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Sondagem atribui a Cavaco e Sócrates os papéis mais negativos do pós-25 de Abril

por RTP
José Manuel Ribeiro, Reuters

Cavaco Silva é a personalidade que mais negativamente contribuiu para o país nos 40 anos da democracia portuguesa, logo seguido do ex-primeiro-ministro José Sócrates. Já Mário Soares acolhe por larga margem as preferências dos inquiridos. É o resultado de uma sondagem da Universidade Católica para a RTP, um estudo que conclui igualmente que quatro décadas de processo democrático deixaram muito por fazer, com os portugueses desiludidos em particular no que respeita a “segurança”, “desenvolvimento económico” e “condições de trabalho”.

Cumpridas que estão quatro décadas do processo democrático iniciado em 1974, os portugueses expressaram numa sondagem da Universidade Católica para a RTP e Antena 1 as apreciações que fazem do percurso do país desde essa madrugada de 25 de Abril até aos dias de hoje.

Numa primeira leitura ao estudo da Universidade Católica, percebemos que a desilusão é o sentimento que perpassa o sentido de resposta dos 1117 inquiridos. O que não impede essa amostra representativa dos portugueses de saber “a quem” e a “o quê” apontar o dedo. “Os resultados negativos de Cavaco Silva e Passos Coelho devem-se essencialmente aos eleitores de esquerda (CDU, BE e PS), os de Soares aos de direita (PSD e CDS/PP). Já os resultados negativos de Sócrates são referidos por mais de 10% dos eleitores de todos os partidos com exceção dos da CDU”, explicam os autores da sondagem.


Desde logo, questionados sobre os atores da vida pública, as respostas foram claras na indicação de que os portugueses veem em Mário Soares a personalidade que mais positivamente contribuiu para a vida nacional. O antigo Presidente da República colheu a preferência de 16% dos portugueses na resposta a uma pergunta aberta (não são indicados previamente quaisquer nomes para posterior escolha, os inquiridos são livres de indicar quem quiserem), mais do dobro das escolhas que recaíram noutro antigo Presidente, o general Ramalho Eanes (7%). Em terceiro lugar surge Sá Carneiro, antigo primeiro-ministro e fundador do PPD-PSD (6%).

Em sentido contrário, o atual Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, que ocupou entre 1985 e 1995 o cargo de chefe de sucessivos governos, é apontado pelos portugueses como a figura que nos últimos 40 anos mais negativamente contribuiu para o país. Logo após, surge nesta lista o nome de José Sócrates, chefe do último Governo socialista, que se viu obrigado a negociar com a troika constituída por FMI, Comissão Europeia e Banco Central Europeu um programa de assistência financeira. Mário Soares também faz parte desta listagem, tal como o atual primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho: surgem em terceiro lugar com 10% de dedos apontados.

De uma forma mais genérica, Mário Soares é ainda visto como a personalidade que mais influenciou o curso do país (23%) no pós-25 de Abril, seguido muito de longe por Cavaco Silva (11%) e José Sócrates (5%).

Da leitura destes números, os investigadores da Universidade Católica apontam que “os resultados negativos de Cavaco Silva e Passos Coelho devem-se essencialmente aos eleitores de esquerda (CDU, BE e PS), os de Soares aos de direita (PSD e CDS/PP)”. “Já os resultados negativos de Sócrates são referidos por mais de 10% dos eleitores de todos os partidos com exceção dos da CDU”, acrescentam.
Mais democrático, menos seguro e mais pobre

Quanto ao próprio país, pedida que foi uma comparação entre o antes e o pós-25 de Abril de 1974, é percetível a deceção dos portugueses relativamente ao que é costume chamar-se de “conquistas de Abril”. Se por um lado sublinham uma viragem em termos dos valores da liberdade e da democracia, a balança desilude quando são sopesadas “a segurança” e “a abundância” (os inquiridores abordam esta dimensão sujeitando-a ao conceito de riqueza, do que é rico economicamente falando).
“Para uma larga maioria dos inquiridos (85%) o 25 de Abril é uma data de todos os portugueses. Sendo esta a resposta maioritária em todos os escalões etários, verifica-se uma descida considerável no escalão das pessoas com 65 anos ou mais (que teriam 25 ou mais em 1974).”

