joao lopes
8 Nov 2019 22:18

Tempos houve (sem dúvida mais variados e estimulantes…) em que a imagem pública do cinema não descurava um genuíno envolvimento com as convulsões do nosso mundo, do exercício da política aos valores sociais. Claro que tais virtudes não desapareceram dos filmes, mas é um facto que o marketing dominante conseguiu impor uma pobre ideologia do espectáculo — o cinema seria uma banal colecção de proezas técnicas e efeitos especiais…

Daí que seja importante destacar a reposição de um filme como "Adeus, Lenine!" (2003), de Wolfgang Becker. Na verdade, estamos perante um exemplo feliz de relação com as convulsões da história, neste caso a Queda do Muro de Berlim, de que agora se assinala o 30º aniversário. Dito de outro modo: ainda há quem encare e valorize os filmes enquanto objectos de conhecimento.

Contrariemos, por isso, a hipocrisia que possa descrever "Adeus, Lenine!" como um filme de tese (?) para especialistas. Quanto mais não seja para contrariar tal disparate, convém lembrar que estamos perante um genuína e contagiante comédia política.
No centro dos acontecimentos, durante os dias agitados e libertadores de finais de 1989, está o jovem Alex (Daniel Brühl, numa das suas composições mais emblemáticas), tentando esconder da mãe, muito fragilizada por questões de saúde, que já não há "duas" Alemanhas: o seu bem amado sistema comunista, vigente na RDA, esvaziou-se perante a urgência da história colectiva.
A realização de Becker possui a enorme vantagem de não carregar "simbolicamente" as acções, afinal preservando uma ternura humanista de que ninguém (sublinho: ninguém) está excluído. Consagrado como melhor filme europeu de 2003, "Adeus, Lenine!" possui um misto de didactismo histórico e distanciação crítica cuja pertinência artística permanece intacta. 

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