Quadros recém-atribuídos ao pintor Pieter Balten revelados no Museu da Terra de Miranda

por Lusa

O Museu da Terra de Miranda, em Miranda do Douro, acolhe, a partir de hoje, 12 quadros, datados de 1580, que representam os meses do ano e que o investigador Vitor Serrão atribuiu ao mestre flamengo Pieter Balten e à sua oficina.

"Estes quadros, tidos como os `Retratos dos Meses da Sé de Miranda`, constituem um exemplo raríssimo de uma iconografia que está praticamente ausente no património artístico nacional e internacional", disse à agência Lusa o historiador de arte Vitor Serrão, sublinhando a importância do conjunto, que é mostrado agora ao público pela primeira vez.

O investigador afirma que o nome de cada mês, pintado em cada tábua, corresponde à grafia antiga, utilizada em Antuérpia, na Flandres (Bélgica atual), no final de 1500, "o que é muito importante", no processo de identificação.

"Trata-se de pinturas de afirmada qualidade artística, características do estilo de uma grande artista flamengo cujo `corpus` de obra é reduzido, em termos iconográficos", indicou à Lusa o professor catedrático da Universidade de Lisboa.

"Dentro da tradição da `pintura de género` dos Países Baixos, os `Meses` de Balten `assumem um discurso de harmonização do mundo em estreita relação com a sua simbologia astrológica, sem deixarem de ser, também, quadros devocionais no seu mais exacto sentido", acrescentou Vitor Serrão.

A investigação sobre a origem e autoria dos quadros, agora tornados públicos, durou cerca de quatro anos, "tendo sido alvo de um trabalho de pesquisa muito minucioso, dada a sua raridade", e que envolveu o processo de restauro, feito no Porto.

Para o investigador português, os 12 quadros do também chamado "Calendário da Sé de Miranda", traduzem "uma espécie de interação entre os planos real e simbólico, que contribuiu para todo o tipo especulações cosmológicas sobra regeneração do Universo, tema tão caro à Igreja Católica como aos círculos da Igreja Protestante", na época.

"Os Retratos dos Meses da Sé de Miranda do Douro" são um conjunto de 12 quadros a óleo sobre madeira de carvalho, que terão sido adquiridos (ou encomendados diretamente) no mercado de Antuérpia por parte "do culto bispo da diocese de Miranda Jerónimo de Meneses, entre 1581 e 1592, depois de ter sido reitor da Universidade de Coimbra", especificou Vitor Serrão.

Pieter Balten (1527-1584), pintor e gravador, foi um dos protagonistas na afirmação da pintura flamenga do século XVI, com as suas cenas do quotidiano, à semelhança do seu contemporâneo Pieter Bruegel, o Velho, e dos seus sucessores, Jan e Pieter Bruguel, o Jovem, pintor do Ducado de Brabante, destacado também pela reprodução dos quadros de seu pai, que se terá inspirado também em Pieter Balten.

O mestre da escola flamenga encontra-se representado em coleções como a da National Gallery, em Washington, e do Metropolitan Museum, em Nova Iorque, e os registos da galeria belga De Jonckheere, especializada na pintura flamenga da Renascença, coloca-o a par de Pieter Bruegel, o Velho, na guilda dos mestres de Antuérpia, com quem terá trabalhado no tríptico da igreja de S. Rumbold, em Mechelen Malines, nesta região da Flandres.

"A escolha da série adquirida mostra a atualização de gosto dos bispos de Miranda do Douro", no final do século XVI, que chegaram a "possuir uma pinacoteca capitular com mais de uma centena de peças, incluindo pinturas nórdicas de que apenas sobrevirão duas dezenas", destacou o especialista, em declarações à Lusa.

"Os retratos dos Meses da Sé de Miranda do Douro: uma Rara Alegoria Pintada em Antuérpia por Pieter Balten", título integral da exposição, serão expostos em Santiago de Compostela, em novembro. Em janeiro de 2020, "Os retratos" seguirão para o Museu Nacional de Arte Antiga de Lisboa, segundo o investigador.

Além da exposição destes 12 quadros, que estavam longe do olhar do público, foi editado um catálogo para melhor se perceber o seu conjunto, que também foi apresentado hoje publicamente. A edição congrega a Direção Regional de Cultura do Norte e o Museu da Terra de Miranda.

O chamado "Calendário da Sé de Miranda do Douro" "é um verdadeiro tesouro que, quase milagrosamente, chegou íntegro aos nossos dias, e num notável estado de conservação", afirmou a diretora do Museu Terras de Miranda, Celina Pinto.

A divulgação deste conjunto pictórico torna-se agora possível graças ao programa NORTEAR que visa o desenvolvimento cultural e patrimonial, de âmbito transfronteiriço, envolvendo instituições portuguesas e espanholas.

Nestas entidades estão o Agrupamento Europeu de Cooperação Territorial - Galiza e Norte de Portugal (AECT-GNP), a Direção Regional de Cultura do Norte, em articulação com o Museu da Terra de Miranda e a Concatedral de Miranda do Douro, mais a Xunta de Galicia.

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