Veneza, dia 7: o capitalismo extremo
Mãe e filho: Cho-soo e Lee Jung-jin numa cena de "Pieta" rodado na cidade de Cheonggyecheon.

PIETA, de Kim Ki-duk  

Veneza, dia 7: o capitalismo extremo

O realizador sul-coreano Kim Ki-duk filma uma alegoria obscura e violenta sobre o valor do dinheiro na sociedade contemporânea.

Ignorado na Coreia do Sul, Kim Ki-duk tem tido uma carreira internacional muito interessante, arrecadando prémios nos festivais de cinema mais importantes do contexto europeu. No ano passado ganhou o prémio Un Certain Regard no festival de cinema de Cannes, com o autobiográfico "Arirang", em que o cineasta desenvolve uma espécie de documentário sobre si próprio, entrincheirado numa pequena barraca perdida num monte, num período particularmente delicado da sua vida.

Pois bem, de regresso ao mundo artístico, o realizador surpreende em Veneza com um filme verdadeiramente singular, acerca da nossa má relação com o dinheiro e aquilo que isso representa na sociedade capitalista.

Em "Pieta" (podemos traduzi-lo livremente por Piedade), Kim Ki-duk cria uma alegoria, em como as consequências extremistas do capitalismo, podem degenerar numa cadeia de factos absolutamente inumanos, em que o dinheiro sobrepõe-se brutalmente à vida das pessoas.

No filme seguimos um cobrador de dividas contraídas por pequenos comerciantes que não têm outra forma de as pagar, a não ser accionando seguros de acidentes pessoais. Os devedores transformam-se, assim, num exército de estropiados, por via do sadismo deste homem.

Porém, um dia, este cobrador que não tem família é visitado por uma mulher que diz ser sua mãe. Inicialmente rejeita-a, mas depois ela torna-se no elo espiritual que faltava na vida dele. De tal forma que o faz desejar sair do mundo cruel que habita a sua existência.

Kim Ki-duk sublinha que o titulo do filme é inspirado numa visita que fez ao Vaticano, onde observou o trabalho de Michelangelo e as obras de arte que unem a Virgem Maria ao seu filho, numa simbologia de dor e sofrimento, que constituem um abraço à Humanidade.

"Pieta" é, neste contexto, um grito angustiado contra o estado da sociedade capitalista, em que o dinheiro se sobrepõe à vida das pessoas, dispostas a tudo, até morrer, para resolverem os seus problemas financeiros. Existem assim três protagonistas em "Pieta": o executor de dívidas, a sua possível mãe e o dinheiro.

Verdadeira representação da crise mundial que afecta os seres humanos mais desprotegidos no mundo inteiro, bem podemos classificar esta "Pieta" de Kim Ki-duk, como um verdadeiro tratado sociológico de um problema que atinge a sociedade capitalista contemporânea e à qual ainda ninguém ofereceu uma solução pragmática.

O dinheiro está a matar-nos é a mensagem pura e dura de "Pieta", um candidato forte aos prémios de Veneza.

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