Veneza, dia 2: o equívoco de Schnabel
Cartaz do filme mostrando a jovem palestiniana Miral
interpretada por Freida Pinto ("Quem Quer ser Bilionário?")

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Veneza, dia 2: o equívoco de Schnabel

"Miral" é um filme pouco convicente sobre o conflito entre israelistas e árabes

O pintor e cineasta nova-iorquino Julian Schnabel prima pela escolha de projectos que permitam vincar um ponto de vista a partir da vida de uma figura - foi assim quando biografou o pintor Basquiat, contou a história do editor francês Jean-Dominique Bauby ("O Escafandro e a Borboleta") e evocou a luta política protagonizada pelo escritor e dissidente cubano Reynaldo Arenas ("Antes que Anoiteça").

A mais recente  personagem do seu cinema é Miral, uma personagem inspirada num novela literária da jornalista palestiniana Rula Jebreal, que cresceu em Israel, conheceu os campos de refugiados palestinianos e vive em Itália desde os 20 anos.

O filme permite-lhe contextualizar a convivência conflituosa entre israelitas e palestinianos, desde 1947 até 1994. As datas são marcantes por duas razões: em 1947 foi fundado um colégio de orfãos palestinianos, que ainda hoje funciona, onde Rula Jebreal/Miral foi criada; e 1994 corresponde ao ano em que Rula Jebreal deixou a Palestina.

O arco temporal confere uma dimensão histórica que o filme não alcança, porque muitos dos factos são evocados com o objectivo cronológico, servindo apenas para assinalar o contexto das personagens - as imagens documentais que ilustram esses momentos foram montadas sem qualquer ligação estética, como separadores que não influenciam o fio narrativo.

Acresce que "Miral" está carregado de boas intenções sublinhadas da pior forma: valoriza quatro papéis femininos para mostrar como as mulheres são as maiores vítimas do conflito, mas só faz justiça à personagem principal; pretende ser um hino à coabitação pacífica entre israelitas e palestinianos mas as personagens são maniqueístas; Schnabel teve o previlégio de filmar em Israel e na Palestina, mas os locais são indiferentes na história.

A costela judia de Schnabel impeliu-o a assumir este projecto e pode ter adensado alguns equívocos. O realizador descurou, pela primeira vez, o retrato da personagem central da sua narrativa e isso faz com que "Miral" seja um filme frio e falhado, onde falta a emoção humana excessiva das outras obras. 


> Ouça a crítica de Tiago Lopes


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publicado 10:17 - 18 janeiro '11

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