Artistas Unidos abrem temporada difícil com "A vertigem dos animais antes do abate"

por Lusa

A acumulação de riqueza como fonte de perdição e desgraça é o tema da peça "A vertigem dos animais antes do abate" que os Artistas Unidos (AU) estreiam no dia 13 de setembro, no Teatro da Politécnica, em Lisboa.

"O autor [Dimítris Dimitriádis] diz que a peça é uma variação sobre Job", figura central do livro homónimo que é um dos livros da secção dos Escritos da Bíblia hebraica e o primeiro livro poético do Antigo Testamento, disse à agência Lusa o diretor e encenador dos Artistas Unidos, Jorge Silva Melo, sublinhando tratar-se de uma temporada "particularmente difícil".

"É uma peça que nos faz pensar o que é a riqueza, a riqueza da Europa, a tragédia da Europa, a pobreza... Aquilo que nas Escrituras vem como `O livro de Job`", acentua o encenador sobre a dramaturgia que encena agora depois de, em 2006, ter editado o texto, juntamente com "Morro como país", que também já trabalharam, na coleção dos Livrinhos de Teatro.

Nesta peça com nove atores, "a acumulação de riqueza, riqueza, riqueza, leva à maior desgraça e leva um homem rico a dizer `maldito o dia em que nasci`. `O dia em que nasci morra e pereça`, na versão de Camões", sublinhou Jorge Silva Melo.

"É uma peça em que tudo está a ruir. E é brutal, como dizem agora os rapazes novos", ironizou o diretor da companhia com sede ao Príncipe Real.

A peça gira em torno de uma família que se torna milionária de forma muito rápida, ao mesmo tempo que se vai desestruturando e desagregando, uma espécie de parábola sobre o "vil metal".

A riqueza desta família é também a sua perdição, já que, à medida que enriquece, vai-se desagregando através de relações pessoais muito complexas, de desejos inconfessados, referiu o autor de "António, um rapaz de Lisboa".

"Um rapaz da minha geração", é como Jorge Silva Melo define o dramaturgo e poeta grego, nascido em Salónica, em 1944, que estudou cinema e teatro em Bruxelas, nos anos 1965-1966, quando o diretor dos Artistas Unidos estudava cinema em Londres, que já esteve na companhia e na Culturgest quando, em 2006, foi publicado na coleção Livrinhos de Teatro (Livros Cotovia).

"O preço da revolta no mercado negro", escrita em Bruxelas em 1965-1966, foi a primeira peça de Dimitrís Dimitriádis e uma das primeiras encenações do cineasta, ator e produtor francês Patrice Chéreau (1944-2013), responsável por, entre outras obras, uma grande produção de "O anel do Nibelungo", no Festival de Bayreuth, em 1976, por ocasião do centenário da tetralogia wagneriana.

Caído no esquecimento após ter escrito a primeira peça, o autor grego que, nas palavras do diretor dos Artistas Unidos, tem "uma obra romanesca, poética e de traduções imensa", encontra-se nos últimos anos "a renascer".

Em dezembro, "Esquecer", do dramaturgo grego, estará em cena na sala Estúdio do Teatro Nacional D. Maria II, num espetáculo dirigido por Jean-Paul Bucchieri.

Das peças do autor e amigo, esta, que conhecia bem, mesmo antes de começar a trabalhar nela, é a de que Jorge Silva Melo "gosta mais", por a considerar "a mais complexa".

E confessou-se maravilhado pelo trabalho que está a ser desenvolvido pelos atores e pelos correios eletrónicos que tem trocado com o autor, e que "têm sido muito importantes".

Traduzida por José António Costa Ideias, "A vertigem dos animais antes do abate" tem interpretação de João Meireles, Inês Pereira, Américo Silva, Vânia Rodrigues, André Loubet, Pedro Baptista, Pedro Carraca, João Pedro Mamede e Nuno Gonçalo Rodrigues.

Com cenografia e figurino de Rita Lopes Alves, luz de Pedro Domingos e Nuno Gonçalo Rodrigues e António Simão, como assistentes de encenação, a peça estará em cena até 28 de outubro.

Terá representações às terças e quartas-feiras, às 19:00, às quinta e sextas-feiras, às 21:00, e aos sábados, às 16:00 e 21:00.

"Labirinto X001", um trabalho novo de Xana, uma instalação cheia de caixas de plástico, visitável até 28 de outubro (de terça a sexta-feira, às 17:00, e, aos sábados, das 15:00 até ao final do espetáculo), é a outra iniciativa com que os Artistas Unidos abrem esta temporada.

Uma temporada "especialmente difícil" - difícil e cheia de incertezas, quer no que respeita a subsídios, quer no que respeita à realização de obras no teatro, frisou o diretor da companhia. Razão por que Jorge Silva Melo não está a preparar qualquer peça nova.

Após "A vertigem dos animais antes do abate", a companhia reporá "Jardim Zoológico de Vidro", de Tennessee Williams, de 08 a 18 de novembro, aproveitando "uma falha que houve nas digressões", explicou.

 

 

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