Museu Nacional de Etnologia não recebeu pedidos de restituição de peças

por Lusa

Lisboa, 22 mar (Lusa) - O diretor do Museu Nacional de Etnologia, Paulo Costa, disse hoje à agência Lusa, em Lisboa, que, até ao momento, não recebeu qualquer pedido de restituição de peças dos 80 países que ali estão representados.

O responsável falava no final do seminário "Descolonizar os museus: isto na prática...?", que decorreu durante todo o dia no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, com a presença de museólogos portugueses e de Wayne Modest, subdiretor do Tropenmuseum, na Holanda.

"Desde 2015 que estou a dirigir o museu, e nunca recebi nenhum pedido de restituição, oficial ou não oficial", disse o diretor à Lusa, depois de intervir num painel do seminário organizado pela Associação Acesso Cultura, com o objetivo de debater a descolonização dos museus, um tema que tem estado na ordem do dia em vários países do mundo, sobretudo aqueles com passado colonial e uma ligação à escravatura, como Portugal.

De acordo com Paulo Costa, qualquer pedido nesse sentido teria de passar pelos ministérios da Cultura e dos Negócios Estrangeiros.

"Neste aspeto há uma grande unanimidade: não há receitas para uma restituição de uma peça. Ela tem de passar por um processo muito bem fundamentado, e visto caso a caso", salientou.

O tema da restituição de obras de arte e etnográficas não é novo, mas o debate internacional cresceu desde que o presidente francês, Emmanuel Macron, decidiu encetar esse processo relativamente às ex-colónias, começando por devolver um conjunto de peças ao Benim.

Para melhor fundamentar a questão da restituição de objetos ilegalmente retirados dos seus territórios de origem, durante o período colonial, o chefe de Estado francês pediu a um grupo de especialistas para elaborarem um relatório que intensificou o debate no meio cultural.

Paulo Costa disse que esta questão não diz respeito apenas ao Museu Nacional de Etnologia, mas também a todos os museus nacionais, municipais e de universidades, que possuem coleções ou objetos trazidos das antigas colónias portuguesas, assim como a inúmeras coleções privadas.

"Desde os anos 1970 que existe legislação, nomeadamente uma convenção da UNESCO que Portugal ratificou, abrangendo a restituição de bens ilegalmente retirados de outros países. O que este documento realizado em França traz de novo é uma proposta para devolver todas as peças que foram retiradas dos territórios durante os períodos coloniais e posteriores", descreveu.

Paulo Costa disse que a posição daqueles especialistas "é bastante singular", e "criou um novo paradigma que não reúne consenso, e tem sido muito debatido, e criticado, até entre os seus pares".

"Não constitui uma posição oficial do Governo francês", disse.

Por outro lado, o antropólogo defendeu a existência dos museus de etnologia como espaços culturais "que mostram diferentes culturas e formas de viver, promovendo o diálogo e a convivência multicultural".

"Foi nesse espírito que o museu foi criado em Portugal, em 1965, pelos seus fundadores, que reuniram peças de Portugal e de outras culturas na mesma casa, ao contrário de outros países que criaram, na altura, museus especificamente de índole colonial", apontou.

Em Portugal, a questão também foi intensificada no final do ano passado, depois das declarações da ministra da Cultura de Angola, Carolina Cerqueira, ao jornal Expresso, admitindo mesmo ter a intenção de dar início a "consultas multilaterais" para "regularizar a questão da propriedade e da posse", da "exploração dos bens culturais angolanos no estrangeiro".

A Acesso Cultura - Associação Cultural, criada em 2013, e dirigida por Maria Vlachou, instituiu prémios que tem vindo a entregar anualmente para distinguir entidades que apliquem boas práticas na área da acessibilidade cultural, tanto a nível físico, como social e intelectual.

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