2 Mar 2022 16:23
Quinta saga da personagem no cinema, "The Batman" inaugura a era Robert Pattinson e Matt Reeves. Passaram vinte anos sobre o assassinato dos pais de Bruce Wayne e apenas dois desde que o homem vestido de morcego começou a atuar nas ruas de Gotham City.
Neste novo cenário, ele é apenas um vigilante mascarado em busca de vingança, desprezado pelas autoridades e receado pelo cidadão comum que vê nele apenas outra faceta da violência que os rodeia. O seu único aliado é o Detetive Gordon, que o convoca através de um sinal luminoso toscamente gravado num holofote que reflete a forma de um morcego no céu sempre nublado da cidade. É Gordon que o chama à investigação dos atentados contra membros da elite de Gotham. Com os cadáveres, o assassino deixa adivinhas e mensagens em código dirigidas ao Batman. Esses enigmas mergulhados em sadismo apontam-no em direção ao submundo do crime organizado, mas acabam por o deixar desconfortavelmente perto do seu legado familiar.

Ao querer ser muita coisa em simultâneo, Reeves esbarra na fraca qualidade dos diálogos e na débil caracterização de algumas personagens, aliada à necessidade de incluir cenas de ação suficientes para justificar o rótulo de "filme de super-heróis", o que transforma o produto final numa amálgama de boas intenções falhadas.

São óbvias as referências ao film noir, desde logo pela narração desapaixonada do protagonista que marca o tom inicial do filme para desembocar numa investigação detetivesca através dos recantos menos recomendáveis da cidade que nos remete para os gangsters à moda de Scorcese.

A chuva que desaba com força em grande parte das sequências lembra "Blade Runner", esse arquétipo do neo noir em gigantescas urbes decadentes e violentas onde o tempo é sempre horrível. David Fincher é outro nome recordado pelo ar sujo e a tristeza generalizada, a falta de esperança nascida do crime e da corrupção, cópia da Nova Iorque falida e podre dos anos 70. Mas também está presente o fantasma de Nolan e a direção apontada na sua trilogia, fruto, até certo ponto, da necessidade de reciclar a personagem após o desastre da era Schumacher.

"The Batman" tenta pegar nessa herança e elevar a aposta, mas falha em conjugar a sofisticação pretendida com as responsabilidades de apresentar um blockbuster agradável aos quatro quadrantes clássicos da audiência. Apesar da estrutura e do ritmo narrativo bem delineados, que permitem atravessar as quase três horas de duração do filme sem tédio, Reeves acaba a injetar romance, ação, violência, introspeção e policial em doses que não ligam. Logo a começar pelos diálogos, uma coleção de lugares comuns, reforçados de forma negativa pela insistência quase infantil em explicar o óbvio ao longo de toda a trama, já em si pouco dada a surpresas.

Apesar do piscar de olho constante ao realismo e ao lado mais
sombrio e depressivo do género, "The Batman" fica longe dos resultados
obtidos por Todd Phillips em "Joker", pináculo do revisionismo e, até ver, produto único e de difícil replicação. 
Uma herança complicada

Criado pelo desenhador Bob Kane e pelo guionista Bill Finger, Batman estreou-se na banda desenhada poucos meses antes do início da Segunda Guerra Mundial, a 30 de março de 1939, no número 27 da revista "Detective Comics".

Das incursões pelas imagens em movimento fica, antes de mais, a série televisiva dos anos 60 protagonizada por Adam West. Ligeira para lá do limite do ridículo, mas sempre muito divertida, criou uma ideia da personagem que os filmes bastante mais tardios desmentiriam com uma infame excepção, mas já lá vamos.

Foi Tim Burton o primeiro a recuperar Batman para o cinema, com Michael Keaton chamado a vestir o fato em duas ocasiões, com "Batman" (1989), onde Jack Nicholson foi o Joker, e "Batman Returns" (1992), quando Danny DeVito assumiu o papel do Pinguim e Michelle Pfeiffer foi Catwoman.

Seguiu-se Joel Schumacher, primeiro com Val Kilmer em "Batman Forever" (1995), onde Tommy Lee Jones encarnou Harvey Two-Face e Jim Carrey assumiu The Riddler. Dois anos depois, já com George Clooney no papel principal, Arnold Schwarzenegger foi Mr.Freeze e Uma Thurman interpretou Poison Ivy. "Batman & Robin" matou a personagem ao recuar até os tons menos sérios dos tempos da televisão e terá definido o que seria o seu futuro.

Por isso, não surpreendeu que a trilogia realizada por Christopher Nolan, com Christian Bale a estrear-se na pele do justiceiro em "Batman Begins" (2005), recuperasse o lado sério, realista e sombrio, reforçado pelo afastamento do nome Batman no segundo e terceiro filmes, "The Dark Knight" (2008) e "The Dark Knight Rises" (2012).

Em tempos mais recentes, com os filmes de super-heróis quase omnipresentes como campeões de bilheteira, surgiram os universos narrativos: do lado da Marvel com o MCU e por parte da DC Comics com o DC Extended Universe. Aqui, surge Ben Affleck e um outro Batman, integrado em coletivos, ou a dividir protagonismo, casos de "Batman v Superman: Dawn of Justice" (2016), de Zack Snyder, e "Justice League" (2017), iniciado por Zack Snyder e completado por Joss Whedon. Chega mesmo a reduzir-se às apenas pequenas aparições como em "Suicide Squad" (2016), realizado por David Ayer, ou no próximo "The Flash", de Andrés Muschietti.

Em cima de tudo isto, Todd Philips lança "Joker" (2019), um corte absoluto com o que fora apresentado antes. Realista ao ponto do desconforto, o Arthur Fleck de Joaquin Phoenix assume-se como uma história a milhas do cânone dos super-heróis. Terá inspirado Matt Reeves, é inegável, mas com eficácia bem menor.
Esperança no box office

Passados dois anos de pandemia, com salas e produções fechadas, e o reforço da posição do streaming, o cinema procura recuperar. Até agora, só um filme iludiu a crise para gerar receitas relevantes e ser considerado um sucesso mundial de bilheteira. "Homem-Aranha: Sem Volta a Casa" chegou às salas a meio de dezembro do ano passado e conseguiu atingir valores ao nível anterior à pandemia. Estreia norte-americana nos 260 milhões de dólares e um acumulado global à data de 1,85 mil milhões (o quarto maior de sempre).

É este o desempenho que "The Batman" procura. A imprensa norte-americana e os analistas têm sido pródigos em previsões. As mais recentes apontam para valores entre os 100 e os 122 milhões de dólares no primeiro fim de semana nos EUA e Canadá. Outros, mais otimistas, crêem que pode chegar aos 185 milhões. Seguro é afirmar que qualquer resultado acima dos 100 milhões será animador.

A nível global, os mil milhões são o objetivo desejado que trará "The Batman" para junto de outros importantes sucessos de bilheteira. A favor, o facto de ser um dos poucos filmes de Hollywood a garantir data de lançamento na China, desde há dois anos o maior mercado mundial de consumo de cinema, onde chega a 18 de março.

O último Batman da era Christopher Nolan, terminou a carreira nas salas com 1,08 mil milhões de dólares, valor semelhante ao de "Joker" que apresenta 1,07 mil milhões de box office mundial.

  • cinemaxeditor
  • 2 Mar 2022 16:23

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