"O Império dos Sentidos": filmando o combate cruel do amor
Memória
Oshima, o amor e os seus fantasmas
Impôs-se como símbolo da "nova vaga" do cinema japonês, construindo depois uma obra eminentemente pessoal: Nagisa Oshima filmou as convulsões do seu país, tendo como de partida as memórias da Segunda Guerra Mundial.
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Nagisa Oshima (1932 - 2013)
Nagisa Oshima, um dos cineastas mais ousados do Japão, morreu aos 80 anos.
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Obituário: Nagisa Oshima
Para o melhor e, sobretudo, para o pior, o conhecimento corrente de Nagisa Oshima passa pelo célebre "O Império dos Sentidos" (1976), filme que, em diversos momentos, foi acompanhado por polémicas mais ou menos gratuitas. De facto, o anedotário em torno do filme apenas serviu para passar ao lado de uma componente visceral (inerente a toda a obra do realizador): a visão muito crua do amor como um combate cruel, porventura sem solução.
Aliás, vale a pena recordar que o título original de "O Império dos Sentidos" ("Ai No Korida") significa A Corrida do Amor (devendo a palavra "corrida" ser entendida nas suas conotações tauromáquicas). Num certo sentido, a ficção seguinte de Oshima, "O Império da Paixão" (1978) retoma o final do filme anterior, perguntando como é que o amor sobrevive apesar da morte: neste caso, o título original ("Ai No Borei") significa, sintomaticamente, O Fantasma do Amor.
Combate e fantasmas. Eis duas entidades que podem resumir o fascinante trabalho de Oshima, desde os tempos heróicos da "nova vaga" japonesa, através de títulos como "Contos Cruéis da Juventude" e "Noite e Nevoeiro no Japão" (ambos de 1960), até essa magnífica obra final que foi "Tabu" (1999). Através de histórias de dilacerado dramatismo, a sua visão reflecte, afinal, os desencantos, mas também a exigência crítica, da geração que começou a filmar cerca de uma década passada sobre o fim da Segunda Guerra Mundial.
Depois de "O Império dos Sentidos" e "O Império da Paixão", Oshima adquiriu um prestígio internacional que lhe permitiu concretizar aquele que terá sido o seu filme mais popular: "Feliz Natal, Mr. Lawrence" (1983), um drama visceral, passado no ano de 1942, centrado no confronto entre o comandante de um campo japonês e um prisioneiro britânico. Ryuichi Sakamoto (também autor da música) e David Bowie, os protagonistas, emprestaram ao filme uma dimensão de culto que ainda hoje se mantém.
Depois de "Feliz Natal, Mr. Lawrence", apenas filmou "Max, Meu Amor" (1986), produção de raiz francesa, escrita em colaboração com Jean-Claude Carrière, com Charlotte Rampling no papel central. Curiosamente, a obra de Oshima conteve sempre uma importante dimensão documental, com mais de duas dezenas de títulos, muitos deles realizados directamente para televisão.
por João Lopes
publicado 21:21 - 15 janeiro '13