio de um bairro problemático.

Itália sob o signo do realismo
"Dogman" ou o cinema italiano que não desiste do realismo
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 Itália sob o signo do realismo
Dogman Num subúrbio de uma periferia suspensa entre a metrópole e o deserto, onde a única lei parece ser a do mais forte, Marcello é um homem pequeno e gentil que divide os seus dias entre o trabalho no seu modesto salão de beleza para cães, o amor por sua filha Sofia, e uma relação ambígua de submissão com Simoncino, um ex-boxeur que aterroriza todo o bairro. Farto de ser humilhado, e determinado a ...

Neo-realismo no século XXI? Em termos lineares, a classificação é inadequada, para não dizer absurda. Escusado será lembrar que os filmes de autores como Roberto Rossellini ou Vittorio De Sica, nos anos 40, pós-Segunda Guerra Mundial, pertencem a uma conjuntura (social e artística) que não se repete. Em qualquer caso, há uma pulsão realista que alguns italianos nunca abandonaram.

Cineasta de títulos como "Gomorra" (2008) ou "Reality" (2012), Matteo Garrone mantém-se fiel a uma postura realista, pura e dura, que não desiste de olhar o presente do seu país. Assim é "Dogman", retrato frio e desencantado de um homem que tem uma loja de acolhimento e tratamento de cães, ao mesmo tempo que tenta sobreviver no seio de um bairro (realmente) problemático.

Marcello Fonte, intérprete dessa frágil e solitária personagem central, pode simbolizar a energia vital deste olhar cinematográfico — mereceu, aliás, o reconhecimento do júri de Cannes/2018, recebendo o prémio de melhor interpretação masculina. Por ele passam as emoções mais íntimas, ao mesmo tempo que o reconhecemos como símbolo revelador de um tecido social em trágica convulsão.

Vale a pena referir que este magnífico "Dogman" surge três anos depois de "O Conto dos Contos", por certo um dos empreendimentos mais ambiciosos de Garrone, procurando recuperar a energia fantástica das narrativas de Giambattista Basile (1566-1632). Dir-se-ia que o relativo falhanço (estético e comercial) desse filme levou Garrone a regressar aos mais primitivos pressupostos realistas — face aos resultados, podemos dizer que foi a opção certa.

Crítica de João Lopes actualizado às 23:36 - 30 dezembro '18
publicado 23:34 - 30 dezembro '18

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