A seca extrema e o declínio da civilização maia

por RTP
O colapso dos Maias é há muito apontado como um exemplo de como as mudanças climáticas podem determinar a disrupção de uma comunidade e do equilíbrio das estruturas e atividades Bernardo Montoya - Reuters

Uma investigação científica conseguiu quantificar pela primeira vez a gravidade da seca associada ao período de colapso da civilização maia, entre os anos 800 e 1000. A precipitação anual diminui nessa altura entre os 41 e os 54 por cento, com picos de redução na ordem dos 70 por cento, comparando com as condições atuais.

O estudo, publicado esta quinta-feira na revista Science, foi realizado por um grupo de cientistas da Universidade de Cambridge, Reino Unido, e da Universidade da Florida, nos Estados Unidos.

“O período identificado como o de secas mais extremas “coincide perfeitamente com o declínio da civilização maia, constatado a partir de vestígios arqueológicos, como por exemplo, a diminuição do número de construções civis e templos construídos nesse período”, revela Gázquez-Sánchez, um dos investigadores de Cambridge.

Os cientistas analisaram o lago Chichancanab, no México, utilizando uma técnica de análise da composição isotópica dos sedimentos que permitiu reconstituir o ciclo da longa temporada de seca. A descida da média da precipitação anual atingiu os 70 por cento, quando os dados são comparados com as condições atuais naquele local. Registou-se ainda uma diminuição de dois a sete por cento no nível de humidade.
"Origem natural"
A investigação permitiu datar a época de secas mais extremas entre 780 e 990 d.C, trazendo pela primeira vez dados concretos para a discussão sobre até que ponto as mudanças no clima foram diretamente responsável pelo declínio da civilização maia.

O colapso dos Maias é há muito apontado como um exemplo de como as mudanças climáticas podem determinar a disrupção de uma comunidade e do equilíbrio das estruturas e atividades. Os governantes no passado ganhavam muita da sua legitimidade para governar da capacidade de manter a população alimentada, algo que é ameaçado por secas e a quebra de produção agrícola.

“As secas não explicam a queda de todos os locais ou cidades maias e definitivamente houve eventos sociopolíticos que contribuíram para a queda da civilização”, explica Martín Medina, da Universidade de Auburn, citado pelo El País. Na opinião deste investigador, o atual estudo traz um método independente para confirmar que a época de seca foi “suficientemente intensa para causar graves perturbações sociais e talvez o colapso da civilização”.

“As causas destas secas foram de origem natural, já que neste período o ser humano não tinha a capacidade de mudar o clima a uma escala global, ao contrário do que acontece na atualidade”, assegura Gázquez-Sánchez, um dos investigadores responsáveis pelo estudo.
"Uma grande analogia"
O cientista lembra que algumas populações atuais em países em vias de desenvolvimento são extremamente vulneráveis a fenómenos climáticos extremos como a seca.

“O sistema económico mundial agora está globalizado e tem uma maior capacidade de adaptação. Isto leva a que o impacto de fenómenos climáticos extremos, como as secas, seja menor em termos da morte e colapso socioeconómicos à escala global”.

Martín Medina adianta uma outra análise. “Parece-me haver uma grande analogia com o que acontece hoje. Estamos a enfrentar uma mudança climática semelhante à que viveram os maias no passado”, assegura.
Tópicos
pub