entre o real e o imaginário
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Ser ou não ser português
João Botelho filma o "Livro do Desassossego", de Bernardo Soares, chamando-lhe "Filme do Desassossego": uma viagem à intimidade portuguesa.
Quem é, afinal, o poeta Fernando Pessoa tal como surge encenado por João Botelho, em "Filme do Desassossego"? Ou melhor: como é que Bernardo Soares, heterónimo de Pessoa, autor do "Livro do Desassossego", surge representado pelo actor Cláudio da Silva?
Digamos que é, em tudo e por tudo, o contrário de uma personagem "biográfica". Não se trata de fazer um retrato do criador, e não apenas porque esse criador é um fantasma literário do próprio escritor. Também porque Bernardo Soares é alguém habitado por um outro fantasma: o das palavras como elementos geradores da sua própria identidade. Ou ainda: como é que a sua própria identidade se inventa através da língua portuguesa?
Tal como em "Conversa Acabada", filmado já lá vão três décadas, Botelho propõe uma digressão intimista pelos lugares, reais ou imaginários, onde se jogam os trunfos e as apostas deste nosso muito português ser ou não ser.
É um filme que evoluiu como um puzzle de acontecimentos precisos, mas oníricos. Nessa medida, é também um filme que celebra o cinema como uma arte primitiva — mas eminentemente moderna — de observar e questionar os limites da nossa condição humana. Enfim, em termos simples: um dos grandes acontecimentos do mais recente cinema português.
por João Lopes
publicado 15:58 - 30 setembro '10