joao lopes
20 Dez 2018 23:20

Decididamente, importa contrariar a visão corrente, imposto pelo marketing mais poderoso, segundo aqual a linha da frente do "cinema popular" se esgota nas produções de desenhos animados ou nas aventuras de super-heróis… Não que não haja filmes interessantes nesses domínios. Mas a defesa da pluralidade da oferta deve levar-nos a focar também os conceitos europeus de "cinema popular".

"Le Grand Bain", por exemplo. Quando, em Maio de 2018, passou no Festival de Cannes (extra-competição), muitos tiveram a percepção de que estava ali um grande sucesso em potência. Talvez poucos arriscassem supor que, em França, o filme ultrapassasse os 4 milhões de espectadores… Mas é verdade: à oitava semana de exibição, "Le Grande Bain" vai em 6º lugar no top francês do ano que está a terminar!
Não se trata, entenda-se, de confundir os números das bilheteiras com qualquer apreciação cinéfila. Trata-se apenas de sublinhar que há mais mundos para além das produções com meios digitais… Neste caso, importa sublinhar que estamos perante uma recriação ágil e competente dos mais tradicionais valores de uma certa comédia social francesa.
Lançado entre nós como "Ou Nadas ou Afundas", esta é a crónica cómica, amarga e doce, de um grupo de homens de meia idade que, tentando contrariar as rotinas das suas existências, decide entregar-se à natação sincronizada… A partir daí gera-se uma avalanche de incidentes em que, no limite, todos são levados a avaliar o valor primordial da sua condição de grupo.
Gilles Lellouche é um actor e tem aqui a sua estreia como realizador a solo (em 2004, co-assinara "Narco" com Tristan Aurouet). É verdade que, por vezes, o seu filme parece mais ocupado a sustentar um "gag" mecânico ou imediato do que em preservar as linhas de construção da própria história; ainda assim, não é menos verdade que a sua condição de actor lhe confere um misto de atenção e cumplicidade ao labor dos intérepretes principais.
 
Nomes emblemáticos do cinema francês, como Guillaume Canet, Mathieu Amalric ou Jean-Hugues Anglade, coexistem aqui com o belga Benoît Peolvoorde para desenhar um quadro de relações sociais e afectivas que, em última instância, define um estado de espírito revelador das tensões do tempo presente. Não será uma "revolução" na história da comédia à la française, mas é bom saber que a sua tradição não se desagregou.

+ críticas