“Portugal é hoje um país mais livre (80%), mais democrático (65%), mas mais pobre (62%) e mais inseguro (53%)” do que no tempo do Estado Novo, referem os autores do inquérito.

Olhando os resultados do inquérito em pormenor, 80% vêem o Portugal de hoje como um país mais livre, “contra 9% que afirmam o contrário”; falando de democracia, 65% dizem que este é hoje em dia um valor mais consolidado, contra os 14% de opinião oposta. A igualdade, um dos valores apregoados pela revolução – como o é em todas as revoluções –, não tem contudo um balanço inequívoco: apenas “42% pensam que o país é hoje mais igualitário (quando) 32% pensam que é menos e 15% julgam que não há diferenças quanto a este aspecto”.
“Liberdade foi o termo usado por mais pessoas para definir o 25 de Abril. É um termo que ganha maior unanimidade entre as gerações mais novas (60% dos que têm entre 18 e 24 anos; 62% para o escalão 25-34; 59% para o 35-44). Para os inquiridos que têm hoje 65 ou mais anos (teriam 25 ou mais em 1974) embora Liberdade seja o significado mais associado ao 25 de Abril (por 36% das pessoas com 65 ou mais anos), muitos outros significados foram referidos pelos inquiridos, entre os quais claramente se destacam a ideia de Bom. Na mesma linha, também a referência à ideia de Revolução decresce com idade”.

E esse desencanto ganha espessura quando apenas “um terço (33%) dos inquiridos considera que há hoje mais justiça e 45% julgam que há menos”.

Acresce que 53% dos inquiridos vêm o Portugal atual “mais inseguro do que antes do 25 de Abril”, contra 30% de opinião contrária, e uma esmagadora maioria (62%) responde que o país da democracia “é mais pobre do que no tempo da ditadura”.

É uma tendência que se consolida na perspectiva relevada do que são as condições concretas da vida das pessoas: “são mais os inquiridos que consideram que as condições de trabalho são hoje piores (49%)” contra os 40% que “as julgam melhores”.
O sonho ainda comanda a vida dos mais jovens?

Apesar de tudo, “são mais os que julgam haver hoje mais e melhor tempo de para lazer (48%) do que os que pensam estar a generalidade dos portugueses hoje pior quanto a esse aspeto (35%). Em geral, a maioria (56%) reconhece haver hoje maior qualidade de vida”. Os investigadores apontam “uma influência da idade nestas respostas que não se pode desprezar: quanto mais velhos os inquiridos maior a tendência para considerarem que as condições de trabalho, a vida familiar e a qualidade vida estão piores”.


E da mesma forma que os inquiridos mais novos “tendem a considerar o país atual mais seguro, mais igualitário e mais justo do que os inquiridos mais velhos”, como refere o estudo, também nas questões relacionadas com “trabalho, lazer e qualidade de vida” as respostas estão correlacionadas com a idade: de uma forma geral, a população mais velha tende para uma visão mais negativa do que é “essa sua qualidade de vida”.

Trata-se, porventura, de uma diferença de perspetiva que leva a crer que, passe o que passar, as gerações mais recentes, ainda que não alicerçadas em cenários concretos, não deixam de desenhar um ideal que tem as suas concretizações aqui e além. Porventura fruto de uma homogeneização da experiência cultural global do Ocidente.
Esta democracia não chega
Questionados sobre o funcionamento da democracia portuguesa, voltam a ser os grupos dos mais velhos a demonstrar um maior grau de insatisfação, apesar de ser este um resultado por escassa margem. Na realidade, o desagrado para com o estado da democracia, passados 40 anos da sua implementação, é um sentimento transversal a todos os grupos etários, para perfazer um total de 83% de inquiridos descontentes com o atual mecanismo democrático.

Aqui, o estudo adianta que num barómetro de 2001 essa fasquia estava então nos 76%, o que nos diz que uma década logrou aprofundar o defraudar das expectativas na vez de mudar as agulhas para modelos democráticos mais assertivos.

