França alarga recolher obrigatório a 46 milhões de pessoas

por Ana Sofia Rodrigues - RTP
Reuters

Para fazer face ao agravamento da situação sanitária, o recolher obrigatório foi alargado a mais 38 departamentos administrativos. São 46 milhões de pessoas afetadas, dois terços da população total, numa altura em que são batidos, de novo, recordes de número de novos casos. Os infeciologistas e responsáveis hospitalares temem que a segunda vaga seja pior do que a primeira, até porque o vírus está a circular mais rápido do que na primavera.

O recolher obrigatório “será aplicado das 21h00 às 6h00 sobre os departamentos afetados, por um período de seis semanas”, anunciou o primeiro-ministro Jean Castex. Uma medida iniciada à meia-noite de sexta-feira e que é alargada a mais regiões ao fim de apenas uma semana.

Os números empurraram o país para o alargamento das restrições. A França registou 41.622 novos casos em 24 horas, um novo recorde, aproximando-se de um milhão de infetados (999.043) e uma taxa de casos positivos que escalou para os 14,3% contra os 4,5 por cento no início de setembro.

“As próximas semanas vão ser duras e o número de mortos vai continuar a aumentar”, disse Castex em conferência de imprensa. Em 24 horas, foram registadas 162 mortes por covid-19.

“Não temos muito tempo para evitar medidas mais graves”, alertou o primeiro-ministro.

Apesar das queixas dos empresários da restauração, o presidente Emmanuel Macron já deixou claro que é necessário para evitar o risco de os hospitais ficarem sem capacidade de resposta.

O secretário de Estado Olivier Dussopt revelou que o alargamento do recolher obrigatório vai custar entre 1,3 e 1,5 mil milhões de euros aos cofres do Estado.
Três vezes mais pessoas infetadas
Há seis dias que o número de novos casos em França está acima dos 20 mil. Mas o diretor do maior centro hospitalar da Europa, o Assistance publique - Hôpitaux de Paris (AP-HP), vê outra realidade. “Há muitas pessoas positivas sem o saber”, diz Martin Hirsch. “Provavelmente três vezes mais” do que os confirmados a cada dia em França.

O diretor considera que a segunda vaga será, provavelmente, pior do que a primeira. “Houve a perceção ao fim de alguns meses que a segunda vaga não existiria, seria uma pequena vaga. A situação é a inversa: é possível que seja pior do que a primeira”, diz o responsável à RTL, sublinhando que os números continuam em ascensão.

Os novos internados têm uma média de idade de 62 anos. “Temos como doentes jovens que têm fatores de risco, o pai contaminado pelo filho, o pai deste pai que recebeu poucas visitas, se isolou, teve cuidado até o seu filho de 50 anos o ter ido visitar…”, enumerou o responsável.
Vírus circula mais rápido do que na primavera
A previsão é de um “novembro terrível”.

“O vírus está a circular mais depressa. O ressurgimento da doença começou em agosto”, afirma Arnaud Fontanet, epidemiologista e conselheiros científico do Governo francês em entrevista à BFM TV, avisando que estamos perante uma “maratona”.

As hospitalizações ficaram baixas até ao fim de agosto, dando “uma falsa sensação de segurança”, apesar dos números já terem começado a subir nessa altura. “O vírus circula melhor no frio, porque estamos mais em zonas fechadas”, alerta.

“Os hospitais e as equipas médicas vão encontrar-se num cenário já conhecido”, disse Fontanet, referindo-se ao período de março e abril, quando o sistema estava à beira do colapso.

Isto apesar de se ter agora “maior visibilidade” sobre o vírus e mais ferramentas para o combater, argumenta o infeciologista.
“Agora, temos muitos mais ferramentas para nos protegermos do vírus”, diz Fontanet. “Quando a primeira vaga nos assaltou, não sabíamos como se transmitia o vírus em todas as suas nuances, não tínhamos testes suficientes, não tínhamos máscaras suficientes…não conhecíamos o conjunto de medidas que nos permitem lutar contra a circulação do vírus”, reforça, lembrando até a incapacidade inicial de contabilizar os casos.

“Temos melhor visibilidade do que se passa, apesar de ser uma situação difícil, porque entrámos numa época invernosa em que o vírus circula bem”, diz.

A chave de uma resposta eficaz passa pela mobilização das pessoas, defende. Porque o reconfinamento está sempre em cima da mesa. Apesar de afastar para já a implementação dessa medida a nível nacional – até por questões económicas -, lembra que ela é sempre possível a nível local.
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