Ópera portuguesa estreada em 1796 revisitada no Teatro São João, no Porto

por Lusa

A ópera "La Donna di Genio Volubile", do português Marcos Portugal, vai ser apresentada na sexta-feira e no sábado, no Teatro Nacional São João (TNSJ), no Porto, mais de dois séculos depois da estreia, em 1796.

Apresentada pela primeira vez Veneza, em 1796, a obra chegou ao Porto nove anos depois, ao Real Teatro São João, antecessor do atual TNSJ, e a sua recuperação permite assinalar os 220 anos da inauguração daquele teatro e os 110 anos desde o incêndio que sofreu.

"La Donna di Genio Volubile" volta ao palco onde se apresentou no Porto, desta feita pelas mãos do Ópera Estúdio da Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo (ESMAE) e da pós-graduação em ópera e estudos músico-teatrais da mesma instituição, com a encenação a cargo de António Durães.

Com música de Marcos Portugal (1762-1830), compositor da patriarcal e um dos primeiros regentes do Teatro do Salitre, que se afirmou um dos mais internacionais nomes da música portuguesa, "La Donna di Genio Volubile" tem libreto de Giovanni Bertati (1735-1815), e a sua partitura passou por um processo de recuperação e transcrição, a cargo do investigador David Cranmer, do Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical (CESEM), da Escola Superior de Música de Lisboa.

O trabalho, coordenado por Ana Liberal, no Porto, permitiu trazer a obra cómica para o século XXI, ainda que, garantiu à Lusa António Durães, não exista nenhuma vontade de "levar a obra além da sua natureza", num trabalho em que foram "fiéis ao texto, ao compositor, ao libretista e à história".

"Estamos a colocá-la numa espécie de presente, apenas porque está a acontecer agora. Não queremos que seja uma peça de museu, mas que as coisas aconteçam agora. Mas não fizemos nenhum trabalho de atualização", esclareceu o encenador.

Com o "conjunto de valências" que a ESMAE oferece que permitem uma "maneira mais económica" de reunir alunos e profissionais de várias áreas, este trabalho de ópera concretiza-se numa "obra de grande fôlego", até por não existir nenhum registo para lá da partitura.

Assumindo o "tiro no escuro", António Durães vê na "Donna" uma obra "cheia de potencial cénico", com "uma história muito divertida, é uma comédia, e cheia de equívocos e de mudanças, que foi muito prazerosa de fazer para todos".

A história passa-se no Páteo da Condessa, onde quatro homens esperam a decisão da Donna, que não consegue escolher entre eles, entrevistando os pretendentes num "círculo viciado" de uma mulher `volúvel` que vai encontrando problemas para rejeitar cada um dos quatro sedutores.

Com a Orquestra Sinfónica da ESMAE, estarão, em palco, vários cantores e atores a dar vida à "Donna di Genio Volubile", num elenco que inclui Marta Martins, Miriam Rosado - estas no papelda Condessa titular -, mas também Sérgio Ramos, Raquel Mendes, Tânia Esteves, Patrícia Silveira, Rafaela Monteiro, Miguel Reis, Gabriel Neves, Ricardo Rebelo e Francisco Reis.

"É um momento incrível na vida destes jovens cantores, e também os músicos no fosso de orquestra, porque este é um sítio ímpar no panorama da criação artística em Portugal. É um desafio incrível, e sentimos que estão todos muito entusiasmados, por poderem, durante duas semanas, privar neste espaço e beber da história deste edifício", explicou o encenador, que garantiu que essas histórias "também importam para a consciência", uma vez que a nova representação `ecoa` a récita original, há quase 200 anos.

"La Donna di Genio Volubile", com direção artística de António Salgado e musical de José Eduardo Gomes, será apresentada pelas 21:00 de sexta-feira e pelas 19:00 de sábado, com a peça a ser falada em italiano e legendada em português, no palco do Teatro Nacional São João, no Porto.

Marcos Portugal nasceu em Lisboa, foi discípulo de João de Sousa Carvalho, o primeiro mestre da Patriarcal, onde também ocupou o cargo de organista e compositor. Regente do Teatro do Salitre, em Lisboa, acabaria por se fixar em Itália, na última década do século XVIII, onde trabalhou com os principais teatros de ópera.

De regresso a Portugal, em 1800, dirigiu a Patriarcal e o Teatro de São Carlos, em Lisboa, até à partida para o Brasil, após as invasões francesas. Compositor da corte de D. João VI, no Rio de Janeiro, permaneceu no Brasil após a independência, onde morreu em 1830.

Compôs mais de 140 obras, das quais 50 óperas, como "A Saloia Enamorada", "La Merope" e "A morte de Semiramide".

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