Esta insatisfação foi descascada na perspetiva da cor política, com os investigadores a registar um sentimento menos negativo entre os eleitores que votam PSD. Pode ler-se que, “enquanto entre os votantes PSD podemos encontrar 32% que estão satisfeitos com o funcionamento da democracia, nos restantes partidos essa percentagem não passa dos 16%”.
Alguma coisa que funcione

Mas então de que massa são feitos os sonhos dos portugueses? Que querem eles para si? Numa pergunta fechada, o inquérito coloca a amostra perante nove “factos”, aspetos concretos da vida.Com apreciação negativa surgem os Tribunais (-31%), os Bancos (-32%) e Grandes Grupos Económicos (-11%). Já dos partidos representados no Parlamento, “apenas o PS (com 43% de avaliações positivas e 42% de negativas) apresenta um saldo positivo”.


As prioridades dos inquiridos surgiram ordenadas da seguinte forma: Direito de voto para todos (71%), Serviço Nacional de Saúde tendencialmente gratuito e universal (69%), Maior igualdade entre homens e mulheres (66%), Existência de salário mínimo ou pensão mínima (62%), Aumento do nível médio de escolaridade (61%) e Respeito pelos direitos das minorias (56%).

As preferências mais baixas foram para a Existência de mais do que um partido (43%), Rede de autoestradas (30%) e Separação entre Estado e Igreja (29%).

No entanto, apesar destes ensejos, os portugueses manifestam um quase total distanciamento no que respeita à participação na vida política do país. Os autores do inquérito tomaram como envolvimento político qualquer “atividade com objetivo de alterar leis ou políticas: participação em reuniões, manifestações, demonstrações públicas, distribuição panfletos ou participação em campanhas eleitorais”, não sendo característica necessária o “fazer parte de um partido”.

Feita a contabilidade das respostas, segmentadas por períodos históricos “como o PREC (…) ou o período entre a entrada para a UE e a o início da atual crise económica (…) os dados sugerem uma maior intensidade da participação política no PREC”. Trata-se contudo de um envolvimento residual.

Por último, quanto à avaliação do papel das instituições no Portugal democrático, a amostra valoriza o desempenho das Forças Armadas (54%), da Imprensa (53%) e das PME -Pequenas e Médias Empresas (52%). Com apreciação negativa surgem os Tribunais (-31%), os Bancos (-32%) e Grandes Grupos Económicos (-11%). Já dos partidos representados no Parlamento, “apenas o PS (com 43% de avaliações positivas e 42% de negativas) apresenta um saldo positivo”.
Ficha técnica

Esta sondagem foi realizada pelo CESOP – Universidade Católica Portuguesa para a Antena 1, a RTP, o Jornal de Notícias e o Diário de Notícias nos dias 12, 13 e 14 de abril de 2014. O universo alvo é composto pelos indivíduos com 18 ou mais anos recenseados eleitoralmente e residentes em Portugal Continental. Foram selecionadas aleatoriamente dezanove freguesias do país, tendo em conta a distribuição da população recenseada eleitoralmente por regiões NUT II e por freguesias com mais e menos de 3200 recenseados. A seleção aleatória das freguesias foi sistematicamente repetida até que os resultados eleitorais das eleições legislativas de 2009 e 2011 nesse conjunto de freguesias (ponderado o número de inquéritos a realizar em cada uma) estivessem a menos de 1% dos resultados nacionais dos cinco maiores partidos. Os domicílios em cada freguesia foram selecionados por caminho aleatório e foi inquirido em cada domicílio o mais recente aniversariante recenseado eleitoralmente na freguesia. Foram obtidos 1117 inquéritos válidos, sendo que 59% dos inquiridos eram do sexo feminino, 31% da região Norte, 21% do Centro, 36% de Lisboa, 6% do Alentejo e 6% do Algarve. Todos os resultados obtidos foram depois ponderados de acordo com a distribuição de eleitores residentes no Continente por sexo, escalões etários, região e habitat na base dos dados do recenseamento eleitoral e do Censos 2011. A taxa de resposta foi de 67%*. A margem de erro máximo associado a uma amostra aleatória de 1117 inquiridos é de 2,9%, com um nível de confiança de 95%.


* A taxa de resposta é estimada dividindo o número de inquéritos realizados pela soma das seguintes situações: inquéritos realizados; inquéritos incompletos; e recusas.
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